A notícia surgiu esta semana, na quarta-feira. Cinquenta e três membros do comité central do Syriza apresentaram a sua demissão e preparam-se para se juntar à recém-formada Unidade Popular, partido liderado pelo ex-ministro da Energia, Panagiotis Lafazanis. Um nome a reter. O rosto da luta contra o novo programa de resgate e o rosto da revolta interna no Syriza. O homem que está a contar cabeças e a reunir tropas para roubar votos ao ex-primeiro-ministro nas eleições antecipadas de finais de setembro. De camarada a inimigo, diz o Politico.

Lafazanis foi um dos pesos pesados do Syriza que votou contra Alexis Tsipras no Parlamento, na hora de dar o sim ao terceiro programa de ajuda externa de 86 mil milhões de euros. Na altura ainda fazia parte do Executivo mas já encabeçava a ala mais radical dentro do Syriza, a Plataforma de Esquerda, pelo que a sua rutura com o partido e a consequente constituição de uma nova força política anti-resgate no dia seguinte à demissão de Tsipras, não foi surpresa para ninguém. Foi sim um rombo no Syriza, que dessa forma perdeu um dos seus membros mais experientes e respeitados pela esquerda grega. Um antigo comunista com uma extensa carreira política e uma longa resistência à ditadura militar entre finais da década de 60 e 1974.

Esta quarta-feira, numa entrevista televisiva, Tsipras admitiu mesmo que o afastamento de Lafazanis era “triste” mas não “inesperado”. “Preocupante”, também. “É preocupante porque não é fácil ver pessoas que estiveram envolvidas na mesma luta que eu de repente a apontarem-me o dedo por coisas que antes só apontavam aos nossos inimigos”, confessou.

Mas a saída da tropa mais radical de Lafazanis, que levou consigo outros ex-ministros como Dimitris Stratoulis ou o histórico Manolis Glezos, nome forte ligado à luta contra a invasão nazi, pode ser, por outro lado, uma via aberta para Tsipras reformular o seu partido e virá-lo mais para o centro-esquerda. Problema maior virá se as outras incógnitas que ainda se mantém em jogo virarem a equação. É o caso do grupo dos 53 membros do Syriza, mais moderados, que parecem estar na corda bamba, com um pé dentro e outro fora. Se mais personalidades desertarem, aí sim, a credibilidade do Syriza junto dos eleitores gregos pode vir a ser um problema.

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Um político experiente

Panagiotis Lafazanis, 63 anos, começou a sua carreira política no Partido Comunista, à semelhança de Tsipras (mais novo, com 41 anos), e tornou-se conhecido pela acesa luta contra a ditadura militar dos anos 70. Ainda nos dias que correm é uma das personalidades mais respeitadas pela esquerda grega devido ao seu percurso político consistente e com poucas flutuações. No meio da crise grega dos dias de hoje ficou conhecido pelo seu plano contra a “ditadura do euro”, que consistia basicamente em tirar a Grécia da moeda única, apreendendo a reserva de notas do banco central e até prendendo o seu governador, em caso de desobediência.

A reputação de pessoa coerente nas ideias deverá mesmo servir como trunfo para as eleições que se seguem. A ideia é opor um Tsipras que “diz uma coisa e faz outra” a um Lafazanis que “tem mantido sempre as mesmas posições”, segundo explicou ao Politico o deputado e professor de economia Costas Lapavitsas, que aderiu recentemente à Unidade Popular de Lafazanis. O próprio Lafazanis já está a fazer uso desse trunfo, tendo dito numa recente entrevista que vai “levar o ‘não’ [que ganhou o referendo] até à última”.

Num comunicado divulgado esta semana Lafazanis criticou Tsipras por agir em direção contrária àquilo que o Syriza se propôs para as eleições de janeiro: em vez de acabar com o memorando de entendimento da troika, Tsipras agiu “contra a vontade do povo” e assinou o terceiro programa de austeridade com o argumento de que, caso contrário, Atenas sairia do euro.

Descrito pelos seus apoiantes como viciado no trabalho e alguém que adora discutir política, é também reconhecido como um homem do terreno que não está “fechado dentro do partido, que sai para a rua, vai aos cafés e às manifestações”, descreveu Costas Lapavitsas. Os seus críticos, no entanto, veem outras características na sua personalidade: um comunista à moda antiga, que teima em prosseguir as mesmas ideias sem evoluções no caminho.

Alerta vermelho nas sondagens

Do alto da sua experiência nas lides político-partidárias, Lafazanis foi pronto a tomar uma decisão nos tempos conturbados que se vivem em Atenas. Desertou do Syriza em total desacordo com os termos do resgate e com o facto de Tsipras ter pedido a demissão do Governo sem antes discutir com o comité central do partido, e formou um novo partido de oposição à troika. Consigo levou logo 25 outros dissidentes, que também viraram costas ao ex-primeiro-ministro.

Com apenas cinco dias de vida, o novo partido Unidade Popular foi mesmo convidado pelo Presidente grego para (tentar) formar Governo, à semelhança do que aconteceu com as outras forças políticas. Sem sucesso – porque “não é possível formar um governo anti-resgate durante esta legislatura”, como explicaram -, continua a campanha rumo às eleições antecipadas, já dadas como certas para desbloquear o impasse, que deverão acontecer no dia 20 de setembro.

Ou seja, resta menos de um mês. E a Unidade Popular de Panagiotis Lafazanis está lançada, ainda que muito longe dos lugares cimeiros. Promete roubar pelo menos 4 a 5% da votação que, noutras circunstâncias, deveria ir para o Syriza. A última sondagem, divulgada esta sexta-feira, aponta para uma intenção de voto de 3,5%, próxima dos socialistas do Pasok, contra os 23% do Syriza e os 19% da Nova Democracia. Os indecisos, esses, são ainda mais do que 25%, e podem fazer toda a diferença.

Os partidos precisam de pelo menos 3% dos votos para conseguirem representação no Parlamento grego, pelo que será certo que Lafazanis estará sentado no hemiciclo. Entre os seus apoiantes ouve-se que poderá mesmo ser a surpresa das eleições. Mas tudo deverá depender de como Alexis Tsipras vai conseguir segurar os cacos do Syriza e montar de novo as peças.