Pensava-se, no início, que a epidemia do vírus do Ébola, que surgiu na Guiné-Conacri, não ia durar mais de que um mês a conter. Porém, passados cinco meses, o vírus continua a espalhar-se e o medo de chegar a outros países aumenta. Nesta quarta-feira, a direção geral de Saúde (DGS) garantiu que Portugal está preparado para detetar e enfrentar um eventual caso de vírus de Ébola, mas sublinhou que o risco de importação e propagação é “muito baixo”.

“É pouco provável o Ébola chegar a Portugal”, afirma Jorge Atouguia, médico especialista em infecciologia e medicina tropical, ao Observador, confirmando as declarações da DGS. “Outros países africanos com ligações comerciais à Libéria, Guiné-Conacri e Serra Leoa estão em maior risco”, acrescenta, ao falar do caso dos países em áfrica com raízes francófonas e anglo-saxónicas.

Já passaram cinco meses desde o início do surto de Ébola, mas a situação só dá sinais de estar a piorar. Segundo o especialista, o maior perigo é que pessoas já infetadas estejam a abandonar aqueles países. Isto porque, no início da doença, os sintomas podem ser confundidos com uma qualquer situação febril e o período de incubação de 2 a 20 dias, o que complica a situação e aumenta a probabilidade de propagar o vírus.

Na semana passada, foi declarada a primeira morte devido ao vírus do Ébola na Nigéria, o que criou um clima preocupação internacional. Este caso evidenciou o risco de contágio e propagação “de deslocação por avião”, diz Jorge Atouguia.

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Se, em último caso, o vírus chegar a Portugal, quem deve estar mais alerta são os funcionários de saúde: médicos, enfermeiros e auxiliares de ação médica. “São quem tem maior probabilidade de entrar em contacto com alguém infetado”, explica.

Como precaução, o especialista de saúde recomenda que a primeira pergunta a fazer a algum doente que evidencie os sintomas é: veio de onde? “Se vier da Libéria, Serra Leoa ou Guiné-Conacri, é preciso tomar medidas de prevenção.” Depois de identificar o caso, é necessário proceder a uma “identificação de contactos”: pessoas com quem tenha contactado. “Qualquer pessoa contagiada está em risco” de morte, lembra o especialista.

Graça Freitas, diretora-adjunta da Direção Geral de Saúde, afirmou hoje que Portugal está preparado, tal “como os restantes países europeus, para detetar um eventual caso [do Ébola] que possa ser importado.” A epidemia, surgida no início do ano, foi declarada primeiro na Guiné-Conacri, antes de se estender à Libéria e depois à Serra Leoa, dois países vizinhos que, a 23 de julho, totalizavam 1.201 casos e 672 mortes, de acordo com o último balanço da Organização Mundial de Saúde. “Neste momento estamos confortáveis com a situação, o risco de importação é muito baixo”, adiantou Graça Freitas, referindo que “o risco de propagação [do Ébola é] muito baixo nos países desenvolvidos”.

Também nesta quarta-feira, em Londres, o Governo britânico anunciou a realização de uma reunião interministerial de gestão desta crise, que considera “uma ameaça” para o Reino Unido. “Até ao momento nenhum cidadão britânico (no estrangeiro) foi infetado e estamos bastante confiantes de que não existe qualquer caso (do vírus) no Reino Unido”, declarou à estação BBC o ministro dos Negócios Estrangeiros britânico, Philip Hammond. O vírus do Ébola “constitui uma ameaça à qual se deve dar uma resposta”, frisou.

“Nunca vimos uma epidemia assim”

O diretor de operações da organização Médicos Sem Fronteiras (MSF), Bart Janssens, avisou esta quarta-feira, numa entrevista publicada no jornal Libre Belgique, que a epidemia de Ébola na África ocidental está a agravar-se e pode atingir outros países.“Esta epidemia não tem precedentes, não está controlada, a situação agrava-se e ameaça estender-se ainda mais, sobretudo na Libéria e Serra Leoa, com focos muito importantes”, declarou.

“Se a situação não melhora muito rapidamente, há um risco real de ver novos países atingidos”, advertiu. Janssens afirmou que esta possibilidade “não se pode excluir, mas é difícil de prever”.“Nunca vimos uma epidemia assim e falta uma visão de conjunto para perceber onde se situam os principais problemas”, sublinhou.

A MSF está “muito preocupada com os contornos que a situação assume, particularmente” na Libéria e na Serra Leoa, disse. “Cabe à Organização Mundial de Saúde (OMS) e aos governos destacar e organizar os meios necessários para desenvolver esforços e capacidade ao nível requerido para começar a controlar esta epidemia”, concluiu o responsável da organização não-governamental.

O vírus do Ébola transmite-se por contacto direto com o sangue, líquidos biológicos ou tecidos de pessoas ou animais infetados. A febre manifesta-se através de hemorragias, vómitos e diarreias. A taxa de mortalidade varia entre os 25 e 90% e não é conhecida uma vacina contra a doença.

Leia o nosso explicador sobre o vírus do Ébola.