Na véspera do 40º aniversário da independência de Angola, que se comemora hoje, 11 de Novembro, os seus dirigentes decidiram surpreender o mundo com a notícia de que, e passo a citar a agência Lusa, “os ativistas detidos desde junho em Luanda, acusados de conspiração, queriam provocar uma intervenção da NATO em Angola que conduzisse ao derrube do Presidente José Eduardo dos Santos”.

Há algumas semanas atrás, no artigo de opinião publicado por mim no Observador “Regime que nasce torto não endireita”, adiantei a possibilidade de a justiça angolana querer competir com a justiça estalinista: “Faz-me lembrar uma das acusações que os juízes-carrascos soviéticos faziam aos ‘trotskistas’ de que estes se preparavam para abrir um túnel entre Moscovo e Londres a fim de abrir caminho à contra-revolução”, mas nunca imaginaria que os dirigentes angolanos fossem mais longe. 

Luvualu de Carvalho, embaixador itinerante de Angola, acredita que no tribunal “outras questões serão apresentadas”. Ou seja, as revelações irão ser ainda mais bombásticas. Desta vez já não excluo a possibilidade de algum dos acusados vir a reconhecer que o grupo se preparava para abrir um túnel entre Portugal e Angola para que as tropas da NATO entrassem no país despercebidas e lançassem um ataque surpresa contra o Futungo de Belas.

É sabido que grande parte dos dirigentes angolanos se formaram em universidades e institutos de países do chamado “campo socialista” e por isso é natural que muitos deles tenham ouvido histórias semelhantes em disciplinas onde se ensinava e treinava o combate à contra-revolução capitalista e reacionária.

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Por isso, não fiquei surpreendido ao constatar que na origem do “desmascaramento” estiveram declarações de Ângelo Veiga Tavares, ministro do Interior de Angola, feitas na semana passada. Este dirigente angolano tirou três cursos em países socialistas: 1979 – Curso de Perito Criminalístico, na Faculdade Arguelles Camejo na República de Cuba; 1983 – Curso sobre Manuseamento de Aparelhos de Laboratório na República Democrática Alemã; 1985- Curso sobre toxicologia, no Laboratório Central de Criminalística na República de Cuba.

Porém, o embaixador Luvualu de Carvalho, que, segundo o seu currículo oficial, é licenciado, mestre e doutor de Relações Internacionais pela Universidade Lusíada de Luanda, parece nunca ter estagiado em nenhum “país socialista”. No entanto, este diplomata angolano não só aprendeu técnicas de manipular a opinião pública, como parece estar ao corrente da propaganda russa no que respeita à política externa de Vladimir Putin.

Luvualu de Carvalho afirma: “É isto que se procurava. Que a Organização do Tratado do Atlântico Norte (NATO) ou alguns países que dela fazem parte fizessem um ataque a Angola, para que se verifique o horror que se verifica agora na Líbia ou se verificou e verifica na Tunísia”. Quem vê e ouve a canal de televisão Russia Today ou lê a página Sputniknews encontra exactamente o mesmo tipo de discurso. Tudo o que acontece de mau no mundo é obra da NATO, Estados Unidos, CIA, e por aí adiante.

Pelos vistos, os serviços secretos angolanos são treinados pelo Serviço Federal de Segurança ou o Serviço de Espionagem Externa da Rússia, grandes especialistas em encontrar terroristas e terrorismo onde não existem e em não prevenir operações como o derrube do avião russo no Egipto, na semana passada. E José Eduardo dos Santos imita o seu homólogo russo a dirigir o seu país com decisão e sabedoria dos ataques externos e da “quinta coluna” interna.

Angola, que pelas suas potencialidades económicas e pela janela de paz aberta depois de uma longa guerra civil, se poderia tornar num exemplo positivo para África, assemelha-se cada vez mais a regimes como o de Mugabé no Zimbabwe.

José Eduardo dos Santos podia marcar o 40º aniversário da independência do seu país com a libertação dos 15 jovens, mas não o fará a pretexto de não se querer imiscuir na investigação e na justiça angolanas, que, dia e noite, zelam pela “ordem” no país…