A viagem fatal conjunta de Sá Carneiro e Amaro da Costa, há 35 anos, foi decidida horas antes, sugerida pelo ministro da Defesa ao chefe do Governo da Aliança Democrática (PPD/CDS/PPM), segundo a antiga secretária do líder social-democrata.
Em depoimento na comissão parlamentar de inquérito que investiga a tragédia de Camarate, Conceição Monteiro contou que o então primeiro-ministro tinha três bilhetes reservados na carreira regular da TAP, mas optou por seguir o conselho de Amaro da Costa de o acompanhar no Cessna 421 Golden Eagle, que estava ao serviço da campanha presidencial do candidato apoiado pela AD, Soares Carneiro.
O pequeno bimotor de fabrico norte-americano, propriedade de Jorge Moreira, era suposto levá-los, e à restante comitiva, a um comício no Porto, em 04 de dezembro de 1980, durante a “corrida a Belém” do adversário de Ramalho Eanes, mas acabou despenhado pouco depois de levantar voo em Lisboa, por volta das 20:00.
“Houve uma reunião ao meio-dia, com os chefes dos três ramos das Forças Armadas (FA), o ministro das Finanças, o ministro da Defesa e o chefe do Estado-Maior das FA, em São Bento, para discutir o orçamento militar. O Francisco [Sá Carneiro] teve de sair, por volta das 14:00, para um almoço da campanha com outros dirigentes e apoiantes de Soares Carneiro. Foi aí que o Adelino [Amaro da Costa] lhe disse que era mais fácil e cómodo irem no avião que estava disponível”, contou a também ex-deputada Conceição Monteiro.
Antes, o chefe da segurança do então primeiro-ministro, o subcomissário da PSP Inácio Costa, que conduziu Sá Carneiro ao avião e ficou à espera da descolagem, cerca de uma hora – alegadamente por problemas para um dos motores pegar -, contou aos deputados que viu a aeronave envolta “numa bola de fogo”.
“Após um clarão, seguiu em chamas até se perder de vista”, descreveu, recusando fazer “qualquer juízo sobre o sucedido, tal como na altura” relativamente às teses de atentado ou de acidente.
Noutra audição da tarde, a ex-jornalista Inês Serra Lopes, autora de um livro sobre os acontecimentos, manifestou-se convicta de que se tratou de um atentado, embora cometido por erro, pois seria dirigido ao então candidato presidencial e a Amaro da Costa e não a Sá Carneiro.
A antiga diretora do semanário O Independente revelou ter sido abordada por vários dirigentes de PSD e CDS, bem como do PS, enquanto investigava o caso, ficando com a ideia de que “muita gente não queria que se mexesse naquilo”, mas só aceitou continuar o depoimento à porta fechada, a fim de proteger as suas fontes de então.
Os trabalhos desta X Comissão Parlamentar de Inquérito à Tragédia de Camarate, suspensos desde dezembro de 2013, foram retomados esta semana e têm conclusão prevista para o final do mês.