Governo e maioria defenderam com unhas e dentes o regime de vistos Gold que está em vigor e cujas alterações o Governo levou esta quinta-feira ao Parlamento. O regime é “melhorável e aperfeiçoável” mas não é reprovável, foi esta a ideia que o vice-primeiro-ministro levou à Assembleia da República, defendendo ser “insano” recusar o investimento estrangeiro. Além da proposta apresentada pelo Governo, foi também debatida ao mesmo tempo uma proposta do Bloco de Esquerda que visava a eliminação por completo do programa de vistos Gold – mas foi contestada friamente pelas bancadas da maioria e também do PS.
A posição do Bloco de Esquerda foi clara: há imigrantes que hoje trabalham em Portugal, pagam impostos, mas não têm autorizações de residência com toda a facilidade com que têm os cidadãos estrangeiros que tenham um milhão de euros na mão. O que faz com que, disse a deputada Cecília Honório, o programa seja discricionário e abra o fosso entre “imigrantes de primeira” e “imigrantes de segunda” linha.
Um argumento que foi visto de outro prisma pelo deputado social-democrata Carlos Peixoto, que, admitindo que a realidade retratada pela deputada “não é totalmente mentira”, “é preciso tratar de forma diferente o que é diferente”. E nesse sentido o PSD defendeu que é preciso valorizar mais os cidadãos estrangeiros que enriquecem mais o país. Noutras palavras: “não há imigrantes de primeira nem de segunda, há é imigrantes que oferecem mais oportunidades ao país do que outros”, disse.
“O que é que o BE prefere, que entrem em Portugal pessoas com dinheiro, trabalho e capacidade de auto-sustentação, ou os outros? O PSD quer combater a pobreza, o BE parece querer só combater a riqueza”, disse Carlos Peixoto, acrescentando que Portugal precisa de “todos os imigrantes”, tantos os “laborais como os chamados capitalistas”.
Durante o debate sobre as propostas de alteração do Governo sobre o regime de Autorizações de Residência para a atividade de Investimento (ARI), conhecido vulgarmente por vistos Gold, Paulo Portas defendeu que a sua função é “atrair” investimento estrangeiro para Portugal e destacou as alterações ao programa que o Governo já tinha anunciado, orientadas não só para o imobiliário mas também para os setores da ciência, inovação e qualificação, “de forma a que se torne mais acessível favorecer o investimento em territórios marcados pela interioridade”.
A deputada bloquista Cecília Honório, no entanto, foi muito crítica do programa. Mesmo com o novo foco, “não tem emenda nem retoque”, disse, sublinhando que os vistos Gold vão estar sempre associados a casos de corrupção e à detenção de altos dirigentes do Estado (já foram detidos 11 no âmbito daquela investigação). “A ideia com que as pessoas ficaram é que não há controlo porque haverá sempre alguma possibilidade de favorecimento ou negócio esquisito pelo caminho”, disse a deputada bloquista. O PCP juntou-se a este argumento, alegando que as alterações propostas pelo Governo nada fazem para prevenir os riscos de corrupção e branqueamento de capitais, não dando, segundo o líder parlamentar do PCP, resposta a nenhum dos problemas até aqui identificados.
Mas, na resposta, Paulo Portas voltou ao ponto de onde começou. Programa não é perfeito, mas Governo está disponível para ouvir os contributos de todos para que possa ser melhorado. E lembrou, a esse propósito, uma intervenção de António Costa ainda no programa Quadratura do Círculo, na SIC Notícias, onde o líder socialista disse que “não é por haver um caso de corrupção na direção-geral de Viação que se acaba com as cartas de condução”. Ou seja, em caso de irregularidades ou ilegalidades, cabe à justiça tomar conta do caso, não ao legislador.
Também o deputado do CDS Telmo Correia lembrou noutra ocasião o nome de António Costa (“essa grande figura da política nacional”, disse). Afirmando que o regime tinha resultado na atribuição de um total de 2 mil vistos e, consequentemente, “num enorme investimento”, lembrou que “os amigos são para as ocasiões” e que, numa ocasião difícil como a que Portugal se encontrava, “os investidores chineses estiveram ao lado de Portugal a ajudar a vencer a crise”. As polémicas palavras de Costa durante as comemorações do ano novo chinês foram mais uma vez reaproveitadas pela maioria.
Ana Catarina Mendes, em nome do PS, mostrou-se “disponível para trabalhar em conjunto” com o Governo, no sentido em que “estamos a falar de pessoas a quem pedimos algo de especial (investimento), de pessoas que se dispõem a ajudar Portugal”. A deputada socialista, numa intervenção que foi elogiada depois pela bancada do PSD, mostrou-se “globalmente de acordo” com a criação do fundo de capitalização de pequenas e médias empresas e com a abertura do leque de aplicação do investimento a setores mais diversos, como a cultura, e disponível para discutir ao pormenor as propostas em sede de especialidade.
Paulo Portas recordou ainda que existem 14 países na Europa com um regime de vistos Gold semelhantes ao português, e defendeu que o programa, que agora se prevê que seja aberto ao investimento nas áreas da cultura, ciência e reabilitação urbana (e não somente ao investimento no imobiliário), tenha sido responsável pela criação de 20 mil postos de trabalho no mercado imobiliário e do turismo residencial.