Como é que Feliciano Barreiras Duarte chegou até aqui? Não é uma pergunta retórica, convém mesmo perceber: como é que Feliciano Barreiras Duarte acumulou suficiente importância para se tornar secretário-geral do PSD?

Não foi, como se tornou tristemente evidente, pela excelência académica. Feliciano Barreiras Duarte gosta de se apresentar como um universitário dedicado e reconhecido, sempre em busca da excelência, mas a realidade é desanimadora. A licenciatura: demorou 11 (vamos repetir por extenso: onze) anos a acabar o curso, na Universidade Autónoma, com escassos 11 valores. O mestrado: o seu relatório foi apreciado por três membros dessa extensa agremiação a que se chama “classe política” e recebeu 18 surpreendentes valores por um texto que torturava vírgulas, acentos e concordâncias. A “visiting scholarship” em Berkeley: foi uma fantasia sem justificação nem desculpa.

Feliciano Barreiras Duarte também não chegou aqui, como demonstrou o Expresso, pelo seu arsenal intelectual. O ex-secretário-geral do PSD gaba-se da sua “vastíssima” obra, mas ela resume-se, em grande parte, a serviços de clipping das suas crónicas em jornais ou de legislação avulsa apresentada em forma de livros supostamente jurídicos.

Não foi, ainda, pelo seu sentido de oportunidade geográfica: quando exercia um cargo político no Bombarral, declarava, para efeitos de subsídios de transporte, que vivia em Lisboa; e, quando exercia um cargo político em Lisboa, declarava, para efeitos de subsídios de transporte, que vivia no Bombarral.

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E não foi pelo seu brilho no inevitável percurso nos jotinhas ou no partido. Como o Observador escreveu, Feliciano Barreiras Duarte tinha uma incompatibilidade com os computadores e com a língua inglesa falada que levou Pedro Passos Coelho do cepticismo na JSD à aversão no PSD.

Apesar de tudo isto, Feliciano Barreiras Duarte tornou-se um pequeno colosso político. Foi presidente da Assembleia Municipal de Óbidos, deputado em quatro legislaturas e, pasme-se, secretário de Estado em três governos. A dada altura, atingiu o invejável e concorrido estatuto de consciência crítica do PSD, tornando-se numa espécie de Grilo Falante da social-democracia. Quando Passos Coelho já estava a centímetros da queda, foi entrevistado pelo Expresso e apresentado como “a maior autoridade do PSD sobre políticas de imigração” (“Não é uma voz qualquer”, lia-se no artigo). Pronto para se vingar do líder que o abandonara, afirmou, com angelical pureza: “O PSD, pelo que se percebe, também tem racistas e xenófobos”.

Nestes últimos dias de exposição pública, percebeu-se que Feliciano Barreiras Duarte é penosamente transparente. Bastará falar dez minutos com o ainda deputado para perceber o que vale (ou não vale) o seu currículo e a sua experiência. Como se explica, então, a sua carreira no partido, no parlamento e no governo? Há uma razão muito portuguesa para isso: todos os que mandaram nos laranjinhas nas últimas décadas olhavam para ele e viam “um dos nossos”. Ele não é um estudante brilhante, mas é “um dos nossos”; ele não é um jotinha efervescente, mas é “um dos nossos”; ele não é um deputado estratosférico, mas é “um dos nossos”; ele não é um governante inesquecível, mas é “um dos nossos”.

A melhor explicação para a ascensão de Feliciano Barreiras Duarte está condensada numa frase dita por Miguel Relvas a Passos Coelho, depois de o líder do partido o ter preterido várias vezes para cargos, e que está citada num artigo do Rui Pedro Antunes no Observador: “Já o deixámos fora da Comissão Política, temos de o levar para a sede”.

Parece um mantra, que passou de Durão Barroso para Santana Lopes, de Santana Lopes para Passos Coelho, de Passos Coelho para Rui Rio: ele é “um dos nossos”, “temos de o levar”. E levaram: cargo após cargo, ano após ano, degrau após degrau, numa improvável subida que todos pagaram caro. Pagámos nós, que assistimos a uma história escusada, e pagou Feliciano Barreiras Duarte, que agora viu essa história chegar irrevogavelmente ao fim.