“Você pode desprezar a realidade, mas não vai conseguir fugir das consequências de desprezar a realidade”
(Ayn Rand)
Por meados do séc. XX a situação dos Lobos na Europa era dramática: haviam desaparecido de muitos países e mesmo nos países que ainda habitavam estavam em risco de desaparecer. Daí para cá, a tendência inverteu-se e a espécie foi aumentando em números e em área, regressando a muitas das suas antigas áreas de ocorrência.
Porquê? Tempos houve em que se pagavam prémios por lobos mortos, se realizavam campanhas de envenenamento, se construíam armadilhas (fojos) para os capturar, se obrigava à realização de grandes caçadas. E apesar de todo esse esforço, cada vez eram mais… Terão sido as leis de proteção a salvar o Lobo? Quando sabemos que continuam a ser mortos todos os anos? Ou há aqui algo mais, até porque esta expansão recente do Lobo é transversal a praticamente todos os grandes mamíferos europeus?
Há mesmo: nestas últimas décadas o mundo rural do velho continente esvaziou-se de gente rumo às cidades do litoral. Enormes áreas abandonadas forma progressivamente recolonizadas por herbívoros (Veados, Corços, Javalis, Bisontes, Castores, etc., etc.). E, atrás da carne, acabam por voltar também os carnívoros – Ursos, Linces, Glutões, e, claro, também os Lobos. Uma alcateia destes últimos consome algumas toneladas anualmente, alimento que em muitas zonas e durante muito tempo conseguia assaltando o gado que o êxodo rural fez desaparecer, pelo que só com o regresso dos ungulados selvagens teve condições para regressar.
Esta explicação natural, contudo, interessa pouco ao ambientalismo e ao animalismo e suas reivindicações, designadamente proibições como a caça ou imposições como áreas protegidas. As próprias bandeiras fossilizaram-se: sendo certo que a transformação da paisagem leva a ganhos de umas espécies e a perdas de outras, em vez de se orientar o foco para essas novas espécies ameaçadas, insiste-se na negação da evolução positiva das espécies que beneficiam das novas condições.
Afinal de contas, são muitos anos a bater na mesma tecla: criar ligação emocional a algumas espécies, mesmo que adulterando a realidade – os Lobos bons, amigos, vegetarianos… – e convencer-nos que aquelas coisas que os próprios dizem funcionar mal – caso de leis incumpridas, e pior, sem capacidade de fazer cumprir, ou áreas protegidas onde afinal se multiplicam Eucaliptos, Estufas, Urbanização turística, Parques Eólicos ou Solares, etc., etc. – afinal dão resultados e o caminho é insistir.
Pelo que quando a Comissão Europeia lançou à discussão a possibilidade de rever o estatuto de proteção do Lobo rapidamente passaram ao ataque acusando a Presidente de estar a vingar-se pela morte do seu Pónei. Porque a espécie até não se está a expandir? Porque não só os conflitos não aumentam como nem sequer existem? Porque as pessoas lesadas são secundárias face à bicharada?
Já algumas vezes aqui escrevi como essa negação da realidade pode acabar por ser contraproducente para as próprias espécies que se pretendem preservadas. Porque efetivamente os conflitos agudizam-se – com a novidade de muitos destes conflitos pelo continente chegarem à porta das cidades, pelo que as pressões de pastores ou caçadores tornam-se descabidas – e dada a falta de resposta das Administrações face aos problemas das pessoas, um dia a paciência esgota-se.
Parece ter sido o caso do norte de Itália onde o ano passado uma pessoa morreu na sequência do ataque de um Urso – Ursos que, diga-se, foram ali deliberadamente libertados para fomentar a natureza. Ora feito um referendo à população a resposta foi esclarecedora, sendo de salientar a elevada taxa de participação (2/3 das pessoas votaram… compara-se com as nossas taxas de abstenção!) e sobretudo a inequívoca vontade popular: 99% dos votantes não querem Ursos nem Lobos na sua região (Valle di Sole)…
E agora? Metemos a democracia na gaveta? A vontade popular deixa de contar? E como impor algo contra a vontade das pessoas? Com um polícia atrás de cada árvore? (já agora, aqui falo de bichos mas isto aplica-se a muitas temáticas ambientais, e não só, em que a vontade popular parece ser desprezada… em consequência, e como em democracia aparecem sempre alternativas a prometer o contrário, depois admiramo-nos com o sentido de voto)
Que a convivência entre pessoas e grandes carnívoros não é fácil, todos estamos de acordo. Não obstante é possível, como vários exemplos pelo mundo mostram. Dizendo que os Tigres só comem Alfaces ou ignorando Ursos polares que invadem e metem em sobressalto povoados? Não, com rigor e minimização de conflitos. Porque negar a realidade raramente traz bons resultados na gestão de problemas.