Quando o país aqueceu no Outono houve quem pensasse que as eleições presidenciais (oito semanas depois) podiam ser a segunda volta das legislativas. Claro que não foram. Tanto a gerigonça como o PàF não tinham candidato mobilizador; não houve qualquer discussão sobre o futuro de Portugal, apenas um conjunto de piedosas intenções que já não surpreendem ninguém. Na verdade, estas eleições acabaram por ser um curto intervalo para dar algum descanso ao Governo e à direita. Mas com uma abstenção de 51%, tudo isto pareceu mesmo uma reeleição.

Marcelo ganhou e ganhou com um pouco menos do que 2,5 milhões votos. Reconciliou a direita. Juntou o PàF ao eleitorado de centro perdido por Passos e Portas em Outubro (que tiveram então 2,1 milhões).  Mas ficou abaixo de Cavaco (2,6 milhões em 1996, 2,7 milhões em 2005, 2,2 milhões em 2011 mas com bastante maior abstenção). A notoriedade deu-lhe Belém. Mas não entrou no eleitorado de esquerda como se afirmou.

Ao dispensar uma segunda volta, Marcelo tem uma vitória importante. Cria um problema a Passos Coelho que terá agora de enfrentar um novo líder na direita portuguesa, legitimado nas urnas, com poder (mesmo que apenas moderador) e alguma influência. A grande incógnita é saber se Marcelo continuará a interpretação minimalista dos poderes presidenciais defendida por Cavaco (que, recorde-se, na sua primeira eleição, era suspeito de ter uma interpretação maximalista) ou voltará ao modelo Soares de maior intervenção quer na vida política, quer no seu partido (Soares começou por abater Constâncio antes de enfrentar Cavaco).

A derrota estrondosa de Maria de Belém elimina qualquer desafio a António Costa que sai reforçado internamente desta eleição mesmo com os magros resultados do seu candidato. O Bloco consolida a sua posição enquanto o PCP claramente tem um problema pela frente: passou definitivamente a ser a terceira força à esquerda; teve um resultante humilhante e foi o seu eleitorado, e não o do Bloco, que fugiu para o voto útil em Sampaio da Nóvoa. Certamente a correlação de forças entre Bloco e PC vai condicionar António Costa, mas é possível que para já nada mude. Os restantes resultados, independentemente dos méritos, têm um impacto político nulo.

Amanhã a questão é simples – voltamos à crispação gerigonça/PàF ou evoluímos para os consensos ao centro defendidos pelo Presidente Marcelo Rebelo de Sousa?

*Nuno Garoupa é presidente da Fundação Francisco Manuel dos Santos

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