Começaram por ser 17, com o processo de manifestações de interesse que foi concluído no último dia de 2014. Deste universo, o Banco de Portugal aceitou 15 interessados no Novo Banco. O número foi reduzido para nove quando em março ficou fechado o grupo de entidades que confirmaram o seu interesse na aquisição. Em abril, foram apresentadas sete propostas não vinculativas, mas só cinco foram aceites. O BPI foi um dos que ficou de fora, embora o supervisor nunca tenha ao longo de todo o processo identificado os candidatos. Esta terça-feira, dia da verdade, os cinco ficaram reduzidos a três.

O Banco de Portugal mantém o silêncio sobre quem foi a jogo, mas sabe-se quem são os grupos que chegaram à eliminatória final. Dois conglomerados chineses e um fundo de investimento norte-americano.

O que têm em comum a Anbang e a Fosun? São dois grupos chineses privados candidatos à compra do Novo Banco. Mas afinidades não se ficam por aí. São conglomerados com presença em vários setores e companhias, com enfoque principal no negócio segurador (sobretudo no caso da Anbang). Têm promovido estratégias agressivas de aquisições internacionais, que assegurou uma expansão rápida dentro e fora da China. É um modelo de negócios que os analistas insistem em comparar com a Berkshire Hathaway, a empresa do milionário americano Warren Buffett.

A Fosun é um grupo privado cotado na bolsa de Hong-Kong. A Anbang, com sede em Pequim, foi lançada em 2004 por várias empresas públicas chinesas, incluindo a Shangai Automotive Industries e a petrolífera Sinopec (que controla 30% da operação brasileira da Galp). Desde então, a holding tem feito vários aumentos de capital, assegurados por dezenas de empresas privadas, diluindo as participações dos investidores públicos. Há notícias de que estará a preparar uma oferta do seu capital em bolsa (IPO).

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Um dos grandes negócios que colocou a Anbang no mapa das noticias foi a compra no final do ano passado do mítico hotel de Nova Iorque, o Waldorf Astoria, por 1,95 mil milhões de dólares (1,750 mil milhões de euros), uma aquisição descrita como ambiciosa pelos analistas internacionais. Também este ano, a rival Fosun assegurou o sucesso da oferta sobre o Club Med e fechou a aquisição do Cirque du Soleil, duas marcas mundiais da indústria do lazer.

Na lista de compras recentes da Anbang estão ainda duas seguradoras europeias, uma holandesa e uma belga e o banco belga Delta Lloyd Bank Belgium, e no mercado chinês tem vindo a reforçar a posição num dos principais bancos privados chinês, o Minsheng Banking Group.

A Fosun comprou a maior seguradora portuguesa, a Fidelidade, em 2013 que depois foi o veículo da aquisição da Espírito Santo Saúde em 2014, para além de outras operações internacionais realizadas nos últimos meses, cujo financiamento tem sido também apoiado no balanço da seguradora portuguesa. A Fidelidade tem vindo a financiar diretamente a acionista, comprando dívida da Fosun, para além de participar como investir em operações internacionais. O grupo admite estudar mais investimentos em Portugal noutros setores. No horizonte da Fosun estará também um aumento de capital.

Se o homem forte da Fosun, Guo Guangchang assume publicamente as lições que aprendeu com Warren Buffett, no caso do presidente da Anbang, Wu Xiaohui, é a sua mulher que atrai mais atenções, já que é neta de Deng Xiaoping, o líder que promoveu os primeiros passos de abertura económica da China comunista. Esta ligação tem sido vista como preciosa sobretudo ao nível dos investimentos no mercado doméstico.

Com negócios que vão desde o setor mineiro e siderúrgico, passando pelos seguros e imobiliário, e as operações de lazer e bem-estar, saúde e seguros, a Fosun participa em cerca de mil sociedades (tem muitas participações minoritárias) que empregam meio milhão de pessoas e servem 100 milhões de clientes. O conglomerado teve receitas de nove mil milhões de euros e lucros de mil milhões de euros (o mesmo que a EDP) em 2014.

A Anbang é um grupo mais marcadamente financeiro, onde os seguros são a principal força, estando ainda presente na gestão de ativos, banca e saúde. Os lucros do negócio segurador dispararam no ano passado para 1.200 milhões de euros, uma evolução explicada pelas aquisições internacionais. Os ativos estavam no final do ano passado avaliados em 100 mil milhões de euros.

Anbang e Fosun foram apontadas como fortes candidatas ao Novo Banco, após as ofertas preliminares onde terão apresentado valores mais altos. O perfil destes dois investidores será o preferido pelos trabalhadores e talvez até pela gestão do Novo Banco. A Fosun, que apostou forte em Portugal com a compra da Fidelidade e da Espírito Santo Saúde, manteve a gestão das duas empresas em equipas lideradas por portugueses, e não impôs planos de reestruturação.

O cenário alternativo, a compra do Novo Banco por um fundo de investimento americano, parece apresentar um risco maior de reestruturação, racionalização de atividade e redução de balcões e trabalhadores.

Apollo é já um nome conhecido no mercado português. Em 2013 entrou na corrida pela Fidelidade que perdeu para a Fosun, mas no final do ano passado comprou a seguradora Tranquilidade, um dos ativos do espólio do Grupo Espírito Santo. O seu interesse pela antiga joia da coroa, o BES, não será por isso uma grande surpresa.

Com sede em Nova Iorque e lançada no início da década de 90, o Apollo descreve-se como um dos maiores fundos de investimento independentes com ativos de 163 mil milhões de dólares (147 mil milhões de euros) sob gestão e uma equipa de 870 profissionais. Imobiliário e serviços financeiros e de crédito, são as grandes apostas do portfólio onde não há, pelo menos recentemente, aquisições tão sonantes como as realizadas pelos concorrentes chineses.

Mas no final de junho, o fundo americano chegou a um acordo com as autoridades eslovenas para adquirir as ações do Estado no Nova KBM, o segundo banco de retalho da Eslovénia. A proposta apresentada em parceria com o BERD (Banco Europeu de Reconstrução e Desenvolvimento) foi escolhida num processo competitivo e valoriza o NKBM em 250 milhões de euros. O fundo americano vai ficar com 80%.

Os que ficaram pelo caminho

Cereberus é o nome do fundo de investimento com sede em Nova Iorque terá apresentado oferta indicativa para comprar o Novo Banco. Criado em 1992, o fundo que vai buscar o nome a uma figura da mitologia grega, Cerberus, o cão de três cabeças que guarda a porta do inferno, é apresentado como especialista em empresas em stress financeiro e em carteiras de crédito malparado.

O fundo gere ativos de 25 mil milhões de dólares, através de investimentos num vasto leque de setores que vão desde o imobiliário e construção, até à saúde, retalho, turismo, indústria automóvel, energia e serviços financeiros. A equipa conta com 150 profissionais, centrados nos Estados Unidos, Europa, China e Japão.

O Santander dispensa grandes apresentações. É um dos maiores bancos europeus e um dos grandes resistentes à crise financeira. Até em Portugal, o grupo conseguiu manter lucros através da operação do Santander Totta. O Novo Banco não era uma prioridade na estratégia da nova liderança de Ana Botín, ao contrário do pai, Emílio Botín, que não descansou enquanto não conseguiu ganhar músculo no mercado bancário português.

O facto de ser um banco de retalho com uma marca de renome mundial era o principal trunfo do Santander nesta corrida onde é o único grupo bancário. Mas do outro lado desta vantagem estaria também o maior calcanhar de Aquiles. A presença significativa que o Santander Totta tem no mercado português fazem adivinhar uma digestão complicada do Novo Banco. Remédios para viabilizar a operação na concorrência. O risco regulatório era maior, poderia existir remédios a nível europeu e atrasar a concretização da operação. E poderá ter pesado no recuo do Santander.