Voto útil para aqui. Voto útil para acolá. A menção do voto útil está em quase todos os discursos dos diversos partidos políticos, principalmente do PS, AD, IL e Chega. Os partidos mais à esquerda, nomeadamente o BE, já tentaram utilizar essa mesma narrativa, mas de uma forma bastante mais pousada e contida precisamente por denotarem o insucesso que tem dado.
Ora, nestas eleições, por estranho e curioso que pareça, o voto útil parece não estar a nutrir efeito no eleitorado, havendo um reflexo desta mesma realidade nas sondagens.
O PS admite uma necessidade de voto útil no partido aclamando que a direita não pode vencer, assim como reafirma a necessidade de haver uma concentração da esquerda no PS para esse mesmo intento. O que Pedro Nuno Santos não equacionou, é que essa mesma concentração da esquerda ficou fora do baralho quando admitiu uma geringonça à esquerda. Através desta confirmação, os votantes de uma esquerda à esquerda do PS, ambicionam uma maior representação esquerdista, ora na AR ora em sede governamental, impossibilitando a transferência de voto pedida pelo PS. Neste caso, a história do Bicho Papão, e da agressora direita, não funciona para a esquerda.
A AD, por sua vez, pede igualmente uma transferência de voto na ala da direita para evitar uma vitória do PS. Todavia, o pedido do voto útil por quase todos os ex-governantes social-democratas em comícios eleitorais, não funciona também. Não é expectável que haja uma mobilização da direita para votar na AD. Nem mesmo para almejar retirar o PS do Governo. A escolha da IL em não fazer uma coligação pré-eleitoral está a cultivar mais frutos para o partido político do que aquilo que se esperava com todas as polémicas eleitorais a que a própria AD tem sido vítima. Esta separação das direitas, mesmo que se coliguem num âmbito pós-eleitoral para alcançar a maioria absoluta, resultará numa não mobilização dos liberais para o seio social democrata. Logo, daí, não haverá transferência. Do Chega, certamente muito menos haverá essa concentração das direitas. A partir do momento em que se ingressa o Chega –movimento antissistema, proveniente tanto da abstenção como de outros partidos políticos que outrora não satisfizeram as ambições dos militantes-, não creio que se saia para ir para outro partido político. Mais do que um partido, é um movimento de protesto, de insatisfação e de carência de atenção.
A IL também faz parte do elenco que procura o voto útil. Este voto útil foca na prerrogativa de que um voto na IL é uma forma de fazer prevalecer as ideias liberais dado que uma maior representatividade e melhor prestação nas intenções de voto, levará a Aliança Democrática a conectar-se com a IL, sendo igualmente obrigada a ajustar-se ao partido liberal. Faz o seu sentido. Mas este motivo só mobilizará aqueles que se reveem no liberalismo e das duas uma: 1. Já são votantes da IL ou já foram votantes da IL e; 2. Nunca votaram na IL, mas são de direita via económica e acreditam nas ideias liberais. A mobilização não partirá de mais nenhum espectro da direita, até porque a IL no que toca aos valores e costumes apresenta-se como uma linha liberal e não conservadora, não competindo com mais nenhuma ala da direita já fragmentada.
Finalmente o Chega. Também o Chega tem tido momentos de súplica para que os votos se concentrem no mais recente partido da direita. O Chega afirma-se como o único partido verdadeiramente de direita, isento de corrupção, isento de politicamente corretos, e o único com capacidade necessária para fazer oposição ao PS. Utiliza os casos de corrupção para denegrir o PSD e o PS e afirma que a IL irá fazer acordos com a AD logo que sejam conhecidos os resultados do dia 10 de março. Ora, o problema é que também não funciona. Para além de o Chega não ser, efetivamente, um partido de direita por possuir ideias economicamente de esquerda, e não possuírem uma ideologia base que os possam caracterizar; não é o protagonista de uma oposição digna, séria e responsável. Utilizar cartazes, noticias impressas e sondagens falsificadas de entidades não credenciadas pela ERC, não é uma forma de campanha, muito menos de oposição. Apesar de o Chega ser possuidor de votos de vários ramos do nosso espectro político: AD, IL, abstenção e até do PCP, o facto de nunca ir para o Governo de forma individual e através de coligações –tendo em conta as declarações da AD-, tornam o voto útil algo inútil. Ironia das ironias.
É curioso observarmos os pedidos de voto útil pelos diversos partidos pelas mais variadas razões. Através deste exercício e das intenções de voto por várias sondagens, conseguimos de certa forma confirmar que não está a existir uma mobilização significativa protagonizada pelo voto útil.
Se calhar já chegamos à conclusão, enquanto sociedade, que o voto útil não nutre efeitos e é inútil. Também é provável que as polarizações e posições mais radicalizadas dos vários candidatos para as legislativas leva a que o voto útil seja diminuto e impossível. Através da existência de candidatos mais extremados, a margem para que nos identifiquemos com um partido que não é o nosso (vigorando o voto útil) é pequeníssima.