No início da década de 80 do século passado o número aproximado de barracas em Oeiras era de 5.000. Nos 15 anos subsequentes, o Município, liderado por Isaltino de Morais e com apoio da Administração Central, de fundos europeus e de financiamento bonificado, conseguiu erradicar esse flagelo social.

Este processo nem sempre foi pacífico nem justo e, apesar de se terem registado muitos abusos e aproveitamento (casos houve em que os beneficiários voltaram para as barracas, alugando as habitações sociais), pode dizer-se com propriedade que o programa foi bem-sucedido.

Embora a linha de acção seguida não tenha sido justa, correcta, nem a que promoveu maior desenvolvimento económico, de um ponto de vista de coesão social e sobretudo de urgência na resolução do problema sem grandes tumultos, pôde justificar-se.

Mais recentemente, o executivo camarário volta a querer ter um papel preponderante no mercado imobiliário, só que desta vez não está em causa um problema premente, urgente e de coesão social, mas antes uma ingerência abusiva e arbitrária da esfera pública no sector privado com uma justificação pífia e falaciosa.

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A Autarquia, magnânima, pseudo caridosa e benfazeja, através do seu programa de habitação jovem, tem vindo a adquirir imóveis degradados e devolutos a particulares, remodela-os e arrenda-os a jovens com rendas bastante acessíveis.

Haverá então algum problema com tanta ilusória bondade? Sem dúvida que sim!

Colocam-se desde logo problemas éticos e problemas económicos. Esta acção é eticamente reprovável, porque se trata de ser benfeitor com o dinheiro alheio e porque pode e deve ser encarada como uma forma de comprar votos com recursos de terceiros. É economicamente errada porque a função da Autarquia não é ser agente imobiliário e, encapotadamente, prejudicar todos os oeirenses em benefício de uns poucos.

Mas afinal, qual o pretexto para tal actuação? Simples! Diz o autarca omnipotente que o intuito é dinamizar os centros históricos do Concelho através da promoção da habitação jovem a preços acessíveis. Ora, o problema não está no objectivo, mas sim na forma como se pretende alcançá-lo. Está tudo errado. Está tudo do avesso.

Primeiro que tudo, há que questionar o porquê do trabalho que a Câmara faz com os imóveis devolutos não ter sido feito por particulares. Neste boom imobiliário a que se tem assistido, tem-se visto um pouco por todo o Concelho a remodelação de imóveis devolutos, inclusivamente nos centros históricos. Se mais não há é por acção do avesso da Autarquia. Se o executivo camarário quer ter algum papel, então que promova esse dinamismo. Não transformando-se num “player” do mercado, mas sim agilizando os processos de construção e requalificação, eliminando barreiras processuais e reduzindo custos administrativos e de contexto. É essa a função de uma autarquia. Ou deveria ser. Está tudo do avesso.

No entanto, poderá sempre dizer-se que deste modo, uma renda num qualquer centro histórico atingirá valores incomportáveis para a maioria dos jovens. Ainda que com mais habitações disponíveis os preços das rendas tendam a baixar, é seguro que nunca atingirão os valores das rendas subsidiadas a que a Câmara disponibiliza os apartamentos. Mas estará certo subsidiar rendas em locais privilegiados à custa dos impostos cobrados aos Oeirenses? Sobretudo habitando muitos deles em condições e localizações piores e tendo que pagar as suas habitações com o esforço do seu trabalho? Estará certo beneficiar um ou dois punhados de jovens no meio de tantos? Será justo retirar essas habitações do mercado, inviabilizando outros Oeirenses capazes de pagar as rendas de mercado, só porque arbitrariamente o senhor presidente do Concelho acha que os jovens valem mais que os demais?

Segundo; será que este é o melhor caminho para dinamizar os centros históricos? Será que são os jovens de parcos rendimentos, com estilos de vida muito particulares e a habitarem normalmente sozinhos que vão dar vida a estas localidades e fomentar a actividade económica? Ou será mais legitimo pensar-se que são tipicamente as famílias, nomeadamente da classe média, de 3 ou 4 elementos, que saem para comprar o pão, que vão a pastelarias, cafés e restaurantes, que compram o jornal, vão à praça e adquirem bens e serviços no comércio circundante que mais impulsionam o mercado local? Uma vez mais, tudo do avesso.

Terceiro; sempre que há este tipo de programas públicos levantam-se suspeitas sobre a alocação dos recursos, critérios de avaliação, beneficiários e interesses. É impossível não circular por Oeiras sem ouvir relatos sobre a atribuição de determinado apartamento a filho de fulano e a sobrinho de beltrano.

Uma coisa é certa, o Município só tem este e outros programas porque terá rendimentos para isso. Ora, se não sabem bem onde aplicar os recursos e acabam por criar programas nefastos, danosos e contraproducentes, então que deixem o dinheiro a quem o esmifram e que tanto se esforça para o obter: o contribuinte Oeirense.

Se a Câmara tem recursos em excesso e quer dinamizar os centros históricos, então que devolva os 5% do IRS cobrado aos Oeirenses (neste momento apenas devolve 0,3%), que distribua por todos os Oeirenses um dístico de residente no Concelho que permita a que estes possam aparcar os seus veículos por um período de tempo definido sem ter de pagar parquímetro em Oeiras, que invista em parques para bicicletas e que continue a promover eventos nessas zonas.

Dará sempre melhor uso ao dinheiro o Oeirense que trabalhou por ele do que o Presidente de Câmara, qualquer que ele seja. Pelo menos um presidente liberal seria assim que iria agir e governar.