Depois de ter conversado com a troika e discutido a questão em Conselho de Ministros, o Governo decidiu abdicar dos cerca de 2,6 mil milhões de euros da última tranche do programa de ajuda financeira. Esta decisão não é inédita já que em 1983, aquando da segunda intervenção do FMI no país, o envio da última tranche também não se realizou. Porquê? Porque Portugal não conseguiu cumprir algumas cláusulas do acordo.

Em 1983, ano em que se formou um Governo de aliança entre PS e PSD presidido por Mário Soares, a comitiva do FMI chegou a 18 de julho, liderada pela italiana Teresa Ter-Minassian, a chefe da divisão responsável pelo sul da Europa. O Governo pretendia “a obtenção de um empréstimo de 300 milhões”, refere o Diário de Notícias.

Numa conferência que deu em Lisboa, em 2011, Teresa Tel-Minassian explicou que o principal objetivo do programa de apoio foi o restauro de uma situação viável da balança de pagamentos nacional, através de:

  • Redução do défice orçamental (nomeadamente, o aumento de alguns impostos e a redução salarial na função pública);
  • Melhoras das finanças das empresas públicas através de moderação salarial, cortes dos investimentos e controles do endividamento;
  • Aperto dos tetos ao crédito interno e aumentos das taxas de juros, até níveis positivos em termos reais;
  • Desvalorização pontual de 13% do escudo em relação às moedas dos principais parceiros comerciais

No princípio de outubro do mesmo ano, o DN escrevia que o FMI “anunciou a concessão de um empréstimo a Portugal”, com o objetivo de “atenuar as dificuldades a curto prazo e reduzir os encargos de empréstimos a longo prazo”. 1984 seria então um ano de “contenção” de créditos e salários, especialmente no setor público, que dominava “as preocupações do FMI”.

Em outubro de 1984, o ministro das Finanças e do Plano, Ernâni Lopes, garantiu que Portugal não iria contrair mais empréstimos externos até ao final do ano, apesar de algumas empresas públicas o terem feito. Era algo que ia contra o acordo. A esta altura, Portugal já tinha atingido o limite do crédito ao setor público, negociado com o FMI. A inflação também ficou fora do controlo: atingiu os 30% quando deveria ter ficado pelos 24%.

À semelhança do que se passa atualmente, a intervenção do FMI no país terminou com o não envio da última tranche. “A escassos dias da vigência do acordo estabelecido com o FMI, o DN apurou que a última tranche do empréstimo (90 milhões de dólares) não será entregue devido ao facto de algumas cláusulas, designadamente o controlo do crédito ao sector público, não terem sido cumpridas”.

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