Ainda a procissão ia no adro, com o Tejo e o Marquês aos pés, e já o Papa Francisco nos abraçava totalmente. E foi até domingo todo um esplendor na relva, à maneira do Glorioso!

Com os olhos a transbordar de espanto, encantou-nos. Da mochila de peregrino tirou a esperança real, aquela que trazemos todos, todos, todos, no mais fundo do nosso abismo, do nosso nada!

Não uma qualquer piedosa intenção, não, não foi por aí. Jorge Mário Bergoglio trazia no sorriso o autor do Céu e da Terra. Confirmando-me na certeza de que o meu nome está inscrito nos céus, viajou comigo, e com milhares, na terra que sinto minha, mas que é, afinal, Sua! Foi de Vós que a recebi, lembrou Amália!

Assim a Jornada Mundial da Juventude (JMJ), contrariando muito do que a seu respeito se comentou, levou-me a focar-me no que esteve em causa: o país europeu com o rosto mais belo e antigo, que cresceu no destino de içar velas e atravessar ondas. Imagem que inspirou o discurso do sucessor de Pedro na hora de despedida, a milhão e meio de surfistas, tornando, nessa hora, Lisboa ainda mais bela. Uma nova e promissora Nazaré!

A JMJ levou-me e leva-me a refletir sobre a Igreja e o País a que pertenço. A olhar para o Papa Francisco e para os portugueses, todos, todos, todos…

Olho muitas vezes para um espelho, como Fernando Pessoa, e não me encontro, não me vejo, mas quero. E, já agora, a querer, quero o Infinito!, foi o tema de uma das exposições desta JMJ, que gozei no Pátio da Galé.

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Sem dúvida que foram os jovens que nos entraram pela casa adentro. Um festival de juventude singular, e assim – importa sublinhar com saber de experiência feito – porque foi um acontecimento singular: verbum factum est. Os jovens são o Agora de Deus, é assim que o Papa Francisco os viu e vê.

Mostrando momentos únicos de uma espantosa dimensão que não encontram paralelo noutros festivais de juventude, a JMJ trouxe ao de cima a verdade da experiência cristã. O Cristianismo não é uma miríade de discursos, mas sim um Acontecimento que dá conta do que está sempre a acontecer.

E o que aconteceu em Lisboa foi algo impossível de ter sido planeado. E certamente que foi necessário tudo planear ao milímetro, não só da parte do Governo, mas também da Igreja. Contudo o resultado de todo o trabalho de preparação foi desproporcional, e por isso tão grande e esmagador.

Pouco interessará perder tempo em arrumar a Igreja entre esquerda e direita, popular e intelectual. Para ilustrar este ponto pego na forma como as pessoas viram o Papa Francisco, Ele, a Igreja e eu em foco nestes dias.

Há quem diga que Ele é que é, e que os Papas que o antecederam, S. João Paulo II e Bento XVI, eram elitistas fechados, a impedir o progresso. Este ponto morre com os fenómenos que temos visto neste dias. Então o progressista Papa Francisco rejeita aborto e eutanásia!? E Fátima, para muitos ilustrados, lugar de superstição e atraso, leva o homem aberto a inclinar, a rodar o terço, na certeza de que “temos mãe”. Sim, Francisco é progressista, mas progressista do amor. Um amor que só avança se olhar para cima, para assim poder olhar para baixo!

Se a Igreja entre nós está dividida entre conservadores e progressistas, a discutir, por exemplo, quem será o próximo cardeal de Lisboa, isso é questão de lana caprina. Ficar a teorizar é passar ao lado do Acontecimento, que não se deixa agarrar em palavras. É fugir ao Amor que tudo inclui e tudo espera…

Eu vejo este Papa como um homem de um entusiasmo e bondade desarmantes, olho para Ele – mistura de Franciscos, de Xavier e Assis – como a Pedra sobre a qual a Igreja se constrói e verifico que Ele me confirma no essencial. Quando diz que o Senhor ama uma pessoa transexual não faz uma revolução. A revolução no Amor foi feita há mais de 2000 anos, e deu-se numa Cruz, mostrando que a revolução no amor se faz em profundidade, a do impacto dos pregos naquelas mãos e naqueles pés, por mim, por todos os nomes.

E se nem sempre oiço da boca do Papa aquilo que gostaria de ouvir, confio, e vou verificando que Ele é a pessoa certa, no lugar certo, no momento certo. E que, como alguém disse, Deus não se engana, nem me engana. Sei que “todas as coisas estão onde devem estar e vão para onde devem ir: para o lugar reservado por uma sabedoria que (o Céu seja louvado!) não é a nossa.” (O.V. Miloz).

A JMJ é um maravilhoso e surpreendente vibe de viagens na minha terra, a exceder planeamento e expectativas. Jovens acolhidos por famílias portuguesas, mais ou menos abastadas, juntam água ao feijão e seguem; jovens monjas de clausura que fazem as JMJ no Convento não podem vir a Lisboa mas acolhem monjas estrangeiras.

Jovens de joelhos em Fátima, na rampa de sacrifícios onde é costume vermos pessoas de meia idade. Muitos e de todas as cores, a desmentir que a penitência está fora de moda. Ou um ciclo de Cinema criado pelo Festival da juventude, e diante da apresentação de 5 filmes do Cinema de Francisco, Kurosawa, Vitorio de Sica, Fellini, Mario Camerini e Gabriel Axel. Um dos presentes, no período de debate, testemunhou uma experiência de comunhão, inesperada e improvável…

O parque Eduardo VII na missa de abertura, num puzzle de idades, países e vocações em torno de um altar comum. Os celebrantes com casulas novas, como que a dizer que os abusos que são os pecados, como os que feriram mais de 4.800 menores, não definem a Igreja nem as vítimas.

O mesmo se diga da Europa, assolada há séculos por pandemias e guerras, agora a da Ucrânia. Quando se pensava que depois de Nagasaki jamais, o que temos é prova de que a paz não se faz por um esforço, por mais genuíno que seja.

O Senhor do Cosmos e da História não é autor de fragmentações. É sim a razão de ser da riqueza da diversidade de rostos e culturas, também no interior da Igreja, ela que não é uma entidade abstrata mas tem o rosto dos homens, e, para usar um título de Saramago, tem todos os nomes, e todos, diz o Evangelho, estão inscritos nos Céus (Luc 10, 20).

A fragmentação é uma opção, fruto da preferência pela divisão. Ao contrário a diversidade dá-se numa unidade, não sendo esta fruto de um esforço mas é um mais que acontece. Estas viagens na minha terra que são a JMJ levam-me, ou não, ao reconhecimento de que a Paz é um dom a acolher.

Peregrino da esperança em Portugal, assim se apresentou Francisco em Belém. A lembrar a outra Belém, onde um Menino nos foi dado. Estes dias é esta a questão. O que faço com este menino? Foram muitas as mães que ergueram os seus meninos ao Papa, para que os beijasse e abençoasse. Muitas nem sabem o que é a Ecologia de Francisco, mas sabem o que falta aos seus filhos.

Há quem prefira discutir os gastos e o que ainda não foi feito, pois albarde-se! As vozes dos velhos do Restelo azedam à pala de quê? Pessoa escreveu no leito de morte: quem sabe o que virá amanhã? Pode parecer pouco, mas é, erguido da terra do meu coração, um grito de esperança, um nada que é tudo!