Em 1979, os Pink Floyd trouxeram The Wall ao mundo, um dos seus álbuns mais famosos e extraordinários em toda a linha. Another Brick in the Wall foi, sem dúvida, um dos grandes hits da banda do vocalista Roger Waters, mas esta música chamou à atenção, essencialmente, pela crítica que fazia ao rígido sistema educacional da época, com o célebre “We Don’t Need No Education”. Entoado em coro por crianças da Islington Green School, este grito de revolta típico de qualquer aluno parecia ser intemporal. Recordo-me de, em pequeno, vibrar a cantar este verso, numa tentativa de mostrar ao meu pai, fervoroso fã dos Pink Floyd, que a escola não era mais que uma obrigação sem qualquer tipo de sentido lógico. Afinal de contas, porque não poderíamos nós ficar em casa, no conforto do nosso lar?

Esta pergunta irracional de criança parecia inquestionável, daquelas que todos poríamos as mãos no fogo de como, de geração em geração, iria continuar a ser colocada. Contudo, passámos a ouvir falar em Wuhan, uma cidade no centro da China, e cá estamos nós um ano e meio depois. As crianças, os adolescentes e os jovens, esse portentoso núcleo da sociedade habituado a exercer um lobby contra a educação, deu uma volta de praticamente 180°. Os papéis inverteram-se e a pandemia trouxe-nos um fenómeno que acredito nunca ter sido equacionado. Por todo o mundo, passou a ser notória a vontade de voltar à escola. Pela convivência, pela necessidade de uma rotina, mas também, surpreendentemente, pela ânsia de aprender e de saber mais.

Contudo, acabámos por encarar com naturalidade a realidade do “ensino” à distância, sabendo que se estaria a entrar num terreno desconhecido e sobre o qual não se teria informações sobre as possíveis consequências. Era quase um milagre, pensava eu, a tecnologia permitir que milhões de jovens por todo o globo pudessem continuar a frequentar as suas aulas, dentro da sua própria casa, com a consciência daquilo que se passava fora das quatro paredes da minha nova realidade. A verdade, essa dura inimiga das soluções simplistas, é que nos encontramos no segundo ano letivo assolado pela Covid-19 e apercebi-me do problema que aqui se coloca.

A educação, num Estado de Direito democrático, tem de ser o pilar do ideal do Estado Social, que triunfou no pós Segunda Guerra. Da esquerda à direita, cada um nos seus próprios moldes, é inegável que o ensino é o mais profícuo elevador social da nossa sociedade moderna. Tal como dizia Steve Jobs: “Oportunidades iguais significam, acima de tudo, uma ótima educação.” Com o ensino online, intensificou-se e ficou mais claro que os pontos de partida são estrondosamente distantes. O Governo, em promessas de equipamentos eletrónicos sem fim à vista e discriminações consoante o tipo de ensino, não tem sido um fiel aliado dos estudantes portugueses. O resultado deste retrocesso na aprendizagem poderá não ser imediato, nem muito menos palpável, tal como são (infelizmente) as mortes causadas por esta tragédia. Porém, é inegavelmente uma pandemia silenciosa contra a qual muito teremos de lutar para a ultrapassar.

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A minha geração não pode permitir que tudo fique na mesma. Se é fulcral o reforço do investimento na Saúde, não podemos descurá-lo na Educação. É inconcebível que, segundo os dados da Pordata, as despesas do Estado em educação estejam na ordem dos 3,5% do PIB, em 2019, acrescentando ainda que, o Executivo liderado por António Costa desde 2015, apresente valores de investimento na educação sempre abaixo dos 4%, sendo da mais elementar importância referir que, desde 2000, Portugal realizou despesas educativas sempre superiores a esse valor, com a exceção do ano de 2012, onde o valor rondou os 3,9% do PIB, números esses que acabam por conseguir superar o maior investimento em educação realizado pelo anterior Governo Constitucional (2015-2019).

Assim sendo, é crucial que se entenda a necessidade de reformar o funcionamento do ensino público. Os Censos de 2011 mostravam-nos que Portugal tinha uma taxa de abandono escolar na ordem dos 8,9%. A situação que vivemos nestes últimos dois anos, pode causar um agravamento nestes números, fundamentalmente nos alunos que beneficiavam de medidas de inclusão educativas, inseridos em famílias sem condições para providenciar uma educação à distância para os seus filhos. Em casos destes, temo que se recorra às perigosas soluções mais acessíveis, retirando os estudantes da escola e criando um fosso ainda maior entre as classes sociais. Portugal tem a missão de não permitir que um jovem de uma aldeia no interior do país deixe de sonhar com a possibilidade de se vir a tornar um dia naquilo que quiser ser.

Não podemos deixar (ainda mais) alunos para trás. As discrepâncias são gritantes e é preciso querer ir mais longe, para recuperar aquilo que foi perdido. Einstein ensinou-nos que “loucura é querer resultado diferente, fazendo tudo exatamente igual”. Cabe-nos a nós, nestas horas difíceis, descobrir o caminho para uma educação mais justa, inclusiva e que olhe para cada aluno como um ser humano, influenciado pela sua própria circunstância, e não um mero número que se perde num arquivo do Ministério da Educação. A ironia é evidente, mas mais do que nunca, We Need Education.