A maioria absoluta do Partido Socialista irá inevitavelmente trazer de novo à mesa o processo de regionalização e consequente referendo. O objetivo por detrás das cantigas do vigário, que procuram iludir a população vendendo uma ideia de aproximação dos decisores e desenvolvimento regional, é simplesmente o de criar um sistema mais alargado de rotação de políticos, num verdadeiro sistema de circulação que impeça que os “boys” do sistema percam o seu sustento.

O processo de regionalização agrada bastante a PS e PSD, que não irão perder tempo em tentar forçar o referendo e em acelerar o processo de criação de regiões em Portugal. Se olharmos apenas para a superfície deste processo, facilmente somos enganados pela ideia de aproximação das populações aos decisores políticos, pela maior autonomia regional, ou pelo menos por uma hipotética maior facilidade de tomada de decisão. Porém este cenário, para além de extremamente irrealista, tendo em conta os níveis burocráticos que encontramos em Portugal, originariam sim um maior fluxo de papelada e de incerteza de competências, num ciclo infindável (Junta-Câmara-Governo Regional-Ministérios) que, quando desdobrado, apenas resultaria em mais tempo de demora dos processos e num aumento do caos típico do setor público.

Então, se o objetivo do processo de regionalização não serve para beneficiar as populações, e muito menos para atenuar sentimentos fortes regionais (sendo Portugal um país territorialmente pequeno, pouco disperso e de cultura macro transversal a todo o território), porque querem os partidos do sistema avançar, de forma tão apressada, com o processo? É simples, quanto mais postos existirem, mais fácil será pagar favores e escoar as centenas e centenas de políticos de carreira que têm nas suas fileiras.

Podem dizer que estou a exagerar, mas se pensarem numa realidade que já hoje acontece, em que autarcas que perdem eleições, ou cujos mandatos acabam, entram na autoestrada política, com via verde, que os leva a deputados ou até a ministros, percebem que não estou a exagerar, mas apenas a constatar um facto. Com o processo de regionalização serão criados órgãos regionais, desde assembleias, governos regionais, centenas de assessores e pessoal administrativo que originará um aumento acentuado da despesa com cargos públicos e afins, que atualmente por si só já são elevados (quer do ponto de vista do número excessivo de cargos e pessoal eleito, quer pelos gastos que provocam com remunerações, senhas e despesas).

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Entra nesta realidade um novo conceito, o “Teorema de Medina”. Este teorema é o exemplo explicativo daquilo que o processo de regionalização iria acentuar, tornando prática corrente a passagem de cargo em cargo à custa do dinheiro público pago por todos nós. “Teorema de Medina” naturalmente inspirado no exemplo desavergonhado do ex-presidente da Câmara de Lisboa que, após ser derrotado nas eleições (isto após vários escândalos como o do fornecimento de dados de manifestantes russos anti-Putin à embaixada russa), foi apressadamente colocado na “pole-position” para assumir um ministério, neste caso das Finanças, de forma a dar continuidade a um ciclo (que foi antecipado pela derrota nas autárquicas), que leva a que os políticos de profissão socialistas nunca tenham de enfrentar o Mundo real ou entrar (em muitos casos pela primeira vez), no mercado de trabalho.

O “Teorema de Medina” parece um conceito que aplico exclusivamente ao ex-autarca, mas se pensarmos bem nos casos de PS e PSD, facilmente nos apercebermos de que centenas de autarcas que terminam ou perdem mandatos a cada eleição são rapidamente conduzidos ao parlamento ou a outras autarquias por esse país fora, num intercâmbio nacional de autarcas. Este fenómeno será cada vez maior com a regionalização, pois permitirá a escolha de quais os recentes “desempregados políticos” irão diretamente para a Assembleia da República, ou os que irão subir apenas um patamar e ingressar nos órgãos regionais.

Quanto às tentativas de justificar a regionalização como benéfica, é importante dizer que o caminho para maior autonomia local e menor necessidade de recorrer ao poder central é a descentralização de competências para as autarquias, originando uma maior celeridade e caráter direto dos processos de decisão, reduzindo as burocracias e facilitando a vida das populações.

É importante ter em conta todas as motivações que existem por detrás do desespero político em apressar o processo de regionalização, que se escondem sob a ideia de benefício para a população, mas que apenas serve para promover uma rotação de cargos e garantir que os Medinas deste país, os políticos de carreira e os dependentes políticos do sistema, nunca ficam sem cadeira para se sentar, e sem dinheiro público no bolso.

É engraçada no papel a ideia de regiões, mas o sorriso desaparece rapidamente quando percebermos que serve apenas para alimentar os vícios do sistema, às custas de todos nós.

Não precisamos de regionalizar, precisamos sim de reformar, urgentemente, este sistema de vícios e de dependentes de dinheiro público.