Os vencedores

Assunção Cristas

Cristas já tinha sido eleita presidente do CDS há dois anos, mas, como disse Nuno Melo, agora foi eleita líder. Num congresso eletivo podia sempre aparecer um adversário, o que não aconteceu. Ninguém se atreveu e isso é sempre uma vitória para um líder. Em 2016, Cristas estava à sombra de Portas (e da sua proteção). Agora, ganhou vida própria. Com o resultado de Lisboa no bolso, todos a reconhecem agora no partido como uma líder com provas dadas. E no sítio onde mais contam para os políticos: nas urnas. Até Lobo d’Ávila, grande crítico, reconheceu que Cristas ganhou gravitas e decidiu abandonar o Parlamento. Quanto à sombra de Nuno Melo, o assunto ficou logo resolvido assim que o convidou para cabeça de lista às Europeias. Conseguiu um congresso tranquilo. É certo que baixou a votação nas listas para os órgãos nacionais, mas isso não a belisca.

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Nuno Melo

O Congresso até poderia ter sido amargo: a líder, Cristas, parece mais forte que nunca e — se as coisas lhe continuarem a correr bem — pode ficar alguns anos na liderança. Para o pós-Cristas já se fala de Adolfo Mesquita Nunes (e até de Francisco Rodrigues dos Santos, que só tem 29 anos), como se saltassem algumas gerações, onde está Melo, mas também Mota Soares e João Almeida. Além disso, Filipe Lobo d’Ávila (que assumiu publicamente a preferência de Melo para líder) sai do palco parlamentar. Ainda assim o eurodeputado sai do Congresso com uma vitória no bolso: foi o escolhido para cabeça-de-lista às Europeias. Atualmente, apenas com um eurodeputado em Bruxelas, o CDS tem tudo para melhorar o resultado de 2014. Melo — que tem bastante à vontade no terreno e a lidar com eleitores — vai ser o rosto de uma campanha e ficará com boa parte dos louros de um possível bom resultado do CDS. Além de que fica com um lugar praticamente garantido em Bruxelas até 2024. Se quiser acabar o mandato.

Adolfo Mesquita Nunes

O vice-presidente do CDS já era visto como um rosto de futuro no Congresso de 2016. E já era um nome a ter conta por dois motivos: era dos governantes mais elogiados no CDS (pelo papel como secretário de Estado do Turismo); e por ser uma voz dissonante da maioria em matérias de costumes (votou a favor do casamento homossexual no Parlamento). Dois anos depois, está no “top 4” no aplaudómetro de Lamego. Os “fab four” na popularidade foram claramente Cristas, Melo, “Chicão” e Adolfo, que ouviu dos aplausos mais estrondosos da sala. Semanas antes do Congresso, o antigo governante assumiu frontalmente a sua homossexualidade. O partido é conservador, mas mostrou não ser intolerante e abraçou Mesquita Nunes. O vice-presidente é visto como o rosto de uma ala mais liberal do CDS e até como potencial candidato a líder no pós-Cristas.

Francisco Rodrigues dos Santos

O líder da Juventude Popular até teve um dissabor: o Observador descobriu que a organização incutiu uma disciplina aos “jotinhas”, a que impôs (ou alguém por ele) um dress code, além de os proibir de falar à imprensa sem autorização superior. Mas isso conta pouco na lógica partidária. O grande objetivo de Francisco Rodrigues dos Santos era criar uma “quota” da jota nas listas para a Assembleia da República com pelo menos um lugar elegível: o seu. Criou pressão e venceu pelo cansaço o Congresso com dezenas “jotinhas” a irem ao púlpito (o que arrastou a noite de sábado para lá das 04h00). E fê-lo com êxito. O “Chicão” ou “senhor Forbes” como tem sido chamado conseguiu que a líder, em entrevista ao Observador, sugerisse que Francisco terá um seu lugar potencialmente elegível nas próximas listas de deputados. Entrou “Chicão”, saiu “futuro deputado Francisco Rodrigues dos Santos.”

Os vencidos

Filipe Lobo d’Ávila

O antigo porta-voz e deputado tinha defendido, há dois anos, que Nuno Melo seria melhor líder que Assunção Cristas. Desde essa altura que se afirmou como um crítico da direção. Mas tudo o que podia correr bem a Cristas, correu. Lobo d’Ávila não teve outra alternativa senão a de dar o braço a torcer. É certo que voltou a encabeçar uma lista alternativa ao Conselho Nacional (que até teve um relativo sucesso: perdeu três lugares, mas manteve 13 conselheiros). Também é certo que anunciou que sairia do Parlamento. Desta forma, o crítico reconhece que se enganou na leitura e percebe que perdeu algum espaço no partido. Ou então fora do Parlamento terá mais espaço para um caminho próprio. Mostrou, porém, que sabe perder. Retirou-se com elevação e foi aplaudido. Continuará no Conselho Nacional e com as suas espingardas contadas para o dia em que quiser voltar ao ringue.

Pedro Borges Lemos

Quem? É a pergunta que muitos portugueses farão se lhes perguntarem quem é Pedro Borges Lemos. Era assim antes do Congresso e continuou a ser assim depois do Congresso. Apareceu antes da reunião magna dos centristas como um grande crítico, com uma máquina de comunicação bem montada e a querer dar entrevistas contra a presidente. No Congresso, porém, a montanha pariu um rato. Pedro Borges Lemos, que nem sequer era delegado, foi titubeante e trapalhão a apresentar a moção de estratégia global. Quis falar para Cristas e pôs-se de lado para os microfones. Resultado: os congressistas não ouviram parte do que estava a dizer e foi alvo de chacota. Podia ter tido a coragem de levar a moção a votos. O que não fez por “estratégia”. Saiu de Lamego com a relevância que tinha no partido: quase nenhuma.

Os espectadores

Paulo Portas

Portas teve uma única aparição no Congresso do CDS e, em vídeo, para homenagear Adriano Moreira. Apesar de fazer parte do recém-ativado Senado, não foi ao palco como aconteceu com os restantes membros desse órgão. Portas é um grande vencedor do Congresso porque a sucessora que escolheu está a ter sucesso na liderança, mas também parece, na mesma medida, ser cada vez menos endeusado. Houve referências a ex-líderes do partido, como Adelino Amaro da Costa ou Adriano Moreira, mas as menções a Paulo Portas foram contidas. É o primeiro congresso em mais de uma década a que Portas falta. E nos últimos vinte só faltou a dois: este e aquele em que Ribeiro e Castro foi eleito líder.

Rui Rio

Para o líder do PSD, este Congresso não trouxe nenhuma novidade. Rui Rio confirmou aquilo que já sabia: que Cristas quer passar-lhe a perna no país como fez em Lisboa. No pós-geringonça desapareceu o voto útil: ou seja as pessoas podem votar no CDS sem colocarem em causa uma coligação governamental PSD-CDS. Ainda assim, o novo presidente do PSD confirma uma informação útil: o CDS só aceita o PSD como parceiro de Governo (e nas autarquias). Foi um espectador in loco do encerramento do congresso e pôde ver com os seus olhos como Cristas domina a estética da política. Rio não quer dar manchetes aos jornais, mas vai ter de fazer-se à estrada para não perder eleitores para Assunção Cristas.

António Costa

O primeiro-ministro ficou com as orelhas quentes durante o fim-de-semana. Cristas quis colocar-lhe o rótulo de “esquerdas encostadas”, mas houve congressistas que deram nomes menos simpáticos à “geringonça”. Um deles foi: “Vigaristas”. O líder do PS sabe que não pode contar com o CDS para nada a não ser para lhe fazer oposição. Dois dos seus peões (ou, vá, generais) Ana Catarina Mendes e Pedro Nuno Santos assistiram ao discurso final da líder do CDS e não tiveram problemas em ser corrosivos com Cristas nas reações ao discurso. A secretária-geral adjunta do PS até culpou Cristas pessoalmente pela “inação” na reforma da floresta. Sem dizer a palavra Pedrógão, ficou a sugestão. Não será inocente já que Nádia Piazza — que lidera a Associação de Apoio às Vítimas de Pedrógão Grande — foi escolhida para um grupo que irá elaborar o programa eleitoral de Cristas. Será difícil acreditar que esta estratégia de colar Cristas aos problemas da floresta não passou por Costa.