A criação da Ordem dos Assistentes Sociais em Portugal representa um marco na organização e regulação desta profissão, que desempenha um papel de relevo na promoção do bem-estar social e na redução das desigualdades. Após anos de reivindicações e debate, a classe profissional verá, pela primeira vez, a Ordem eleger os seus representantes a 30 de novembro de 2024, conforme previsto pela Lei n.º 121/2019, de 25 de setembro, que cria a Ordem dos Assistentes Sociais e aprova o respetivo estatuto, e as alterações introduzidas pela Lei n.º 66/2023, de 7 de dezembro, no âmbito do processo de inscrição obrigatória nesta Ordem. Este momento histórico é não apenas uma formalização do trabalho que há décadas vem sendo realizado por gerações de assistentes sociais, mas também o início de uma nova fase de reconhecimento, fortalecimento e consolidação da profissão.
A missão do assistente social, num frase, pode ser definida pela necessidade de melhorar o bem-estar das pessoas e contribuir para a diminuição das desigualdades sociais. Esta missão tem por base os princípios dos direitos humanos e da justiça social, numa prática alicerçada em princípios éticos, promotores da dignidade humana. Este propósito é ainda mais relevante no atual contexto de vulnerabilidade social, onde muitas pessoas permanecem esquecidas, silenciadas e frequentemente desconhecendo os seus direitos e como os podem exercer. Os assistentes sociais são profissionais que põem as suas competências técnicas mas também a sua cidadania ao serviço dos outros. O serviço social é uma profissão de intervenção e uma disciplina académica que promove o desenvolvimento e a mudança social, a coesão social, o empowerment e a promoção da pessoa (International Federation of Social Workers).
O serviço social relaciona as pessoas com as estruturas sociais para responder aos desafios da vida e à melhoria do bem-estar social. Certo é, que na prática diária dos assistentes sociais, esse processo revela-se extremamente complexo, marcado por altos níveis de tensão. Os assistentes sociais atuam em contextos muito burocráticos, frequentemente lidando com recursos insuficientes, muitos dos quais decorrentes de problemas estruturais, como o difícil acesso a uma habitação digna ou a serviços de saúde adequados.
As primeiras eleições da Ordem dos Assistentes Sociais acontecem num momento em que a necessidade de intervenção da profissão no tecido social nunca foi tão urgente. Os assistentes sociais atuam na linha da frente, não apenas como mediadores entre os cidadãos e o Estado, mas também como defensores de direitos e promotores da equidade. A Ordem desempenhará um papel central ao assegurar que apenas profissionais qualificados possam exercer a profissão, através da inscrição obrigatória e obtenção de cédula profissional. Mas, igualmente, importa que esta nova estrutura apoie os assistentes sociais no reforço das suas aptidões e competências exigidas para uma prática cada vez mais robusta e competente.
A pergunta que muitos colocam é: “O que muda com a criação da Ordem?” A resposta é clara. Em primeiro lugar, ao fazer parte da Ordem, os assistentes sociais garantem a conformidade com as leis nacionais, já que, num Estado de direito, o cumprimento por todos das leis aprovadas na Assembleia da República é um pilar da democracia. Em segundo lugar, a Ordem surge como uma entidade reguladora que assegura a qualidade e a ética do exercício da profissão, seguindo os princípios fundamentais que norteiam outras ordens profissionais em Portugal e na Europa.
As Ordens Profissionais têm, segundo a Conselho Nacional das Ordens Profissionais (CNOP), um papel estruturante e essencial para a sociedade e para os próprios profissionais. No caso dos assistentes sociais, a Ordem garantirá:
Regulação do acesso à profissão: Controlando a certificação e credenciação, assegura que apenas profissionais qualificados exerçam a função.
Definição de normas deontológicas: Estabelecendo e monitorizando o cumprimento de um código de ética que rege a conduta profissional.
Fiscalização e disciplina: Protegendo os utentes dos serviços através de uma supervisão eficiente e, se necessário, de uma atuação disciplinar.
Formação contínua: Promovendo o desenvolvimento profissional dos seus membros, mantendo-os atualizados através do acesso às melhores práticas que respondem às novas exigências da profissão.
Representação institucional: Defendendo os interesses da profissão perante o Estado e a sociedade.
Num contexto mais amplo, a legislação europeia também desempenha um papel crucial no reconhecimento e regulação das profissões como a do assistente social. A Diretiva 2005/36/CE, de 7 de Setembro de 2005 que harmoniza o reconhecimento das qualificações profissionais dentro da União Europeia, facilita a mobilidade dos assistentes sociais entre diferentes Estados-Membros, assegurando que os profissionais possam exercer a sua função além-fronteiras, sem perder de vista os princípios éticos e a qualidade dos serviços prestados.
Além disso, a União Europeia apoia ativamente iniciativas de formação contínua e inovação profissional, incentivando as ordens profissionais a promover o desenvolvimento dos seus membros para que possam responder às exigências de um mundo em constante mudança e transformação dos fenómenos sociais. Este enquadramento europeu garante que os assistentes sociais portugueses, membros da sua Ordem, possam beneficiar de oportunidades de reconhecimento e mobilidade em toda a Europa.
A criação da Ordem dos Assistentes Sociais em Portugal não é apenas um marco simbólico, mas um veículo essencial para garantir a excelência e a integridade desta profissão. Os assistentes sociais têm um papel fundamental na sociedade, não só pela sua intervenção técnica, mas pelo compromisso cívico de alcançar e responder a quem dele precisa, independentemente de classe, etnia, género ou orientação política.
Num tempo em que as desigualdades sociais, pobreza e exclusão social são cada vez mais visíveis e em que o Estado Social enfrenta desafios para dar resposta a todos, os assistentes sociais representam um elo crucial entre o cidadão e os seus direitos. E é precisamente neste ponto que a Ordem irá atuar: garantindo que a qualidade, a ética e o profissionalismo sejam sempre mantidos, em benefício daqueles que desta profissão necessitam, assegurando apoio e enquadramento aos profissionais no seu dia-a-dia, tantas vezes trilhado em contextos de pressão e desgaste.
A criação da Ordem é, portanto, um reconhecimento tardio, mas fundamental, do trabalho diário inestimável dos assistentes sociais em Portugal. Que esta nova fase traga não só uma maior valorização e reconhecimento público da profissão, mas também uma sociedade que inclua, escute e promova o sentimento de pertença que nos deve unir. Vamos por isso, consolidar, construir e cooperar em prol de uma Ordem que verdadeiramente represente os assistentes sociais, mas acima de tudo contribua para a promoção de uma sociedade mais justa e inclusiva.