O Tribunal da Relação de Lisboa negou provimento ao segundo recurso do Ministério Público e confirmou a absolvição do farmacêutico e da técnica de farmácia, ilibados no caso da cegueira de seis doentes do Hospital de Santa Maria.

A 14 de novembro do ano passado o Tribunal Central de Lisboa manteve a absolvição dos dois arguidos, na sequência de um primeiro recurso interposto pelo Ministério Público (MP) para o TRL, que determinou a devolução do acórdão ao tribunal de primeira instância para melhor fundamentação, o qual acabou por manter a decisão de absolver os arguidos.

O MP voltou a recorrer da absolvição de Hugo Dourado e de Sandra Baptista, acusados de seis crimes de ofensas corporais por negligência, por alegadamente administrarem, em 2009, um medicamento aos pacientes que ficaram parcial ou totalmente cegos, depois de receberem injeções intraoculares, supostamente com um medicamento adulterado (Avastin).

“Tendo em conta a complexidade da matéria de facto provada, não se antolha qualquer omissão por parte dos arguidos, com o grau de certeza, reveladora de violação do dever objetivo de cuidado que as concretas circunstâncias impunham”, sustenta o acórdão do TRL, datado de 22 de maio, a que a agência Lusa teve hoje acesso.

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A Relação de Lisboa justifica a absolvição dos dois arguidos e a confirmação do acórdão da primeira instância, “desde logo porque não resultam assentes os factos que permitiriam também a atribuição de um nexo causal entre a atuação daqueles e as causas das ofensas provocadas com a utilização do produto injetado nos olhos dos ofendidos”.

Em síntese, o TRL concluiu “pela impossibilidade de determinação de nexo causal entre as ofensas provocadas à saúde dos ofendidos e uma atuação qualificável como negligente por parte dos arguidos”.

Contactado pela Lusa, o advogado do farmacêutico Hugo Dourado disse esperar esta decisão, acrescentando que o seu cliente “sempre desempenhou as suas funções de modo diligente”.

Nos dois acórdãos — proferidos em junho de 2013 e em novembro de 2014 -, o tribunal de primeira instância considerou não ter havido negligência dos arguidos e admitiu a possibilidade de diversas “causas de contágio do fármaco”, sublinhando que “existem muitas variáveis no processo e opiniões diferentes de médicos e técnicos”.

O Tribunal Central de Lisboa frisou que os arguidos não violaram quaisquer procedimentos, porque, à data dos factos – preparação do fármaco a 16 de julho de 2009 e administrada no dia seguinte -, “não havia qualquer manual de procedimentos”, tendo este sido concluído já após o sucedido.

O coletivo de juízes apontou “fragilidades” no funcionamento daquele serviço e da farmácia hospitalar, observando que é “grave” não existirem normas que definam como devem ser ministrados os fármacos daquela unidade.

Perante a “impossibilidade de saber se houve ou não troca de fármacos”, tendo em conta alguns afeitos que o Avastin pode causar nos doentes oftalmológicos e conjugada toda a prova testemunhal e documental, o coletivo de juízes absolveu os arguidos.