Fez-se logo história em 1958. A Irlanda do Norte qualificava-se para o Mundial, o da Suécia. A corrida dos britânicos só encontrou um semáforo vermelho nos quartos de final, mostrado pela França. Ficavam por ali, mas já tinham reclamado atenções pela pequenez geográfica – vestiram a camisola do país mais pequeno de sempre a participar na prova. Na estreia em campeonatos do mundo, portanto, um recorde. Os prenúncios só poderiam ser bons.
Não foram. Os norte-irlandeses não sairiam de Belfast nos 26 anos seguintes, à espera de uma colheita entre sorte, jogadores e treinador que os reconduzisse a um Mundial. Tiveram que aguardar até 1982, quando o Mundial aprendeu a falar a versão espanhola do castelhano. Por fim, a Irlanda do Norte regressava a um campeonato do mundo. E, antes de lá chegarem, arranjaram de novo maneira de fazer história.
Ou melhor, chamaram quem a conseguisse fazer. No dia marcado para anunciar os homens que dariam cara e pernas à Irlanda do Norte no Mundial, o seleccionador Billy Bingham lembrou-se de Norman Whiteside. Surpresa. O treinador acabava de incluir nos convocados um novato que, durante a temporada, fizera apenas dois jogos oficiais. Mais grave ainda – Whiteside tinha acabado de completar 17 anos.
Foi com essa idade que viajou para Espanha e, a 17 de junho de 1982, se tornou o jogador mais jovem de sempre a pisar um pedaço de relva durante um Mundial. Para agigantar a coisa, graças aos seus 17 anos e 41 dias de vida, Norman Whiteside quebrou o recorde que pertencia a Pelé. Ao Rei, ao brasileiro, ao homem que, no tal campeonato do mundo de 1958, marcara quatro golos para ajudar o Brasil a ser campeão.
A (grande) diferença: Whiteside não era nenhuma estrela. Estava no Manchester United, sim, mas somara apenas 91 minutos de jogo em 1981/82. Era extremo, canhoto e alto (1,88m). Poucos o tinham na mira mas, dentro dos red devils, havia quem já antecipasse esta surpresa. “Um dia estávamos a voltar de um treino e lá estava eu, com os meus 16 anos, quando Eric Harrison, um dos treinadores, se virou para mim e disse: ‘Norman, se continuares assim ainda tens hipóteses de ir ao Mundial’”, recordou o norte-irlandês, já em 2006.
Três meses depois, Whiteside era um dos onze homens que, em Valência, se alinharam para defrontar e vencer a Jugoslávia no primeiro encontro da fase de grupos do Mundial. “Na altura ainda perguntei [a Eric Harreson] se estava a gozar comigo, mas a verdade é que as coisas acabaram por acontecer muito rápido para mim”, confessaria depois. Norman Whiteside foi titular nos quatro encontros que a Irlanda do Norte fez até à segunda ronda do Mundial, incluindo a vitória (1-0) frente aos anfitriões espanhóis.
A ESPECIALIDADE DE WHITESIDE: Ser jovem e estreante
Surpresa? Ao que parece, nem por isso. “Antes do Mundial até fiquei com o número 16 para afastar os jornalistas da pista. Mas o Billy Bingham sempre disse que, depois dos primeiros dias em Brighton [onde a Irlanda do Norte estagiou antes do Mundial], soube logo que eu iria ser titular contra a Jugoslávia. Para disfarçar, foi mantendo a ilusão de que a minha titularidade era possível em vez de provável”, defendeu Whiteside à revista Four Four Two.
Para encontrar algo parecido é preciso pular até 2006, quando a Inglaterra ainda dependia das decisões de Sven-Goran Eriksson. Na altura, o técnico sueco foi vasculhar à segunda divisão inglesa e por lá encontrou Theo Walcott, no Southampton. Convocou-o para o Mundial e deu uma pitada de polémica à seleção, mas o extremo, hoje no Arsenal, não chegou a realizar qualquer minuto na prova. Tinha 16 anos. E não será o Mundial do Brasil a quebrar este recorde: o jogador mais novo é Fabrice Olinga, dos Camarões, com 18 anos e um mês.
Walcott foi mesmo a ameaça mais séria ao recorde de Norman Whiteside – que, graças à qualificação norte-irlandesa em 1986, já tinha participado em dois Mundiais quando chegou às 21 primaveras de vida. A pegada de Whiteside, porém, não se cinge ao campeonato do mundo. Em 1983, o médio tornou-se também o mais jovem de sempre a marcar numa final da Taça de Inglaterra e da Taça da Liga Inglesa. Ainda hoje mantém os três recordes.
A carreira de Whiteside terminaria cedo, em 1991. Aos 26 anos, o joelho não deixava mais. Culpa, defendeu o jogador na sua autobiografia, dos efeitos de várias intervenções médicas feitas quando ainda tinha apenas 18 anos. Ficaria no Manchester United até 1989, onde também terá sido o primeiro a iniciar uma mania – a de antecipar sucessores de George Best, extremo norte-irlandês e uma das estrelas do United durante a décade de 60 e 70. “As únicas coisas que tínhamos em comum era o facto de virmos do mesmo sítio [Belfast], de jogarmos no mesmo clube e de termos sido descobertos pelo mesmo homem”, chegou a dizer Norman.
Com razão: Best nunca conseguiu ser o mais novo a fazer tanta coisa.