O discurso de Marcelo Rebelo de Sousa, onde anunciou a aprovação do primeiro Orçamento de Estado deste governo, pode ser resumido em duas frases. A primeira foi retirada de um manual de Ciência Política do primeiro ano da Faculdade de Direito de Lisboa: “A política é a arte do possível”. (A sério?) A segunda foi retirada de um manual de armadilhas politicas: “Resta saber se o possível é suficiente”.

Depois de ouvir isto da boca do Presidente da República, António Costa deveria, obviamente, perguntar, com um ligeiro tremor na espinha: “Desculpe, ‘suficiente’ para quê?”

Marcelo Rebelo de Sousa não respondeu a isto no seu discurso – mas também não era preciso. Como se imaginará, a frase completa seria a seguinte: “Resta saber se o possível é suficiente para que o Governo sobreviva“.

O Presidente da República pôs na tarde desta segunda-feira um prazo de validade em António Costa: “2017”. Nessa altura, acontecerá uma de duas coisas ao líder do PS: se o Orçamento que hoje foi aprovado levar ao crescimento económico, António Costa receberá um cartão de parabéns de Belém, com o Presidente a reclamar parte da responsabilidade pelo sucesso; se o Orçamento levar ao défice e à quebra da economia, receberá uma carta de despedimento, com o Presidente a afastar-se rapidamente da sua companhia.

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Aconteça o que acontecer, Marcelo Rebelo de Sousa sairá sempre a ganhar. À esquerda poderá dizer que fez tudo o que era possível para que o Governo se aguentasse; à direita, poderá dizer que o Governo caiu por iniciativa dele. Fica aqui uma aposta: António Costa ainda vai ter saudades da previsibilidade de Cavaco Silva.

Miguel Pinheiro é diretor executivo do Observador

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