O administrador do Grupo Lena, Joaquim Barroca, detido esta quinta-feira no âmbito da “Operação Marquês”, já tinha sido referido na investigação do Ministério Público a propósito de contas na Suíça e da proximidade com José Sócrates, a quem tinha pedido para que o introduzisse no mercado angolano. Estas informações constam na resposta que o Departamento Central de Investigação e Ação Penal (DCIAP) enviou para o tribunal da Relação quando este avaliava se mantinha o ex-primeiro-ministro em prisão preventiva. Além de Joaquim Barroca, é citado muitas vezes também o nome de António Barroca.

Segundo o procurador Rosário Teixeira, titular do processo, quando prestou declarações José Sócrates foi confrontado com uma escuta telefónica feita a 3 de setembro de 2014, dois meses antes da sua detenção. O ex-primeiro-ministro reconheceu, então, ter “diligenciado por agendar uma reunião, com um responsável político de Angola, no interesse do dito Grupo Lena, onde caracteriza estes últimos como seus velhos amigos e a quem deve atenções”.

Mais. José Sócrates reconheceu, também, que os administradores do Grupo Lena, Joaquim Barroca Rodrigues e António Barroca Rodrigues, chegaram a acompanhá-lo numa viagem a Nova Iorque, nos Estados Unidos, para aí manterem um encontro com o referido responsável político de Angola. Com esta informação, Rosário Teixeira pretendia desmontar a tese da defesa de Sócrates ao Tribunal da Relação, mostrando como eram estreitas as ligações entre o ex-primeiro-ministro, o empresário Carlos Santos Silva e os administradores do Grupo LENA – que tem negado sucessivamente qualquer ato suscetível de constituir um crime de corrupção. E que, ao contrário dos argumentos dos advogados João Araújo e Pedro Delille, o Grupo Lena não era apenas “mais um entre muitos grupos económicos que integravam as comitivas que, sob liderança de titulares de órgãos de decisão política e governativa, se deslocavam ao estrangeiro para a promoção dos negócios com Portugal”. Um dos argumentos, aliás, invocados pelo ex-primeiro-ministro numa das entrevistas que deu já depois de estar preso preventivamente na cadeia de Évora por suspeitas de branqueamento de capitais, corrupção e fraude fiscal.

O Ministério Público explica ainda que, mesmo depois de deixar de administrar empresas do Grupo Lena, em 2009, o também arguido Carlos Santos Silva continuou a participar com “um estatuto especial” nas reuniões da administração até porque, com os administradores do grupo, era sócio da empresa XMI- Management & Investiments, SA. Os investigadores acreditam que esta “proximidade” teve reflexos “na dimensão dos contratos celebrados por empresas daquele Grupo com o Estado Português”, que adjudicou ao Grupo Lena contratos que ultrapassaram os 200 milhões de euros entre 2007 e 2011.

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Da investigação foi também concluído que os administradores, António Barroca Rodrigues e Joaquim Barroca Rodrigues, “fizeram transferências das suas contas pessoais”, em Portugal, para offshores em nome de Carlos Santos Silva, nomeadamente a Brickhurst International LTD e a Pinehill Finance, LTD, ambas sediadas na UBS de Zurique. Estes fundos foram depois transferidos para Portugal aproveitando as vantagens fiscais de regularização proporcionadas pelo RERT II (Regime Excepcional de Regularização Tributária criado pelo Governo de Sócrates), entrando em contas abertas junto do BESI e depois do ex-BES, em nome de Santos Silva. Deste valor, diz o Ministério Público, foram usados dez estratagemas para que o dinheiro fosse parar às mãos de José Sócrates. O Observador resumiu-os aqui.

Neste caso concreto, estarão em causa dois milhões de euros.

Grupo Lena nega ter crescido com Sócrates

Joaquim Barroca, detido na noite de quarta-feira, após terem sido feitas buscas à sua casa e às empresas do Grupo. Já quando Sócrates foi detido tinha havido buscas nas casas de alguns administradores do grupo Lena. Barroca foi ouvido durante todo o dia de quinta pelo juiz Carlos Alexandre para lhe ser aplicada uma medida de coação. O inquérito terminou ao princípio da noite mas as medidas só serão conhecidas esta sexta às 10h30.

O grupo Lena emitiu esta quinta-feira um comunicado dizendo que “estar completamente disponível para fornecer qualquer esclarecimento, disponibilizar todo e qualquer documento que possa clarificar muito do ruído sem fundamento que continua a circular desde o início deste processo, e que muito nos tem prejudicado em Portugal e nos países onde continuamos a trabalhar”. Sem falar no nome de Barroca, o grupo Lena diz confiar na justiça e garante que “os números e valores que têm vindo a ser apresentados são errados e erróneos, desde as PPP, ao Parque Escolar, de Venezuela a Angola”.

O grupo sediado em Leiria lembra que, “ao longo da sua história passou por dois regimes políticos, quatro Presidentes da República eleitos, governos de diversa cor e ideologia política”: “Sempre pautamos a nossa relação com o poder público, o principal cliente, em Portugal e em qualquer país do mundo, com respeito, responsabilidade e transparência”.