António Costa, Rui Rio, Fernando Medina, Américo Aguiar, Graça Freitas, João Cotrim de Figueiredo, Pedro Santana Lopes, Hugo Soares e a bastonária da Ordem dos Advogados Fernanda de Almeida Pinheiro, são as “personalidades”, para já anunciadas, que debitarão opiniões no novo canal informativo Now. O CEO da Medialivre explicou de forma cristalina e sincera o rol: se as almas mais ingénuas, como a minha, ficaram com um nó na cabeça com mais uma avalanche de políticos no activo, políticos na reforma e políticos com actividade suspensa com antena livre para “comentarem” a vida política país, ou seja, para comentarem a própria actividade onde se inserem ou pretendem vir a inserir, Luís Santana explicou que aqueles «não são comentadores, são protagonistas, significa que essas personalidades é que estarão no centro da acção».
É exactamente isto, e é honesto que assim seja. Se há público (e não sei mesmo se ele existe, mas imagino que sim) para tanto entretenimento informativo, é natural que se procurem os protagonistas e não os comentadores, até porque o país mediático tem muitos dos primeiros e poucos dos segundos, e nem julgo que haja algum mal nisso. Na sociedade do espectáculo e do entretenimento somos todos protagonistas. Mesmo que alguns, sobretudo no jornalismo com carteira, reclamem para si a isenção, a análise, a imparcialidade, o rigor, tudo isso não é mais que uma pretensão sem substância – até porque boa parte do jornalismo, salvo as raras excepções que confirmam uma regra, aprecia mais o protagonismo televisivo e o circuito almoçadeiro lisboeta do que qualquer outra coisa, embora tenha o particular gosto de invocar a sua superioridade moral de classe para se distinguir dos políticos propriamente ditos, também protagonistas, mas menos puros. Aqui já só há protagonistas, e eles dividem-se apenas em três categorias: os que têm relevância, os que não têm relevância (é o meu caso, e ainda bem) e os que, não tendo relevância, estão dispostos a muito para que ela um dia chegue. Tudo isto talvez se resuma a uma palavrinha simples, mas complexa: poder.
Recuemos ao primeiro dos protagonistas, ao pioneiro do facto político, ao maior dos profissionais do bitaite político, sem substância e sem interesse, ao pináculo do analista da espuma dos dias, da táctica e do xadrez partidário. Marcelo Rebelo de Sousa, hoje engalanado pelo palácio de Belém, foi o primeiro entre nós a compreender as lógicas do entretenimento informativo e político, e, desgraçadamente, talvez esteja a compreender agora que não são os lugares que fazem os homens. Marcelo, o protagonista, tinha mais poder enquanto profissional do espectáculo do que agora, oito anos depois de ter querido transformar em espectáculo o poder. Esvaziou, com isso, uma função de soberania, sabe Deus com que consequências.
Por outro lado, não há agora um Governo, mas protagonistas político-administrativos; e também não há bem um parlamento, mas protagonistas eleitos e mais dependentes dos palcos televisivos do que do poder que devia advir da função parlamentar. Os segundos condicionam os primeiros, numa nova geometria maioritária que bloqueia o país na incerteza e no pântano que se tornou a gestão das coisas do Estado. É, porventura, a réstia de poder soberano que por aqui resta, já ele diminuto face à relevância da burocracia europeia.
E também esta última é, na verdade, quem ordena ainda alguma coisa, já que os parlamentares europeus não se revestem ainda, e talvez nunca, da verdadeira força da soberania do Homem e da cidadania. É a burocracia a última réstia de poder? Será, talvez, mas também ela dependente daquilo a que se convencionou chamar «opiniões públicas», que é como hoje se designa a pequena casta de protagonistas telegénicos, os tais protagonistas travestidos de analistas aliados a consagrados leitores de teleponto sem trabalho jornalístico conhecido, que condicionam e moldam os sentimentos das massas populares, que flutuam num carrossel de emoções, entre telejornais e as telenovelas da hora seguinte. O poder substantivo é hoje e sempre o que de quem melhor manipula a emotividade da turba, cada vez menos racional, cada vez menos livre, para nos lembrar que esta não é a civilização que julga ser, mais parecida com as anteriores, que despreza, do que julga. Está tudo bem como está, e assim sucessivamente.