Quem visitar Gibraltar vai achar que está num lugar um pouco estranho, um território inglês, situado no sul de Espanha, com high streets, bom clima e donde se vê Marrocos. Entre muitas das particularidades que o caracterizam, talvez o aspeto mais curioso seja a presença de macacos, chamados barbary macaques. O próprio nome já em si nos faz interrogar se serão macacos berberes ou macacos bárbaros. Trata-se do único sítio na Europa onde eles existem livre e naturalmente. Existem cerca de trezentos e vivem principalmente na parte alta de Gibraltar, onde há um parque natural. No entanto, é possível vê-los em diversos locais, como nos telhados, nos muros, nas muralhas e nas estradas com menos circulação. Por vezes aventuram-se até ao centro urbano. Achei muito curioso este fenómeno e li um pouco sobre a história de Gibraltar e dos seus macacos e, como em tudo, quando alguma coisa merece uma boa explicação, vamos sempre encontrar várias. A pergunta “porque existem macacos em Gibraltar?” tem aparentemente uma explicação e resposta simples. Teriam sido trazidos durante as ocupações árabes da Península Ibérica, por volta do ano 700.

Outra explicação, mais fantástica e literária, poderá ser a seguinte: antigamente, há vários milhões de anos, o Norte de África estava ligado ao sul da Europa. Onde hoje é o Mar Mediterrâneo havia uma zona de terras baixas, uma enorme bacia hidrográfica. Estes macacos, os barbary macaques, viviam espalhados por um vasto território desde onde é hoje Marrocos até ao sul da Península Ibérica. Existia também, um sistema montanhoso que unia os dois continentes, mas que um dia desmoronou, deixando unicamente de pé a rocha de Gibraltar. Abriu-se assim o estreito que fez inundar, numa primeira fase, toda a zona baixa entre a Europa e a África até à Sicília, e numa segunda fase, a força do Atlântico rompeu novamente barreiras e seguiu até ao Levante ou Mediterrâneo oriental. Esta inundação resultou na formação do mar que hoje conhecemos, tão azul e tão associado à História da Humanidade e da cultura Grega, Romana e Bizantina, entre muitas. Voltando aos macacos, alguns ficaram a norte deste novo mar e aos poucos estas populações foram desaparecendo. Empurrados cada vez mais para sul, eventualmente, só o grupo que vivia na rocha de Gibraltar permaneceu. A teoria da inundação que criou o Mar Mediterrâneo existe mesmo e tem o nome de Zanclean Flood, e, segundo consta, a sua formação demorou cerca de dois anos.

Por volta do ano 1346, o mundo enfrentou a peste negra que chegou à Europa através da via da rota da seda e dos canais comerciais, originada pelos ratos e pulgas. Propagou-se então por toda a Europa, causando um elevado número de mortos e enfermos. Um dos muitos efeitos que estas baixas causaram na sociedade da altura foi um tremendo impacto no mercado da mão-de-obra. A peste negra afetou o sistema feudal pois a escassez de mão-de-obra fez subir, por aperto, os salários dos trabalhadores agrícolas na Europa Ocidental e em especial no Reino Unido.

O alemão Jacob Fugger, primeiro grande banqueiro da Europa e capitalista puro nasceu em 1459 na cidade de Augsburgo. Tornou-se um dos homens mais ricos do mundo no seu tempo e há quem diga que foi o homem mais rico que jamais viveu. Fez considerável fortuna com empréstimos, financiamento, comércio, indústria, exploração de minas, investimentos ligados a rotas marítimas e foi grande senhorio. Chegou a financiar casas reais como os Habsburgo. No entanto, apesar de ser capitalista e calculista, criou vários projetos de habitação social. O mais conhecido, a Fuggerei Hosuing Project, ainda hoje está em funcionamento, com jardins, espaços de lazer, parques e até creches para os filhos dos trabalhadores.

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Também o inglês Robert Owen, que nasceu em 1771, proprietário e diretor ligado à indústria têxtil, tinha uma enorme preocupação com os seus trabalhadores e o seu bem-estar. Foi pioneiro na implementação de políticas sociais e criou inclusivamente uma colónia cooperativa utópica.

Durante a revolução industrial, e sempre que novas invenções alteravam a forma como se produzia ou mesmo o que se produzia, houve sempre um impacto social como consequência. As invenções, como o motor a vapor, ou os teares, ou mesmo uma coisa tão simples como o vidro, fizeram com que outras grandes invenções e progressos técnicos acontecessem, quase sempre criando movimentações de pessoas. Por exemplo, sem o vidro não haveria microscópios e se calhar sem microscópios não haveria antibióticos. Sem a indústria não teria havido a deslocação de pessoas para as cidades e sem a escassez de mão-de-obra rural talvez o trator não tivesse sido inventado ou pelo menos não teria havido tanta pressão para desenvolver maquinaria agrícola. A rápida industrialização das sociedades e o crescimento das cidades fez movimentar as populações rurais mais pobres para os centros urbanos que se encontravam em expansão. Isto também teve provavelmente outro desfecho. Estes trabalhadores eram uma das razões pelo qual a aristocracia rural se mantinha, pois, sem ter quem trabalhasse a terra, não havia agricultura. Esta movimentação foi de certa forma inimiga destes grandes senhores, enfraquecendo-os, dando assim origem a esta nova classe, os rendeiros encarregados da gestão dos campos tornados em grandes proprietários.

As mudanças podem acontecer por apertos, a que os americanos chamam “squeeze” ou o que os historiadores e economistas chamam constrangimentos. Podem também acontecer por consequências de segunda ordem. E como é possível ver nos exemplos anteriores, acontecem muitas vezes pela via dos protagonistas menos prováveis. Depois, as explicações que lhes queremos atribuir já são outra coisa. Enquanto escrevo este texto, ouço nas notícias que o Vice Almirante Gouveia e Melo poderá candidatar-se à Presidência da República. Também nos aproximamos das eleições legislativas onde o candidato improvável, Rui Rio, vai ganhando terreno e vantagem. As coisas vão acontecendo e as explicações vão sendo variadas, e cabe a cada um escolher se quer a explicação Zanclean ou não. O americano Will Durant, grande historiador e escritor, dizia que metade da História que conhecemos foi escrita de forma imparcial e a outra metade é imaginada.