Não! Este artigo não é sobre “pets”, não é escrito por um eleitor do PAN, nem tão-pouco é uma crónica de variedades.

É uma alegoria.

Os cães descendem dos lobos, como sabemos, e o que se discute é como é que, no início, houve a aproximação que acabou levando à sua domesticação.

Talvez a teoria mais consensual, e até mais lógica, é que tudo se deu por interesse de ambas as partes.

Algumas alcateias terão seguido o Homem, aproveitando-se dos restos de comida que este deixava das suas caçadas.

Instintivamente aperceberam-se que, cedendo uma parte do seu território aos humanos, obteriam alimento fácil. Por outro lado, as tribos deram conta que estavam mais protegidas de ataques de outros animais e permitiram a aproximação.

Com o passar do tempo, as novas gerações de lobos não eram mais capazes de caçar sozinhas e o Homem era a sua única fonte de alimento.

Assim, e até aos dias actuais, passaram a coexistir lobos, cães assilvestrados e cães domesticados.

Portugal é um país de “cães domesticados”! Há muitas décadas que o “lobo” está em vias de extinção no nosso país e os “cães assilvestrados” têm de cruzar a fronteira para que o “Dono” não os apanhe e volte a domesticar.

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Desta forma, os “lobos” vão-se extinguindo, porque a sua “floresta” vai sendo derrubada pelo “Dono”; os “cães assilvestrados”, gostando do sabor da liberdade, migram para territórios transfronteiriços onde ainda há “floresta virgem” e apenas permanecem os “cães domesticados”.

Sim, tal como os cães primordiais e os actuais, os “cães domesticados” também precisam de um “Dono”, um macho alfa que eles vejam como líder. Um protector, um provedor de alimento, um orientador.

Na passagem do Paleolítico para o Neolítico a função do cão teve de se adaptar, (deixou de ser apenas utilizado para caçar e passou a ter, também, uma função de protecção e pastoreio), levando o Homem a fazer cruzamentos para o tornar mais dócil. Também o “Dono” dos tempos modernos sempre procurou adestrar com rigor e precisão os “cães domesticados” tornando-os mais dependentes e obedientes.

O cão totalmente domesticado e adestrado não foge! Perante uma porta aberta para a liberdade permanece sentado. Diante da sua possível libertação baixa o focinho e contempla-a com ternura por alguns instantes dando, em seguida, meia volta e vai deitar-se junto do dono à lareira.

Os cães domésticos, assim como os “cães domesticados”, não querem liberdade!

Os cães domésticos, assim como os “cães domesticados”, têm um tecto e ração na gamela.

Os “cães domesticados” falam sobre a Liberdade com ternura e encanto, com paixão e sentimento, com exaltação e fulgor, com afinco e apego. Mas é apenas isso. Falam, mas não a querem!

A Liberdade é bonita, mas para os “lobos”. Coitados! pensam os “cães domesticados”. Por um lado não têm dono, podem acordar e dormir quando querem, ir para onde querem, como querem, com quem querem e ao ritmo que querem. Mas, por outro lado, que vida dura deve ser terem de caçar o seu alimento, encontrar e manter o seu abrigo e prover às suas crias. Então e o que acontece se uma caçada é malsucedida, se numa viagem magoam uma pata ou se no seu território aparecem outros predadores a disputar as mesmas presas?

É verdade que os “cães domesticados” têm a liberdade muito reduzida, seguramente não têm a liberdade dos “lobos”, mas convivem e aceitam essa realidade porque, com o básico garantido, têm de lutar por muito pouco. De quando em vez lá recorrem a um ganido ou a um sinalizar de pata no joelho do “Dono” para conseguirem uma guloseima. Essa pequena benesse a troco de uma manifestação de subalternização e, muito provavelmente, em troca de uma parte da ração a que teria direito (diminuída para não engordar), logo faz o “cão domesticado” abanar a cauda numa clara manifestação de contentamento e agradecimento.

Há diferenças intrínsecas e de ambição entre as três espécies.

Os “lobos” e os “cães assilvestrados” são temerários. Os “cães domesticados” são temerosos.

Os “lobos” e os “cães assilvestrados” não só querem ser donos do seu destino como delineadores do seu trajecto. Os “cães domesticados” entregam o seu destino ao “Dono” e deixam-se levar pela trela.

Os “lobos” e os “cães assilvestrados” são ambiciosos. Os “cães domesticados” são desambiciosos.

Para os “lobos” e os “cães assilvestrados” “Mais vale uma tempestuosa liberdade, que uma tranquila escravidão”. Para os “cães domesticados” “Anda de teu amo ao sabor, se queres ser bom servidor”.

Os “cães domesticados” votam no estatismo e no colectivismo, votam PCP, BE, Livre, PAN, PS, PSD e Chega.

Os “cães assilvestrados”, querendo ser “lobos”, e os “lobos” votam na Liberdade, votam IL.

Assim como no mundo dos canídeos se assiste a desfiles para ver qual o cão mais bonito e a concursos de perícia para escolher o cão mais adestrado, no dia 10 de Março iremos, uma vez mais, testemunhar a eleição do “Dono” pelos “cães domesticados”.