Quando me sento, num quente dia de Verão, numa esplanada de praia fico impressionado com o cada vez maior número de pessoas que permitem que o seu corpo seja usado como um mural de grafíti. E tenho a certeza que a maioria delas ficaria indignada se um garoto desenhasse na frontaria das suas casas os desenhos que elas trazem no corpo. Na verdade, no tempo em que tudo é efémero, só as tatuagens perduram.

Nestas alturas, vem-me sempre à lembrança a definição de “aristocrata natural” (por oposição aos “aristocratas de plástico e postiços” que há por aí aos pontapés) do conservador irlandês Edmund Burke: “Uma voz permanente, serena mas firme, num oceano de mudança, que simplesmente aguarda o regresso do bom senso e do bom gosto.”

A minha avó e a minha mãe nunca precisaram de escrever o nome dos filhos nos braços e nas pernas para terem os seus nomes gravados no coração e sacrificarem as suas vidas por eles. E não deixa de ser irónico constatar que, hoje, demasiadas vezes, o único que fica de tão efémeras relações é precisamente o nome do filho ou do amado esquecido num braço ou numa perna como uma lápide num cemitério.

Desde que me conheço, usei sempre o mesmo corte de cabelo. Umas vezes estive na moda (quando se usava o cabelo curto), outras vezes estive fora de moda (quando a moda era o cabelo comprido). Isso não significa que o meu cabelo tivesse permanecido sempre na mesma. Apesar do corte ser o mesmo, o cabelo mudou de cor e de quantidade. Ou seja, mudou naturalmente como tudo devia mudar.

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Hoje não há ninguém que não se queixe da falta de valores. Mas os valores são incompatíveis com as modas. Os valores são perenes; as modas são efémeras. Além disso, os valores nunca são de modas.

Aliás, está hoje na moda invocar “os valores que os meus paizinhos me ensinaram”, quando alguém se sente incomodado com os comportamentos de terceiros, ou seja, dos filhos dos outros. Ora, existe um valor sem o qual nenhum dos outros é sustentável, uma vez que é a trave mestra do edifício dos valores. Refiro-me, obviamente, à honra.

Quando fui professor do ensino secundário, houve um ano lectivo, na década de 1990, em que o tema da “Área-Escola” foi precisamente “os valores”. Na minha turma de 12.º ano, registe-se, não havia um único aluno (se fossem só os alunos já não era mau) que soubesse o que queria dizer “honra”. E, sendo a “honra”, a trave mestra do edifício dos “valores”, quando ouço a lengalenga dos “valores que os meus paizinhos me ensinaram” apetece-me sempre perguntar: quais foram os valores que os seus paizinhos lhe ensinaram?

A pergunta, no entanto, seria retórica, porque basta olhar para aquilo que foram os últimos 40 anos da nossa democracia para perceber que a honra está praticamente erradicada do território nacional. E sem honra, não há gente honrada e sem uma maioria de gente honrada não é possível existirem comunidades sãs nem instituições íntegras.