Quando Nigel Farage, o líder do partido eurocético britânico UKIP, diz qualquer coisa como “eis um facto de que eu estou certo que algumas pessoas vão ficar horrorizadas por eu me atrever a falar dele”, então é porque algo verdadeiramente controverso está prestes a ser dito.

A frase continuou assim: “Todos os anos existem 7 mil pessoas são diagnosticadas com VIH neste país. Não é um bom lugar para elas, eu sei. Mas 60% deles não são cidadãos britânicos. Há quem venha para o Reino Unido, de todas as partes do mundo, é diagnosticado com VIH e depois recebem os medicamentos retrovirais que custam até 25 mil libras anualmente por paciente.”

Após um debate que terminou sem um vencedor claro, esta intervenção de Farage está a ser um dos momentos que está a gerar mais discussão no rescaldo do programa transmitido na ITV na noite de quinta-feira.

A primeira reação partiu de Leanne Wood, líder do partido galês de esquerda Plaid Cymru, se insurgiu diretamente contra a afirmação de Farage. “Esta retórica de arauto da desgraça é perigosa, é perigosa e divide comunidades. Coloca um estigma nas pessoas que estão doentes e eu acho que você devia ter vergonha de si próprio”, disse, arrancando aquela que foi a primeira ovação da noite em estúdio.

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Já longe do foco das câmaras o líder trabalhista, Ed Miliband, escreveu no Twitter que este comentário de Farage foi “nojento” e que “ele devia ter vergonha”.

Na mesma rede social, o candidato dos Liberais Democratas, Nick Clegg, falou da “política na maneira mais rasteira”.

Imprensa britânica diz que os números de Farage estão errados

Segundo um relatório oficial britânico referente a 2014, 62% das pessoas infetadas com VIH nasceram no Reino Unido, aponta o “The Guardian” – os números de Farage apontariam para 40%. Isto não significa que a percentagem de cidadãos britânicos entre os infetados fique por aí, tendo em conta que nascer no Reino Unido não é requisito obrigatório para obter cidadania.

O “The Guardian” lembra ainda um relatório de 2005 da responsabilidade da Casa dos Comuns que referia que a maior parte dos estrangeiros seropositivos recorriam ao serviço nacional de saúde britânico apenas quando a doença já estava num estado avançado. “[Este] não seria o comportamento esperado por parte de um cínico ‘turista de saúde’ que veio para o país somente para aceder a serviços grátis”, refere o documento.

Entretanto, Farage reagiu à polémica reforçando a sua ideia inicial, que diz basear-se em “factos puros e duros”. “Claro que queremos ajudar pessoas de todo o mundo, mas qual é o limite para isto? O nosso sistema nacional de saúde precisa de dinheiro e não existe para tratar o mundo inteiro”, disse, num tom visivelmente mais calmo do que aquele que adotou no debate de 2 de abril.

Foi tudo estratégia de Farage, diz o “The Telegraph”

No dia seguinte ao debate o jornal “The Telegraph” citou fontes anónimas ligadas ao UKIP que revelaram que o comentário controverso de Farage foi uma jogada “não no sentido de chegar aos eleitores indecisos mas antes dirigida à base eleitoral” do partido eurocético, no sentido de a “motivar”.

A mesma fonte também avançou que durante a preparação para o debate, Farage estava a pensar falar antes da proporção de estrangeiros com tuberculose em relação à população total afetada por esta doença. Mudaram de ideias: “Apercebemo-nos de que os medicamentos para o VIH eram mais caros”.