Portugal está neste momento nas mãos de um grupo de gente cheia de medo. Têm medo uns dos outros e têm medo dos portugueses. Eles são os populares. Ou melhor dizendo os viciados na popularidade.
Não há nada que alguém dependente da popularidade mais tema que a perda de protagonismo. Porque para eles não há outra legitimidade senão a que advém das setinhas para cima e para baixo nos jornais.
Entre 2015 e 2017, no meio de selfies e anúncios de descrispação, virámos de facto a página não da austeridade que por aí continua mas sim do plano da legitimidade, de que foram protagonistas Cavaco Silva, Passos Coelho e António José Seguro, para o plano da popularidade que é aquele em que se movem Marcelo e António Costa. Não interessam as competências, poderes e deveres de cada orgão, interessa apenas se se está em alta ou em baixa nos índices de popularidade e portanto se se tem de calar ou se, pelo contrário, se pode atacar.
Outubro de 2017 é um marco nessa passagem do tempo da legitimidade para o da popularidade: um político que se tornou primeiro-ministro sem a legitimidade do voto acabou nas mãos de um Presidente da República que vê na popularidade o instrumento para alterar a correlação de forças no sistema político.
A isso junta-se o facto de o principal partido da oposição estar sem líder pois numa das mais disparatadas decisões de que há memória e que apenas se entende se ditada por razões da sua vida pessoal (e sabemos que essas razões existem e são fortes) Passos Coelho apresentou a sua demissão de líder do PSD. Porquê? Porque os seus candidatos não obtiveram bons resultados. Espantoso país este que tem como primeiro-ministro um derrotado nas legislativas e o homem que ganhou essas legislativas se demite de líder partidário porque perdeu as autárquicas.
A demissão de Passos foi em primeiro lugar uma vitória para Marcelo pois os nomes que se perfilam para lhe suceder não só são mais afins ao actual Presidente da República, como desprovidos de peso político q.b. para estorvarem os seus desígnios e, não menos importante, o seu protagonismo: Rui Rio foi presidente da câmara do Porto e Santana Lopes além de autarca em Lisboa destaca-se por ter sido, enquanto primeiro-ministro, uma espécie de vítima de bullying presidencial. Em resumo, Rio e Santana não ganham nada há muito tempo a não ser nos referendos dos comentadores, logo precisam da bengala do Presidente para se tornarem apresentáveis. E a demissão de Passos foi também a vitória que o PS precisava para escamotear o quebra-cabeças e estratégias saído das urnas a 1 de Outubro: a vitória do PS foi pírrica já que feita à custa do PCP que agora cobra em contestação e exigências o que perdeu nas autárquicas.
Estamos portanto no momento de maior poder para Marcelo e isso não é uma boa notícia para o país. Não estão em causa a sensibilidade e a generosidade do cidadão Marcelo Rebelo de Sousa. Nem o seu encanto, a sua cultura, a sua graça ou a sua inteligência. Acontece que as qualidades que levam a que todos gostássemos de ter Marcelo como professor, convidado para o jantar ou como vizinho não chegam para fazer dele um bom Presidente da República. Muito particularmente a sua dependência da popularidade que o tornou um excelente contacto para jornalistas e frequentadores da praia do Guincho, leva-o ora a tomar posições com uma ligeireza pueril ora a adoptar com uma volatilidade cruel o ponto que lhe é mais favorável no julgamento dos comentários do dia: a diferença de atitude de Marcelo Rebelo de Sousa face aos incêndios de Junho (Pedrogão) e de Outubro é reveladora dessa gestão das circunstâncias em função da sua popularidade: depois de ter andado com Costa ao colo, Marcelo desembaraça-se dele.
Do outro lado está António Costa que oscila entre a rudeza jacobina nos momentos em que sente forte e o acabrunhamento egocêntrico de quem, tendo sido sempre protegido, não consegue enfrentar as dificuldades. A frase “admito ter errado na forma como contive essas emoções” a propósito dos incêndios é digna de um consultório sentimental não de um chefe de governo. Morrem mais de cem pessoas em parte por falhas do Governo e a palavra responsabilidade continua a não ser pronunciada por António Costa. O que ele assume é ter contido as emoções. Estamos bem servidos! Ou seja Costa arrepende-se de não ter feito como Marcelo e ido por esse Portugal fora abraçando e beijando. Neste momento aliás não há líder que não se sinta compelido a imitar Marcelo.
Governado por líderes dependentes dos índices de popularidade Portugal está a tornar-se uma pantomina com um crescendo de declarações patéticas proferidas por gente sem noção do seu papel e, não menos importante, sem noção do ridículo. Quando chegar a conta do quanto custou António Costa ser primeiro-ministro e da falta de sentido institucional de Marcelo veremos de que fibra são feitos o primeiro-ministro que diz ter nervos de aço mais o presidente que diz que cola coisa.
PS. “O Partido Comunista Português (PCP) considera “uma ingerência” a atribuição do Prémio Sakharov para Liberdade de Pensamento à Oposição Democrática na Venezuela.” – A notícia só surpreende quem se quis enganar acerca da natureza totalitária dos comunistas. Por ironia os comunistas acabam a repudiar a atribuição de um prémio que leva o nome de um homem que eles também condenaram: Sakharov. O espantoso não é o que esta gente diz ou faz mas sim que os tentem apresentar como democratas.