A incerteza quanto à situação política na Catalunha em caso de independência e o receio quanto aos possíveis impactos económicos levam alguns dos empresários portugueses a equacionar mudar-se para Madrid ou mesmo regressar a Portugal.
“No nosso caso somos uma empresa de importação e distribuição de vinhos e produtos gourmet portugueses em Espanha, trabalhamos a nível nacional, mas temos loja própria e restaurante em Barcelona. Obviamente preocupa [um processo de independência] e estamos a fazer um plano de emergência, porque caso isso aconteça vamos ter de transferir a central de distribuição da empresa para Madrid. Isso está claríssimo”, contou à agência Lusa Ricardo Paulo, sócio proprietário da empresa O Lusitano S.L.
Ricardo Paulo mantém a esperança que o processo de independência “não vá para a frente” – por falta de maioria absoluta dos independentistas nas eleições de domingo – mas receia sobretudo, se tal acontecer, “um boicote em toda a Espanha aos produtos vindos da Catalunha”, como já aconteceu no passado.
O empresário português diz que a sua nacionalidade o “afastou de problemas com clientes de Madrid” por estar implantado na Catalunha (desde o início de 2009), mas reafirma que se houver independência na Catalunha “já tem plano B” e “não tem dúvidas de que o armazém e a central de distribuição da empresa vão passar para Madrid”.
“Se estamos a falar de outro país, políticas económicas diferentes, eventualmente outra moeda, preços dos transportes diferentes, nem vamos correr esse risco. Para começar a Catalunha é a comunidade de Espanha mais cara, onde tudo é mais caro. E como somos uma empresa muito pequena, temos de dar passos bem calculados”, conclui.
Há mais tempo na Catalunha está José Rocha dos Santos. Em Espanha desde 1976 e em Barcelona desde 1981, o empresário trabalhou no setor agro-alimentar e lançou em 2002 uma empresa de construção industrial (pavimentos). Atualmente executa trabalhos como consultor.
“Obviamente estou contra a independência. Posso estar aqui há muito tempo, mas não sou catalão. Como estrangeiro, ninguém se referiu ao que nos aconteceria. Qual seria a nossa posição?”, critica o empresário, que chegou a integrar o Conselho para a Internacionalização da Economia Portuguesa.
“Sim, equaciono mudar residência para Madrid ou mesmo regressar a Portugal. Esta decisão [dos catalães] afeta o ambiente de negócios e eu tenho negócios com outras zonas de Espanha”, assegura José Rocha dos Santos, admitindo que – no que toca à Catalunha – “ser português, e não espanhol, tem favorecido a relação com os locais”.
Tal como Ricardo Paulo, José Rocha dos Santos não acredita que a independência da Catalunha venha a concretizar-se. “Tudo isto tem início por razões económicas”, pelo que será nesse campo que as coisas se vão resolver, assume.
Nuno Dias é português, mas é diretor-geral da Carlos Silva S.A. em Barcelona, uma empresa espanhola que trabalha na área dos elevadores e ascensores. Nortenho e expansivo, Nuno Dias é claro quanto aos possíveis impactos: os custos de uma eventual independência da Catalunha – e eventual saída do euro e do espaço Shengen – levariam os clientes da empresa a comprar noutro lado.
“Tão simples quanto isso. Nós temos aqui a fábrica, mas recebemos peças e materiais de muitos lugares de Espanha. Operar a partir da Catalunha para o resto de Espanha elevaria tanto os custos, que provavelmente muitos clientes nem sequer olhariam para nós e iam para a concorrência”, salienta à Lusa.
Por isso mesmo, sublinha, a Carlos Silva S.A também está a planear a melhor forma de “reequacionar a sua estratégia” de implantação geográfica em caso de uma independência da Catalunha.
Mas Nuno Dias tem uma explicação mais dura para este movimento dos políticos catalães: “É uma fuga em frente para ‘tapar’ os vários casos de corrupção que têm surgido associados à governação da Catalunha”.
No domingo, 5,5 milhões de catalães vão às urnas para escolher os deputados ao parlamento regional da Catalunha, que posteriormente votarão para eleger um novo presidente e governo regionais (Generalitat). No entanto, duas formações – a plataforma Junts pel Sí e a CUP – consideram que quem votar nestes dois partidos está a dizer “sim” à independência, processo que pretendem iniciar no prazo de 18 meses caso obtenham a maioria absoluta.
Os restantes partidos – Ciudadanos, Podemos (na sua versão catalã “Sí que es pot”), o PP da Catalunha, o Partido Socialista da Catalunha e a Unió Democratica de Catalunya estão contra esta via.