A inteligência nacional passou semanas a dizer que o comissário estava condenado a uma pasta menor na nova Comissão Europeia. Os argumentos variaram. Não tinha “peso político”, disseram uns. Era “ultra-liberal”, acrescentaram outros. Houve mesmo quem o acusasse de “não ser mulher” (a única acusação impossível de refutar). Eis mais um novo mistério na política portuguesa: um homem “neo-liberal” sem experiência política conseguiu uma das pastas com mais recursos financeiros na Comissão Europeia e à qual muitos outros (e até outras) aspiravam.

Na Comissão Europeia, há basicamente três tipos de pastas. As que têm poder, mas não possuem muitos recursos financeiros para investir, como por exemplo a concorrência e o comércio. Aquelas onde não há dinheiro nem um verdadeiro poder legislativo, como o trabalho, as questões sociais, a cultura, a educação. Ou seja matérias que no essencial estão sob competências nacionais. E por fim, existem pastas onde há dinheiro para investir e poder legislativo. A pasta da investigação, ciência e inovação faz parte das últimas.

A pasta atribuída a Moedas é uma das poucas que fará parte dos quatro “clusters” centrais da Comissão: crescimento e competitividade, economia digital, Euro e diálogo social, e união energética. Este facto demonstra o significado da investigação, ciência e inovação. Além disso, Moedas vai gerir um dos programas mais relevantes da Comissão Europeia, o programa Horizonte 2020, com elevados recursos financeiros. O seu mandato aplica-se à investigação aplicada ao sector empresarial, nomeadamente às pequenas e médias empresas, e a áreas como a inovação energética e as tecnologias digitais. Conhecendo a excelência que muitos sectores em Portugal têm alcançado nestas áreas, muitas vezes fora das grandes cidades e no sector privado, a pasta de Moedas abrirá boas oportunidades ao nosso país.

Depois de dez anos com a Presidência da Comissão Europeia, nunca seria fácil para Portugal conseguir uma pasta relevante. Este sim, era um problema a ultrapassar. E foi ultrapassado, em primeiro lugar pelos méritos do candidato. Os quase três anos no governo a exercer funções muito exigentes e numa situação complicada deram a Carlos Moedas um grande prestígio em Bruxelas. Uma imagem de competência, de seriedade, de empenho conta muito e sobretudo dá confiança a quem escolhe. É muito mais importante do que auto-elogios e proclamações vazias e irrelevantes.

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Em segundo lugar, a pasta atribuída a Moedas constitui um triunfo para o governo português. A determinação na condução do programa de ajustamento, contra a maioria da oligarquia nacional, e a estratégia de apoio a Juncker desde o início do processo de escolha do Presidente da Comissão Europeia (estou à vontade para o dizer, porque discordei dela; mas a verdade é que correu bem) explicam o sucesso do executivo. Parece que afinal o governo português tem mais influência na Europa do que muitos em Portugal julgam. Se não tivesse, não dariam a um seu antigo membro uma pasta com centenas de milhões de Euros para investir. Podem ter a certeza.