“Eu sei apresentar-me em português: Bom dia, sou a Constança”, diz uma menina de nove anos, num sotaque brasileiro, na embaixada do Brasil em Malabo, capital da Guiné Equatorial.

Na cidade, existem 300 alunos de português, um projeto-piloto da embaixada que tem tido um grande sucesso num país que quer entrar na Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP) na cimeira de Díli, na quarta-feira.

As aulas decorrem na embaixada do Brasil e no Centro Cultural Equato-guineense. Shirleide Pereira é a professora da turma de Constança, que inclui 20 crianças, com aulas duas vezes por semana.

O projeto inclui um jornal, “O Carioca”, que é distribuído pela embaixada e em que se podem ler os trabalhos dos alunos. “Temos de desenvolver o português e para isso é preciso criar um curso. Quando eu abri o curso, em abril de 2012, tínhamos um espaço para 100 alunos e apareceram quase 300”, recorda Eliana Puglia, a embaixadora cessante do Brasil.

Desde que se começou a falar na adesão à CPLP, a diplomata já nota diferença. Está-se a criar um “‘portunhol’ que é falado nas ruas” e a “língua portuguesa é muito acarinhada”.

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Apoiante da entrada do país, o Brasil acha que esta adesão constitui uma “oportunidade” para a organização e a aposta deve ser no alargamento: “A CPLP deve crescer porque na medida em que cresce, cresce também a nossa cultura”.

A formalização do português como língua oficial da Guiné Equatorial “vai forçar que cada vez mais pessoas falem português”, podendo depois gerar benefícios para todos.

“Na hora de fazer o comércio eles vão fazer com os portugueses, com os brasileiros e com os angolanos” e haverá “uma abertura muito maior”, diz a diplomata, confiando que a cimeira de Díli seja um “momento certo” para a formalização da entrada do país. Caso “demore muito tempo a acontecer, pode ser que a gente perca o bom da história”, diz Eliana Puglia, que reconhece a existência de vários problemas de direitos humanos no país, mas salienta que o Governo está a fazer um esforço para resolvê-los.

“Há um processo de abertura gradual neste país e, pelo que era, está a ser bastante rápido”, diz a embaixadora, que invoca a sua própria experiência para aconselhar a sociedade civil dos países ocidentais. “Depois de três anos em África, acho que temos de respeitar as tradições africanas”, que têm um modelo de gestão “quase feudal e tribal de sociedade antiga”.

No entanto, reconhece, a Guiné Equatorial ainda continua a ser “uma semidemocracia autoritária”, mas para mudar isso é necessário formar a sociedade civil. Por isso é que as aulas de português podem ajudar a formar uma nova consciência política.

“Um aluno vem para a aula e sabe que no Brasil vai haver eleições e vê a briga que existe”, diz Eliana Puglia, acrescentando: “Só a mera existência do exemplo [do que se passa noutros países] já é alguma coisa”.

As aulas são ministradas por dois professores brasileiros e um português. Shirleide Pereira lida em particular com as crianças, com as quais “é possível fazer a diferença” porque “têm muita facilidade” em aprender. “Sou apaixonada por dar aulas” e a adesão inicial “surpreendeu bastante”.

Um dos instrumentos didáticos é o primeiro livro escrito em português, pela própria embaixadora e por outro professor, Emmanuel Laureano, denominado “Conhecendo Malabo”.

No livro, são feitas comparações lexicais e fonéticas entre o espanhol e o português, juntando também exercícios básicos para as crianças.

O livro inclui-se também num dos “escopos da diplomacia brasileira” que é a “difusão do português”, refere a diplomata.

Rodrigo (10 anos), Gael (9), Willie (9), Frankin (8), Sara (5), Rossia (7) e Manuel (7) são colegas de Constança num projeto que marca o início das aulas de português num país que continua a falar espanhol nas ruas.

“Gosto muito de português” mas “falo melhor espanhol”, resume Emerson (9 anos).