Chamo-me António Pedro Barreiro e tenho 19 anos. No sábado passado, percorri a videografia do PS e lancei nas redes sociais um excerto de um discurso de 2009, em que António Costa rejeitava arranjos governativos sem a candidatura mais votada. Não agi por encomenda, nem por acaso. Agi por convicção e as convicções, necessariamente, explicam-se.

Faço parte de uma geração nascida depois de Abril. Nasci liberto das mordaças do regime deposto e dos humores expropriantes do PREC. Conheci Portugal, velho de nove séculos, dentro de uma Europa livre e inteira. Cresci sobre os destroços do Muro que fez tombar todos os muros. Sou livre e só conheci a liberdade. Sinto-me ocidental e europeu e é nesses cenários que vivo a minha portugalidade.

Claro que a recessão e a austeridade enegreceram este quadro. Como todos os portugueses, senti os cortes em casa e vi-os chegar às casas vizinhas. Porém, mesmo no pico dos sacrifícios, não tive – não tivemos – de temer limitações aos levantamentos bancários, nem desvalorizações abruptas da moeda, nem surtos inflacionários súbitos, nem crises nos abastecimentos. O nosso estatuto de Nação ocidental e europeia, defendido por um consenso transpartidário com quatro décadas, não estava em causa. Para alguns, seria uma mão cheia de nada. Para a Geração Erasmus, era um suplemento de resiliência: sentir que o regime que não vimos nascer também tinha nascido para nós.

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Oakeshott gostava de definir a política como “um diálogo entre presente, passado e futuro.” Quando equaciona, por radicalismo ideológico ou calculismo político, abrir as comportas da governabilidade aos aluviões da esquerda radical, António Costa arrisca fazer titubear a frágil retoma económica do presente e esboroar o arco da governabilidade que os seus antecessores mais responsáveis ajudaram a talhar no passado. Porém, e sobretudo, permite que se rasguem fendas no amplo acordo político que forjou a nossa identidade ocidental e europeia.

O secretário-geral do PS, partido que sempre se reclamou depositário da liberdade e do sonho europeu, aproxima-se agora dos adversários naturais e assumidos desses conceitos. A minha geração, nascida na Europa e em liberdade, desconfia dessas manobras. E isso explica o acto da publicação e os milhares de actos de partilha que o ampliaram. Há um grande simbolismo em esgrimir o melhor das novas tecnologias contra o pior da velha política.

Se António Costa não ouviu os portugueses que votaram esmagadoramente contra a esquerda radical, deverá ouvir-se a si próprio em diferido e perceber o óbvio. Todos os que projectamos na propriedade o reconhecimento meritório do trabalho humano temos o dever de recusar o Governo aos prosélitos das nacionalizações. Todos os que acreditamos na mobilidade social estamos obrigados a opor-nos a quem faz guerra à liberdade de escolha na educação e na segurança social. Todos os que sentimos cair sobre nós as cinzas de um quarteirão nova-iorquino devemos barrar o caminho aos adversários do Ocidente e da NATO. Todos os que experimentámos o peso dos sacrifícios sentimos a obrigação de não os tornar irrelevantes. Todos os que prezamos o pluralismo político, independentemente do nosso sentido de voto, somos chamados a defendê-lo.