“Conhecendo o sistema como conheço, sei que uma ordem para assassinar um cidadão de outro país, sobretudo em território britânico, só poderá ter sido dada por uma pessoa. E essa pessoa é o presidente da Federação Russa, Vladimir Putin“. A acusação de Alexander Litvinenko consta de um inquérito que está a ser elaborado pelas autoridades britânicas à morte, em 2006, do ex-espião russo e crítico feroz do regime de Putin. Algumas passagens deste inquérito chegaram à imprensa britânica no início desta semana, mas um dos homens acusados de terem envenenado Litvinenko com um químico radioativo letal diz que é possível que este tenha cometido “suicídio inadvertido”.
Dmitry Kovtun afirmou em conferência de imprensa esta quarta-feira, em Moscovo, que a sua “versão principal sobre o que terá acontecido é que tenha havido um acidente”. Kovtun, um dos dois homens com quem Litvinenko se encontrou na receção de um hotel em Londres poucas horas antes de adoecer súbita e gravemente, advoga que o antigo espião russo deverá ter tido contacto com Polónio-210 antes do encontro dos três e que, ao manusear este químico radioativo raro, ter-se-á contaminado. As palavras de Kovtun foram citadas pelo The Guardian.
Análises a um bule utilizado para servir chá verde no hotel em que Alexander Litvinenko, Dmitry Kovtun e um terceiro homem, Andrei Lugovoy, se reuniram numa tarde de novembro de 2006, mostraram que o recipiente continha níveis de radioatividade que “rebentam a escala”, segundo uma descrição das autoridades londrinas na altura. Esta e outras pistas alimentaram a teoria de que os dois homens verteram uma pequena quantidade de Polónio-210 no bule antes de servirem uma chávena de chá a Litvinenko e depois de servirem uma chávena para eles próprios.
Vladimir Putin negou, desde sempre, qualquer envolvimento com a morte de Alexander Litvinenko, um dos seus críticos mais ferozes e amigo próximo de Boris Berezovsky, um empresário russo também crítico de Putin e, aos olhos de Litvinenko, um alvo a abater pelo regime. Este empresário foi, entretanto, encontrado morto em casa em 2013, acreditando-se que se terá suicidado após perder uma longa batalha judicial com o multimilionário russo, Roman Abramovich, dono do clube de futebol Chelsea FC.
A acusação de Alexander Litvinenko, que passou 23 dias em agonia num hospital em Londres antes de morrer, vai ao encontro da mensagem que sempre foi transmitida pela sua viúva, Marina Litvinenko, que responsabilizou Vladimir Putin e o Kremlin pela morte do marido. A viúva acredita que, entre gravações das câmaras de vigilância do hotel e análises científicas, existem provas suficientes para criminalizar os dois homens. Andrei Lugovoi e Dmitry Kovtun são procurados pelas autoridades britânicas mas o Kremlin sempre rejeitou a sua extradição para solo britânico, para que pudessem ser julgados.