Esta terça-feira, os sindicatos de professores (FENPROF e FNE) reúnem com o ministro da Educação e a sua equipa. Sobre a mesa, as reivindicações do costume – um regime especial de aposentação para docentes e mais vinculação de professores aos quadros. Debaixo da mesa, a ameaça de sempre – ou os sindicatos conseguem o que querem, ou convocam greve para dia 21 de Junho. E o que há no dia 21 de Junho? Dois exames nacionais (Física/Química e Geografia) e duas provas de aferição do 2.º ano (Matemática e Estudo do Meio). Ou seja, a intimação insinua dano máximo para os alunos, habituais reféns da agenda sindical na Educação. Após todo um ano lectivo a trabalhar com vista à realização dos exames, sendo muitos os jovens que disso dependem para ingressar no curso superior que ambicionam, os professores afirmam-se disponíveis para atrapalhar tanto quanto possível.

A escolha da data não é coincidência, é modus operandi. Não é a primeira nem a segunda vez que os exames nacionais são usados como arma negocial. Em 2013, com Nuno Crato sentado na cadeira de ministro, quase um mês de pré-avisos de greve e uma greve geral a 17 de Junho boicotaram a normal realização do exame nacional de Português. Em 2014, sob ameaça de greve aos exames, o mesmo ministro admitiu ter adiado o agendamento das provas de avaliação dos professores, para prevenir retaliações e salvaguardar os alunos. E, assinale-se, nada disto é um exclusivo de governos PSD-CDS. Em 2005, nos primeiros meses de governo Sócrates, Maria de Lurdes Rodrigues viu-se perante uma greve aos exames nacionais, que travou decretando serviços mínimos. Recolhessem-se também as ameaças veladas em declarações aqui e ali, encontrar-se-iam exemplos para cada ano lectivo.

Sim, o método é conhecido. Mas o cinismo dos intérpretes surpreende sempre. Mário Nogueira – quem mais? – dá a cara pela greve nas declarações à imprensa e veio antecipadamente limpar as mãos das consequências dos seus actos. A greve calhar num dia de exames nacionais é, alega o sindicalista, uma infeliz coincidência: “legalmente é o primeiro dia em que se poderia fazer greve, sendo o pré-aviso entregue no dia 6”. De resto, ele poderá convocar a greve, mas não será responsável se esta realmente acontecer – “haver greve ou não está agora nas mãos do ministro da Educação”. E se os alunos saírem prejudicados? Bom, obviamente não é nada com ele – “se alguém tem de explicar alguma coisa aos alunos, será ele [o ministro]”. Nada de novo, claro. Em 2013, Nogueira até tinha sugerido que Nuno Crato “fosse colocado em tribunal” pelas famílias. Porquê? Por não alterar as datas dos exames para as quais ele, Mário Nogueira, convocara greve. Não é de agora que esta forma de luta ultrapassou os limites.

Por tudo isto, será escusado sublinhar que, no braço-de-ferro em causa, é impensável ver o ministro da Educação ceder um milímetro que seja. Não é só pelas reivindicações em si. É que ninguém pode aceitar uma negociação sob ameaça, muito menos o Estado, cuja responsabilidade maior é preservar o interesse público, em vez de sujeitá-lo ao interesse de uma parte. Isto não tem cor partidária: é simplesmente o que se exige a um ministro da Educação.

Ora, não se imaginando que o ministro possa ceder, resta uma utilidade neste episódio: realçar um dos grandes obstáculos do debate público na Educação – a ilusão de identificar nos representantes sindicais os grandes defensores da escola pública. Sim, os professores são o elemento-chave da educação num sistema educativo. Mas acreditar que tudo o que interessa aos professores é do interesse do sistema educativo (e de quem ele serve – os alunos) equivale a cair na falácia do discurso sindical. Não, quem usa a fragilidade dos alunos para obter um regime excepcional de aposentação não é defensor da escola pública. Não, quem boicota exames nacionais para exigir as 35 horas semanais de trabalho não é defensor da escola pública. Não, quem rejeitou e lutou contra as grandes reformas dos últimos 15 anos, aquelas que elevaram os desempenhos dos alunos portugueses nas avaliações internacionais, não é defensor da escola pública. Há muita gente – deputados, jornalistas, académicos e até professores – que ainda não percebeu este facto elementar. Já era tempo.

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