A edição de março da revista Monocle dedica um caderno especial de 64 páginas a Portugal, onde inclui entrevistas ao Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, e ao primeiro-ministro, António Costa. Num registo de pergunta e resposta, aquela revista sediada em Londres fala com os dois líderes mais destacados do país, que descrevem Portugal como um país virado para o empreendedorismo e que, de saída de uma crise financeira, conseguiu passar ao lado da onda populista que chega a outros países do mundo.
A entrevista a Marcelo Rebelo de Sousa leva o título “Party Nation” — um trocadilho, que em inglês significa tanto “Nação de Festas” como “Nação de Partidos”. E é precisamente sobre partidos que o Presidente da República começa por falar, dizendo que não há populismo em Portugal porque as principais forças políticas do país são “fortes”. De seguida, descreve algumas delas. Sobre o PCP, diz que este “se renovou e atraiu uma geração mais nova mesmo que seja antigo e ortodoxo”; sobre o Bloco de Esquerda diz que é composto “principalmente por pessoas jovens com ideias radicais mas que ocupa o espaço que o populismo da esquerda radical poderia preencher”. Por fim, fala da direita, onde diz existirem “dois partidos de mente aberta” e referindo que “é difícil haver um partido de direita radical em Portugal porque onde quer que os partidos vejam um espaço para um movimento radical eles vão ocupá-lo”. Sobre o Partido Socialista, não disse nada.
Marcelo, um homem que sabe “agradar às multidões”
Marcelo Rebelo de Sousa é descrito por esta revista como um homem que sabe “agradar às multidões” a quem os taxistas — e não só, acrescentamos nós — chamam “respeitosamente” de “professor”. Antes de chegar à entrevista — à qual terá aparecido com atraso — no Palácio de Belém, Marcelo Rebelo de Sousa fez uma refeição na “casa de um homem que em tempos foi sem-abrigo mas que conseguiu dar uma volta à sua vida”.
Sobre a proximidade e a informalidade que lhe são reconhecidas, no que diz respeito ao trato com os cidadãos, Marcelo Rebelo de Sousa diz que é por isso “criticado por algumas pessoas”, que argumentam que desta forma “não terá a autoridade para tomar decisões difíceis”. “Mas quem for razoável e conhecer as regras e souber analisar a política durante 50 anos, sabe o que fazer quando isso for necessário”, contrapõe. “Ter poder formal já não chega, é preciso ter o apoio do povo.”
Sobre a economia portuguesa, diz que “pouco a pouco estamos a ver o início de um crescimento” e destaca a criação de micro-empresas por parte de jovens, mesmo que algumas falhem. “Aos 28 anos, estas pessoas já tiveram quatro ou cinco experiências de negócios”, diz. “Certamente que isto não era assim quando eu era mais novo.”
António Costa: “Não queremos que as nossas cidades se tornem numa espécie de Disneyland”
O tom otimista de Marcelo Rebelo de Sousa é replicado pelo primeiro-ministro, onde o tema de abertura é sobre a solução governativa acordada entre António Costa e os partidos à esquerda do PS. A Monocle chega mesmo a dizer que “António Costa não devia ser primeiro-ministro”, para depois explicar aos seus leitores o acordo com o BE, PCP e Os Verdes.
“Desta vez, podíamos voltar a ter todos contra todos ou podíamos encontrar uma solução”, diz, sobre o acordo à esquerda. “Há grandes diferenças entre o Partido Socialista e os seus parceiros no parlamento, mas fomos capazes de ter uma visão madura da política onde percebemos que, apesar das nossas diferenças, podemos trabalhar juntos para devolver [rendimentos] às famílias e dar às empresas os meios para criarem empregos, tal como repor serviços públicos, como a educação e a saúde.”
À Monocle, repetiu uma das ideias mais recorrentes no seu discurso: “Provámos que é possível ficar na Europa e virar a página da austeridade”.
Sobre a relação de Portugal com o estrangeiro, falou dos EUA de Donald Trump (“vamos manter uma relação correta e amigável com os EUA”), mas também da atratividade que o país poderá ter para turistas e investidores de todo o mundo. Para António Costa, é preciso encontrar um equilíbrio. “Precisamos de continuar a atrair investimento estrangeiro, tanto fora da União Europeia, através do programa de vistos dourados, ou de dentro dela, ao mesmo tempo que construimos casas acessíveis para os jovens e desenvolvemos políticas para a classe média”, explicou.
“Nós não queremos que as nossas cidades se tornem numa espécie de Disneyland onde os estrangeiros vêm só aos fins-de-semana”, disse, argumentando que Lisboa tem valor perante os turistas por ser uma “cidade genuína” e que isso será perdido se “perdermos a nossa população”.
Nas restantes páginas deste caderno especial sobre Portugal, a Monocle dá destaque a estilistas no Porto, ao MAAT, à produção vinícola alentejana, à imprensa escrita e à gastronomia nacional.