Antes de começar a ler este texto, uma nota: faz parte do grupo de pessoas que se levanta da cama mal o despertador toca? Ou já fez do botão “snooze” uma espécie de melhor amigo? Se pertence à segunda categoria, atente nisto: está exatamente na mesma posição em que Peu Fraga, 25 anos, estava antes de saber que a Cuckuu lhe ia mudar a vida. Melhor, que ia tornar-se no motor da sua vida. (Também acha que acordar é difícil?)
João Jesus, 36 anos, era professor de Fotografia na Etic – Escola de Tecnologias Inovação e Criação e foi lá que conheceu Peu (que na verdade se chama Luís, mas que prefere ser tratado por Peu). Ficaram amigos. Peu andava à procura de uma casa para morar – era natural da Figueira da Foz – e a família de João tinha acabado de se mudar para Inglaterra. Voilá! João arrendou um dos quartos vagos ao amigo. Resolveu-se um problema, nasceu outro: fazer Peu Fraga cumprir horários.
A ideia do Cuckuu nasceu em conversa com mais dois amigos. “Tinhamos de encontrar uma forma de fazer com que o Peu acordasse. E que ficasse bem-disposto. Depois reparámos que quando acordava com músicas ou telefonemas de amigos, isso acontecia”, conta João ao Observador.
A pergunta que se seguiu já tem resposta: E se desenvolvessem uma rede social à base de alarmes onde fosse possível partilhar fotografias, vídeos ou iniciar conversas em chat para acordar outras pessoas? Depressa perceberam que se conseguissem desenvolver algo assim, podiam utilizá-la para “muito mais do que acordar”: para motivar as pessoas a irem ao ginásio, para ajudar marcas a lançar produtos, para aumentar a partilha entre família e amigos.
Um exemplo: uma festa marcada para o próximo sábado às 21h. O anfitrião lança o alarme, adiciona as pessoas que quer convidar e na hora em que o alarme disparar, o telemóvel das pessoas toca com o conteúdo escolhido, como um vídeo ou uma música. Se for uma marca e programar o lançamento de um produto, tem ainda mais uma opção: escolher que o alarme toque à mesma hora em vários países, respeitando o fuso horário. Ou seja, toca às 11h da manhã em Lisboa, às 11h em Madrid ou às 11h em Nova Iorque.
“As minhas filhas estão a morar em Inglaterra e eu sei que elas acordam todos os dias às 7h30. Então, agendo sempre um alarme para essa hora, convido-as a aderir e quando o alarme toca para irem para a escola aparece o meu vídeo a dizer que tenho muitas saudades ou algo do género”, conta João.
O Cuckuu – que já tem mascote a fazer jus ao nome – está disponível para sistema operativo iOS, Android e em breve, vai ser lançado para Apple Watch. O primeiro financiamento chegou em agosto de 2014 e veio de um investidor inglês, que, por acaso estava a passar férias no Algarve.
Bateram-lhe à porta em agosto de 2014, mostraram o projeto – desenvolvido apenas em termos de design, porque nenhum dos fundadores é programador – e arrecadaram 230 mil libras (cerca de 312 mil euros) de dois investidores britânicos. Foi com este investimento que passaram a dedicar-se a tempo inteiro ao Cuckuu.
Com dinheiro para avançar, procuraram quem quisesse e pudesse programar a aplicação. Bateram a várias portas em Portugal, mas nenhuma empresa quis pegar no projeto. Uma pesquisa pela internet levou-os até uma empresa norte-americana com desenvolvimento tecnológico na Índia. Fizeram as malas e durante três meses estiveram na Índia a desenvolver a app. Entretanto, dois dos amigos que ajudaram a fundar a startup saíram por motivos pessoais.
“Tentámos encontrar uma empresa portuguesa que pudesse desenvolver o projeto, mas não mostravam muita confiança em conseguir o resultado que nós andávamos à procura. Sou português e gostava de fazer isto em Portugal, mas não estava a conseguir”, conta.
Seis meses depois do primeiro investimento, o segundo: mais 237 mil euros, dos mesmos investidores. E há cerca de três meses, o terceiro, de um investidor português – cerca de 543 mil euros. A versão beta da app foi lançada em abril e já conta com nove mil utilizadores. Mas o ojetivo é chegar aos 100 mil utilizadores no final do ano. Como? Através de parcerias com bloggers e youtubers, que estão a contactar através de uma empresa no Reino Unido.
Mais: para breve vão começar com um teste piloto numa escola do Reino Unido que vai envolver 1.000 alunos e que vai servir para chamar a atenção dos alunos para atividades promovidas pela escola, como concursos de artes ou jogos de futebol. “Isto agora funciona com papelinhos na parede, mas já ninguém os lê”, explica, acrescentando que estão a fechar mais um teste piloto com outra escola inglesa, que vai envolver 1.200 crianças.
“Pegámos num sistema de alarmes que toda a gente conhece e demos-lhe uma parte mais social e divertida”, explica João Jesus.
A ideia fez com que a Forbes a destacasse como uma das startups portuguesas a manter debaixo de olho, o júri do evento para startups tecnológicas Pioneers Festival, em Viena, selecionou-os para os oito finalistas da edição de 2015, quando tinham concorrido mais de 6 mil startups da Europa. E a Web Summit escolheu-os para integrar a categoria Alpha da edição deste ano – aquela onde estão as startups que a organização considera “promissoras”. Além da Cuckuu, há mais 11 portuguesas confirmadas.
Agora, a equipa cresceu (são cinco pessoas), moram toda na mesma casa – imposição de João Jesus – e montaram o escritório na garagem – ao bom estilo de Silicon Valley. E agora – espera-se – já ninguém tem desculpa para não acordar.
*Tive uma ideia! é uma rubrica do Observador destinada a novos negócios com ADN português.