A Universidade Católica Portuguesa (UCP) fez, neste mês de Outubro de 2018, cinquenta anos. Se, para qualquer instituição civil, cinquenta anos de vida é já uma idade respeitável, a verdade é que, para uma universidade, cinco décadas não é mais do que um começo. Decerto, um início auspicioso, mas apenas isso, porque as grandes universidades não fazem anos, mas séculos e, por isso, este aniversário é quase uma insignificância, se comparado com a antiguidade das universidades de Bolonha, Paris, Salamanca ou Coimbra. Mas, se os homens não se medem aos palmos, as universidades também não se comparam pela sua idade, mas pelo serviço que prestam à comunidade. Neste sentido, a verdade é que a UCP prestou, e continua a prestar, um extraordinário serviço que não pode ser subestimado, à cultura nacional e a Portugal.

“A UCP – segundo a sua reitora, Professora Isabel Capeloa Gil – nasceu como ideia e promessa e realizou-se ao longo de 50 anos em acções concretas de formação qualificada de profissionais, na renovação, nos modelos de ensino e na introdução de formações académicas inovadoras, com forte impacto em Portugal e além-fronteiras. Servimos concretamente o país, orientados por valores que não se reduzem ao critério da utilidade, mas que se alargam à universalidade última de um conhecimento ao serviço do bem comum”.

Para comemorar, em termos científicos, estas cinco primeiras décadas da sua existência, a UCP houve por bem produzir dois extraordinários textos, de grande qualidade intelectual: uma história institucional, sob a sapiente direcção de um seu ex-reitor, o Professor Manuel Braga da Cruz; e um estudo sobre o seu impacto na sociedade portuguesa, por uma equipa chefiada pelo Professor André Azevedo Alves, do Instituto de Estudos Políticos (IEP).

A história da Universidade Católica Portuguesa – tal como é referida no dito estudo – encontra-se inevitavelmente ligada à história da Igreja e de Portugal. Muitas das mudanças políticas e eclesiais ocorridas no nosso país, nestes últimos cinquenta anos, condicionaram e desafiaram a UCP, ao mesmo tempo que também a UCP, no âmbito da sua missão institucional, contribuiu para impulsionar e moldar o país e a Igreja portuguesa.

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Agradeço ao Professor André Azevedo Alves a amabilidade de me ter permitido consultar o estudo que tão sabiamente moderou e que procurou analisar, com rigor científico, o impacto causado pela UCP na sociedade portuguesa. Alguns dos números, revelados nessa investigação, são muito significativos do montante e da importância da riqueza proporcionada ao país, por esta tão prestigiada e benemérita instituição universitária que, contudo, não aufere quaisquer subsídios estatais.

Com base num inquérito dirigido à comunidade de alumni UCP, é estimado um total de seis mil e quinhentas empresas criadas pelos seus ex-alunos; e mil e setecentas organizações não-governamentais (ONG) e outras instituições de solidariedade social também promovidas pelos seus antigos estudantes. Resultantes das ditas empresas, ONG e instituições sócio-caritativas, nestes primeiros cinquenta anos da sua história, a UCP, por via dos seus ex-alunos, terá sido assim responsável pela criação de cento e sessenta seis mil empregos em Portugal!

Em termos monetários, as contas são ainda mais impressionantes, porque é estimado em 18 mil milhões de euros o impacto directo da UCP na economia portuguesa, durante este meio século de vida e, na actualidade, cifra-se em mais de seiscentos milhões de euros, segundo o mesmo estudo, a sua repercussão anual na economia nacional.

Muito embora estes índices não esgotem a relevância da UCP na sociedade portuguesa, até porque a dimensão qualitativa é sempre mais importante do que a meramente quantitativa, estes números são quanto basta para que se possa concluir, sem favor nem exagero, que a UCP é uma das instituições não-governamentais que, no nosso país, presta um maior e melhor serviço público. No entanto, como frisou a sua reitora, “ a UCP é atualmente a única universidade católica europeia sem qualquer apoio do Estado”.

Em termos de qualidade profissional, registe-se que, das dezoito empresas que actualmente constam no PSI 20, quinze têm, nos seus conselhos de administração, ex-alunos da UCP. A este propósito, refira-se também a grande aposta da UCP na investigação científica: em 2017, contava com mais de mil e cem investigadores que, no último triénio, ganharam 35 prémios científicos; registaram 30 novas patentes; e publicaram, em revistas indexadas, mais de mil e duzentos artigos académicos. É também interessante verificar a grande qualidade científica dos seus doutorados ‘honoris causa’, nomeadamente o já falecido Padre Luís Archer, jesuíta, internacionalmente reconhecido pela sua competência no que respeita às ciências da vida; e os Cardeais Gianfranco Ravasi e Sean O’Malley, que dispensam apresentações.

Ainda duas notas surpreendentes sobre a UCP. A primeira para registar que, ao contrário da grande maioria das instituições e empresas portuguesas, em que se mantém a predominância masculina, a UCP é um exemplo de quase perfeita paridade. Com efeito, 59% dos estudantes são do sexo feminino; 48% dos docentes e investigadores são também mulheres, bem como 45% das pessoas que ocupam cargos de gestão na UCP, a começar pela actual reitora, a Professora Isabel Capeloa Gil, que sucedeu no cargo à Professora Maria da Glória Garcia. É também um significativo índice da sua modernidade o facto de alunos de 91 diferentes nacionalidades frequentarem as suas aulas, muitos deles vindos do estrangeiro para este efeito, atraídos pelo prestígio internacional da UCP.

No que respeita mais directamente ao serviço à comunidade, é chamativo que, também com base no inquérito dirigido à comunidade de alumni, se estime que estes dediquem a actividades de voluntariado social cerca de 102 mil horas por mês. Neste sentido, é inegável que esta escola superior não apenas forma alguns dos melhores profissionais das diferentes áreas que lecciona, mas também cria cidadãos que, pela sua solidariedade social, são uma mais-valia nacional. Com certeza que, procedentes de outros estabelecimentos de ensino superior, também há excelentes profissionais e óptimos cidadãos, mas é inegável que a conotação religiosa da UCP se afirma sobretudo pela sua vocação de serviço à população, que garante tanto por via da competência profissional que proporciona, como também pela sensibilidade social que desperta e incentiva. A sociedade não precisa apenas de técnicos competentes nas diversas áreas do saber, carece sobretudo de mulheres e homens que saibam fazer da sua profissão um serviço ao bem comum e aos outros.

No encerramento das celebrações dos 50 anos da UCP, o Presidente da República, Professor Marcelo Rebelo de Sousa, também ele um ilustre universitário, condecorou a instituição com as insígnias da Ordem da Instrução Pública, em reconhecimento formal “do contributo da UCP a Portugal, o mesmo é dizer aos portugueses: cinco décadas de devotado serviço à educação e à cultura, de notável sentido de missão comunitária, de porfiada preocupação pelo bem comum”.

A brevidade deste texto não permite fazer referências pessoais, mas permita-se uma excepção, para citar o Professor Cónego João Seabra, director do Instituto Superior de Direito Canónico da UCP. Licenciado em Direito pela Universidade de Lisboa e formado em Teologia pela UCP, doutorou-se em Direito Canónico pela Pontifícia Universidade Urbaniana, com uma magistral tese sobre “A lei portuguesa da separação do Estado e das Igrejas, de 20 de Abril de 1911”. Foi também, durante vários anos, capelão da UCP.

Pelo seu amor a Deus e fidelidade à Igreja e ao Papa e pela união ao seu Bispo, os vários Patriarcas de Lisboa, pela sua brilhantíssima inteligência, pelo seu patriotismo e pela coragem da sua intervenção pública, pela generosidade e universalidade do seu fecundo apostolado, pela excelência dos seus escritos, o Padre João, que é também um magnífico canonista, é uma honra para a UCP, para a Igreja e para a cultura portuguesa. Seria da mais elementar justiça que o Estado, que em boa hora condecorou recentemente o reitor português da prestigiada Universidade Gregoriana, em Roma, reconhecesse também o mérito de uma vida e obra dedicadas ao ensino, à cultura e a Portugal.

Universidade católica é um bis in idem, porque estes dois termos têm, na sua origem, o mesmo significado. Queira Deus que a UCP se mantenha sempre aberta à universalidade dos saberes e dos carismas eclesiais, saiba acolher a todos e seja fiel à sua missão de investigar e de ensinar a verdade que o próprio Cristo é (cf Jo 14,6). Para a nova etapa da sua história, que agora começa, um voto: que se mantenha fiel ao seu compromisso de formar, não apenas excelentes profissionais, mas sobretudo cidadãos que, cristãos ou não, ponham sempre o seu saber ao serviço do bem comum e dos seus irmãos, preferencialmente os mais carenciados.