Passos Coelho tem duas vitórias em eleições legislativas. António Costa não tem nenhuma. É verdade, Passos concorreu a duas e Costa só participou numa. Costa teve menos possibilidades para vencer, mas Passos teve mais hipóteses de perder. No caso de eleições legislativas, o balanço final para Passos é 100% de vitórias. Para Costa é 100% de derrotas. Também é verdade que duas eleições, para Passos, e uma para Costa, é manifestamente um número insuficiente para se fazer uma estatística. Mas vitórias e derrotas em eleições legislativas são factores centrais nas cabeças dos líderes políticos. Quando tomam as decisões solitárias, as mais importantes, o seu passado eleitoral está sempre presente. Nunca desaparece.

Por vezes, é útil afastar-nos dos entusiasmos do quotidiano e olhar para a política num contexto mais alargado. Em todas as actividades, há sempre uma super elite reduzida, onde estão aqueles que conseguiram o feito mais importante de todos. Na política portuguesa, essa super elite é constituída por aqueles que venceram eleições legislativas. Entre os milhares de políticos nacionais, só cinco ganharam eleições legislativas (excluo os que já morreram): Cavaco Silva, duas vitórias; António Guterres, duas vitórias; Durão Barroso, uma vitória; José Sócrates, duas vitórias; e Passos Coelho, duas vitórias. Esta lista de vitórias eleitorais recua a 1985. Milhares e milhares de mulheres e de homens fizeram e fazem política activa, mas em mais de 30 anos, só cinco ganharam eleições legislativas. Falem com qualquer político e percebem rapidamente. A capacidade de ganhar eleições nacionais é o que distingue os políticos. Destes cinco que ganharam, apenas Passos Coelho está activo na política nacional.

Mais, na única vez que se defrontaram, Passos Coelho derrotou António Costa. Uma campanha eleitoral entre dois candidatos a Primeiro Ministro é como um duelo. O resultado fica para sempre na cabeça dos participantes. E nunca mais de lá sai. Cada vez que Passos e Costa se encontram e olham um para o outro, o primeiro pensa, “já te derrotei”; e o segundo pensa, “não consegui derrotar-te” (mesmo que depois pense logo, certamente com gozo, “mas apesar disso sou PM”). Apesar das sondagens e de todas as boas notícias, se há português que não se esquece da derrota nas eleições de 2015, é António Costa. E nunca se irá esquecer. Uma vitória futura atenuará a memória mas nunca a apagará. Sobretudo, tendo em conta o contexto das eleições de 2015. Com o país descontente com a austeridade, Costa calculou bem o tempo para se tornar líder do PS. Chegou como um salvador destinado a uma maioria absoluta. Liderou as sondagens durante muitos meses. Mas no dia das eleições, perdeu. Embora já fosse o político habilidoso, esperto e oportunista que é hoje, e muito elogiado por isso, a verdade é que fez uma má campanha.

Um ano e meio depois, Costa lidera de novo as sondagens, e há cada vez mais observadores que lhe vaticinam uma vitória eleitoral. A maioria dos portuguese já não se lembra, mas ele, garanto-vos, não se esquece. Costa sabe que é a segunda vez que as previsões, esse magnifico passatempo nacional, apontam para uma maioria absoluta. E há uma questão que o preocupa: se já perdeu uma vez quando tudo apontava que iria ganhar, por que não poderá acontecer uma segunda vez? Esta é uma dúvida complicada. Por melhor que seja o presente, as desilusões do passado nunca nos largam. Além disso, as campanhas eleitorais são sempre momentos imprevisíveis. Por vezes, as vantagens atribuídas pelas sondagens desaparecem inesperadamente. Veja-se, por exemplo, o que se passa no Reino Unido. Theresa May começou a campanha com vinte pontos de avanço. A menos de uma semana das eleições, tem três pontos de avanço e a maioria em causa.

Mas se há outra pessoa em Portugal que não esquece que derrotou António Costa e já venceu duas eleições é, obviamente, Passos Coelho. Como todos os portugueses, sabe que a sua vida não está fácil e que se se realizassem eleições nos próximos meses, seria muito provável que perdesse. O PS até poderia chegar à maioria absoluta. Passos saberá isso muito bem. Mas a vitória em duas eleições dá-lhe uma confiança que resiste às piores sondagens e às críticas mais duras. Pacheco Pereira ataca-o todas as semanas (algumas das semanas, mais do que uma vez). Marques Mendes critica-o semana sim, semana não. Ferreira Leite, também. Santana Lopes é mais comedido, mas por vezes também não resiste à pressão mediática e sente-se obrigado a juntar-se ao coro das críticas. Todos eles condenam a estratégia e o discurso de Passos Coelho. Mas por que carga de água Passos deverá prestar atenção ao que dizem antigos líderes do PSD que foram derrotados e que fracassaram? Por definição, o sucesso não ouve o insucesso. Se ouvisse, não seria sucesso. Passos pode estar enganado e pode ser teimoso, mas não é a teimosia que o leva a ignorar o que dizem os antigos derrotados. É uma coisa muito mais simples. Ele ganhou. Os seus críticos perderam.

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