De que servem as manifestações pela paz no médio Oriente se não se conhece o que pode dar a paz aos homens? São boas intenções mas de que servem? O que nos pode obter a paz?
O recente golpe do Hamas sobre inocentes desencadeou entre nós um estado de ânimo de impotência diante do mal, de incapacidade de fazer a paz. A recorrência deste sentimento milenar pode levar ao desespero. Ou não. Neste ponto estou com Péguy, autor do que foi já considerado como o mais assombroso poema sobre a esperança de toda a literatura contemporânea, Os Portais do Mistério da Segunda Virtude. Aí se diz poeticamente que Deus não se admira tanto com a fé ou a caridade dos humanos, mas com a sua esperança: Que aqueles pobres filhos vejam como vão as coisas e que acreditem que será melhor amanhã de manhã, isso, sim, Me espanta!
Péguy nasceu em 1873, tal como Teresinha de Jesus, uma doutora da Igreja que entrou com quinze anos para o Carmelo tendo morrido aos 24 anos, com tuberculose. Apesar de fechada entre quatro paredes, a Igreja proclamou-a co-padoeira das Missões, com S. Francisco Xavier, e acaba de ser objecto de uma Exortação Apostólica, a celebrar o seu nascimento, há 150 anos.
Não escreveu grandes tratados, mas é uma teóloga genial a mostrar, numa época onde o orgulho impera, a irrazoabilidade do racionalismo, dando um passo em frente no conhecimento que os homens podem ter de si mesmos e de Deus. Por isso, em 1997 S. João Paulo II a proclamou Doutora da Igreja, ao lado de Teresa de Ávila, Catarina de Sena e Hildegarda de Bingen. Sendo a mais nova de todas não é por isso a menos madura, tem intuições da fé tão vastas e profundas que a tornam digna de ser posta entre os grandes mestres espirituais.
Beatificada e canonizada em tempo record (morre em 1894, é beatificada em 1923, e canonizada em 1925), à sua Basílica de Lisieux chegam diariamente milhares, destacando-se como o segundo lugar de peregrinação de França, logo a seguir a Lourdes. Vêm agradecer as graças recebidas, a “chuva de rosas” que ela prometeu, ela que disse que queria passar o Céu a fazer o bem na terra. O manuscrito “História de uma alma”, escrito no convento nos seus dois últimos anos de vida, e disseminado de forma extraordinária, é o segredo de tanto sucesso.
Nesta época de ”autorreferencialidade”, Teresinha corta a direito e procura um caminho simples, que seja para todos a possibilidade de alcançar aqui o Céu. Foi assim que entrou para o Convento, para salvar todos, entregando-se quotidianamente, de forma simples, a mostrar que essa simplicidade está ao alcance de todos. “A minha vocação é o amor, amar todos, todos, todos, como Jesus os ama“, confessa ela no livro que é um testemunho de vida, uma pérola teológica no coração da Igreja, lugar onde ela sempre quis estar.
A sua genialidade teológica está em ter descoberto um caminho simples para chegar a Deus. O realismo de Teresa, de que não sabe amar, tem o outro lado que é o saber que a fonte do amor tem um nome e uma face: Jesus (Santa Teresa tem por isso o nome de Teresa de Jesus e da Santa Face). É Ele que é fonte de Amor, e por essa razão é o Caminho simples. Simples porque é Ele que a leva nos braços. Com efeito, o caminho é para aqueles que confiam e se deixam erguer nos braços do Amor. “Jesus, o meu único amor”, lê-se nas paredes do seu quarto…
Teresinha parte do realismo de se saber incapaz de amar. Desde criança sabe que é amada, escolhida, a “minha rainha”, como a chamava o pai, o pai que com ela dava grandes passeios nos quais o céu mostrava o “t” que faziam as estrelas com o seu nome, e as flores, o jardim das almas vivas. Mil graças recebeu na sua infância, outras tantas sente que é chamada a dar. Mas como o poderá fazer se é incapaz? Vai ser capaz juntando-se ao seu amor.
Assim a simplicidade do caminho traz uma grande exigência. No seu caso a exigência de um amor até ao fim, sofrendo a doença com sentido, juntando-se a Jesus, por ela e por nós crucificado. Jesus o ascensor que a levou ao Céu onde está agora a fazer o bem na terra.
A nova Exortação Apostólica do Papa a ela dedicada dá conta da chave do que deve ser o conhecimento. O conhecimento é visto como empenho de uma razão à qual não pode ser alheio o sentimento. Nos antípodas do racionalismo das “luzes”, que postulou que o sentimento é um obstáculo da razão, a Igreja oferece uma doutora que nele vê um aliado imprescindível para o conhecimento da verdade.
Teresa mostra que sem confiança não se pode conhecer. Não se trata da apologia de um sentimentalismo mas de se pôr o sentimento no seu justo lugar.
S. Teresinha não está com meias medidas, como as crianças ela quer tudo, não quer ser uma santa a meias, e por isso diz: só a confiança, e nada mais do que a confiança, nos pode conduzir ao Amor que tudo dá, a paz no Médio Oriente e não só!