O primeiro-ministro grego, Antonis Samaras, arriscou. Antecipou as eleições presidenciais de Fevereiro de 2015 para este mês, apresentando como candidato presidencial o antigo comissário grego, Stavros Dimas. Um candidato da ala mais centrista da Nova Democracia, capaz de garantir os votos dos deputados socialistas, parceiros de coligação. No entanto, os votos de todos os deputados dos dois partidos da coligação são insuficientes para garantir a eleição de Dimas. Serão necessários 200 votos dos parlamentares (2/3) e a coligação só tem 165 deputados. Será quase impossível convencer 35 deputados a votar em Dimas. Após as duas primeiras tentativas – marcadas para 17 e 23 de Dezembro – a maioria exigida baixará para 180 deputados (voto a 29 de Dezembro), mesmo assim difícil de alcançar, dado o radicalismo da política grega. Um Parlamento com uma presença forte dos partidos da extrema-direita e da extrema-esquerda não está aberto a compromissos de regime.
Se conseguir eleger Dimas, Samaras conseguirá uma vitória política importante, ganhando tempo para recuperar a desvantagem nas sondagens em relação ao partido de extrema-esquerda, o Syriza. Se Dimas não for eleito, a Grécia terá eleições antecipadas no final de Janeiro (a 25) ou no início de Fevereiro (a 1). Neste cenário, o Syriza será o grande favorito à vitória. No novo regime político e financeiro do Euro, as eleições gregas serão também um acontecimento político em Portugal. Na zona Euro, deixou de haver eleições unicamente domésticas.
Se o Syriza chegar ao poder no início do ano, as consequências chegarão a Portugal e aos outros países do Euro. O regresso da desconfiança em relação ao Euro por parte dos mercados será o maior risco. Se isso acontecer, os países com finanças públicas mais vulneráveis – como Portugal – voltarão a pagar juros mais altos para se financiarem nos mercados. Antes que as almas mais sensíveis se indignem, convém recordar a realidade. Os governos não recorrem aos mercados por prazer, ou por razões ideológicas, mas sim por necessidade. O recurso aos mercados une a esquerda e a direita. Todos necessitam de se financiar nos mercados porque os recursos nacionais não são suficientes para pagar as despesas. E os “mercados” só emprestam com juros baixos se confiarem que os empréstimos serão pagos.
A defesa da renegociação da dívida – incluindo a sua redução e não apenas o alargamento dos prazos de pagamento – constitui a melhor maneira de aumentar a desconfiança entre aqueles de quem os países necessitam para financiar as suas despesas. E é isso que o Syriza está a fazer. A renegociação da dívida grega é o tema central da sua campanha. A principal preocupação dos mercados não é a Grécia, mas sim a subida ao poder noutros países do Euro de governos que também defendem a renegociação da dívida. Por razões de calendário eleitoral, Portugal e Espanha lideram a lista de preocupações dos mercados – eleições legislativas em ambos os países em 2015. Se António Costa quer facilitar a sua vida no caso de ser eleito PM, deveria dizer o mais rapidamente e o mais claramente possível que não quer renegociar a dívida. O aumento do preço do financiamento nos mercados só tem um resultado: mais austeridade para Portugal.
Um governo que pretenda renegociar a dívida terá ainda de ultrapassar obstáculos europeus consideráveis. As dívidas dos países da zona Euro tornaram-se problemas europeus, e não apenas nacionais. Após os programas da “troika”, os credores gregos são essencialmente os outros países do Euro, o FMI, bancos gregos e fundos de pensões. Com estes credores, só um louco ou alguém completamente irrealista é que pensará na possibilidade de decisões unilaterais em relação a uma reestruturação da dívida. Não haverá reestruturações unilaterais. Apenas negociações, e bem duras. Como é óbvio, os credores estarão numa posição bem mais favorável.
Qualquer renegociação, ao contrário do que o Syriza diz aos gregos, aumentará a austeridade. Alguém julga que os governos dos países credores perdoarão parte da dívida sem contrapartidas duras? Já há vozes alemãs (e holandesas, austríacas e finlandesas) a dizer que uma vitória do Syriza na Grécia será uma oportunidade para acabar com as ilusões sobre renegociações das dívidas noutros países.
Mesmo que uma renegociação da dívida acabe por ser necessária – e já houve várias nos últimos três anos – será uma decisão europeia (dos credores) e não nacional (dos devedores). Não vale a pena qualquer ilusão a este respeito. A saída do Euro é a única decisão que poderá ser tomada unilateralmente. E nesse caso, a austeridade e o empobrecimento serão muito maiores do que hoje.