Foi o momento alto da visita do Presidente da República ao Reino Unido esta semana. Marcelo Rebelo de Sousa esteve no Palácio de Buckingham com a rainha Isabel II e contou-lhe — para toda a gente ouvir — algumas memórias sobre as duas visitas da monarca britânica a Portugal. Primeiro, em 1957, quando Marcelo tinha oito anos e a rainha 30, e, depois, em 1985, quando Marcelo foi convidado a jantar no iate Britannia na qualidade de “líder da oposição”, disse o próprio Marcelo a Isabel II. Uma gaffe.
Quando chegou a Lisboa, ao Terreiro do Paço, aquela grande praça, numa carruagem, com o general Craveiro Lopes, eu estava lá, era uma criança. Estava na primeira fila para vê-la“, recordou Marcelo Rebelo de Sousa. Na segunda visita da monarca a Portugal, em 1985, continuou Marcelo, também este na presença de sua majestade: “Fui convidado para jantar no [iate] Britannia porque era líder da oposição na altura”.
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Foi um momento caricato de uma descontração pouco habitual nos encontros super formais com a rainha de Inglaterra, mas que contém uma um erro. Porque nem Marcelo Rebelo de Sousa liderava a oposição — embora tivesse liderado a oposição interna no PSD — nem o próprio partido estava na oposição, porque partilhava o poder com o PS no Governo do Bloco Central liderado por Mário Soares.
Em março de 1985, data da visita de Isabel II, Marcelo Rebelo de Sousa era o segundo vice-presidente do PSD há cerca de um mês, na sequência da súbita demissão de Carlos Mota Pinto da liderança do partido. Nessa época, liderava a Nova Esperança, com Pedro Santana Lopes, Miguel Júdice, Rui Gomes da Silva e Durão Barroso, que se opunham com violência verbal à coligação do PSD com o PS.
É verdade que esteve com a rainha na circunstância que invocou no encontro desta quinta-feira em Londres, e que se pode comprovar através deste recorte de um artigo do Diário de Lisboa, publicado no dia 27 de março de 1985, onde se percebe quem esteve presente no “banquete” a bordo do Britannia: o casal presidencial Ramalho Eanes, o presidente da Assembleia da República, o primeiro-ministro Mário Soares, o presidente da câmara de Lisboa, o cardeal-patriarca, assim como o ex-primeiro-ministro Francisco Pinto Balsemão, e o “vice-presidente do PSD Marcelo Rebelo de Sousa”, entre outros.
A visita da rainha ocorreu semanas depois de um Conselho Nacional do PSD bastante tenso, que acabou por ter como consequência a saída de Mota Pinto da liderança do partido. Na sequência da saída do líder — que havia de falecer antes do congresso maio, na Figueira da Foz, que elegeria Cavaco Silva –, quem ficou aos comandos do partido foi Rui Machete. Como forma de promover uma transição pacífica, puxou para a direção os representantes das fações críticas internas: João Salgueiro foi o primeiro vice-presidente, por liderar a chamada fação balsemista e Marcelo Rebelo de Sousa era o segundo, pela Nova Esperança.
Marcelo só chegaria a líder da oposição em 1996, depois de uma década com Cavaco Silva na liderança do PSD e do país. Em 1995, o socialista António Guterres era eleito primeiro-ministro. Mas, nessa altura, quem estava à frente do PSD, transformado em maior partido da oposição, ainda era Fernando Nogueira, que assegurou a transição pós-Cavaco. Só no congresso de março de 1996, em Santa Maria da Feira, é que Rebelo de Sousa chegou a líder da oposição e do PSD. E a rainha não voltou a Portugal.