Costa avançou a medida e Ferro Rodrigues, líder da bancada parlamentar, está a tentar cumpri-la. O PS enviou esta quinta-feira uma carta a todos os partidos com assento parlamentar de modo a averiguar se estes estão disponíveis para debater “uma revisão constitucional extraordinária e cirúrgica” para alterar o artigo 102º que regula o Banco de Portugal e ao qual seria acrescentado o mecanismo de nomeação do governador. Os socialistas defendem que este processo deve passar pela Assembleia e pelo Presidente da República.

Alegando a importância crescente dos reguladores bancários na vida do país, o PS quer saber se PSD, CDS, Verdes, PCP e Bloco de Esquerda estão disponíveis para alterar a Constituição no que diz respeito à nomeação do governador do Banco de Portugal, passando a decisão final pela Assembleia e pelo Presidente da República. A proposta foi avançada por António Costa no fim de semana e agora os socialistas enviaram uma carta, a que o Observador teve acesso, com a proposta do seu líder aos restantes grupos parlamentares.

Para acrescentar este poder às competências do Presidente da República, seria necessária uma alteração à Constituição vigente, neste caso o PS quer acrescentar um ponto ao artigo da Constituição que fala sobre o Banco de Portugal, estipulando que o Presidente teria de nomear o governador do Banco de Portugal:

Artigo 102.º
Banco de Portugal
O Banco de Portugal é o banco central nacional e exerce as suas funções nos termos da lei e das normas internacionais a que o Estado Português se vincule.

No entanto, é mais do que um ato de cordialidade, já que uma iniciativa de revisão constitucional extraordinária, como a que é pedida pelo PS, carece de aprovação por maioria de quatro quintos dos deputados em efetividade de funções, pedindo assim um consenso alargado para introduzir esta alteração no texto da Constituição.

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Na carta, o PS anuncia ainda – e segundo o que alega ser uma prova de “lealdade parlamentar” que apresentará um projeto-lei no dia 10 de abril que visa consagrar a intervenção da Assembleia da República no processo de escolha do governador do Banco de Portugal, nomeadamente através de uma audição prévia segundo propôs António Costa.

Maioria prepara-se para bloquear revisão

O PSD, no entanto, prepara-se para responder que não vai viabilizar nenhuma revisão constitucional em cima das eleições. Fonte da direção da bancada parlamentar disse ao Observador que “não faz sentido” abrir um processo de revisão constitucional “a seis meses das eleições”, ainda por cima quando até há pouco tempo houve no Parlamento uma comissão para estudar eventuais revisões da Constituição. Outro dos argumentos é a questão de os restantes partidos, como o BE e o PCP, também terem legitimidade para propor outras adendas e alterações ao documento caso o processo fosse aberto à boleia desta alteração “cirúrgica”.

Do lado do CDS a resposta surge idêntica. Ao Observador, o líder parlamentar centrista afastou a possibilidade de vir a apoiar uma proposta de revisão constitucional nesta altura do campeonato. “Se dizem que não temos legitimidade para governar a seis meses das eleições também não temos para abrir um processo de alteração da Constitucional”, defende Nuno Magalhães.

Certo é que o PS não ficou esclarecido com a posição do PSD depois das duas últimas declarações públicas do porta-voz do PSD sobre a matéria. E força agora os partidos a dizer o que pensam face às dúvidas constitucionais.

É que, numa primeira reação à proposta socialista, no domingo, o porta-voz do PSD e vice-presidente do partido, Marco António Costa deixou claro que essa alteração implicava uma revisão da Constituição e que o PSD estava “disponível para estudar com o PS qualquer proposta de revisão constitucional”, ainda que tenha sublinhado não ser a altura mais indicada para iniciar esse processo. Ideia semelhante terá sido passada depois pelos deputados sociais-democratas que integram a Comissão Parlamentar de Orçamento e Finanças, que não terão descartado a possibilidade de discutir o assunto.

Na quarta-feira, no entanto, Marco António Costa mudou de tom, acusando o PS de querer mudar a Constituição porque “toca a lugares” e de estar a fazer as coisas “à pressa”. No encerramento das jornadas da JSD, o dirigente social-democrata deixou claro que o partido não está disponível “para andar a brincar às revisões constitucionais”, sobretudo numa matéria que não é “central na vida dos portugueses”.

O socialista Eduardo Cabrita, que preside à Comissão de Orçamento e Finanças, defendeu ao Observador que a questão estava agora “nas mãos do PSD”. “Estamos à espera para saber qual é o entendimento” dos sociais-democratas sobre essa matéria, disse, voltando a afirmar que o Partido Socialista se mantém “disponível” para uma eventual revisão constitucional “cirúrgica”, “se for necessário”.

Em todo o caso, com ou sem acordo político alargado sobre a matéria, Eduardo Cabrita mantém que “o PS apresentará para debate um projeto de lei sobre a matéria reforçando a independência do Banco de Portugal”.