A crítica já não é nova. Nos últimos dias a líder do Bloco de Esquerda tem insistido que Carlos Costa “não tem condições” para se manter à frente do Banco de Portugal, devido às “várias falhas graves” que tem demonstrado na supervisão da banca. O apelo foi reforçado este domingo, em entrevista ao Diário de Notícias e à TSF, onde Catarina Martins insiste na necessidade de haver uma mudança no regulador, pedindo mesmo ao Governo para “iniciar o processo de substituição” de Carlos Costa.
Carlos Costa foi nomeado para o cargo de governador em 2010 pelo Governo socialista de José Sócrates e foi reconduzido em 2015 pelo executivo de Pedro Passos Coelho (PSD-CDS/PP). Com a mudança de governo, e uma vez que a duração daquele mandato nada tem a ver com a duração do mandato executivo, Carlos Costa manteve-se no cargo, com o primeiro-ministro a considerar que o estatuto de governador é “inamovível”. Legalmente, a única forma de o Governo destituir o governador é se tiver havido aquilo que se entende por “falha grave”. E é esse requisito que Catarina Martins diz que está mais do que preenchido.
“É verdade que é difícil a destituição, é verdade que com o euro, com o BCE se tornou um pouco mais complicado ainda. Agora, é certo que a lei prevê que o Conselho de Ministros, por proposta do Ministério das Finanças, posso propor a destituição do governador do Banco de Portugal por falha grave”, começa por explicar a líder bloquista, enumerando depois as várias “falhas graves” em que Carlos Costa já incorreu.
Além das “falhas do passado”, que se dispensa a recordar porque “demoraria muito tempo”, Catarina Martins não tem dúvidas de que o caso BES foi a gota de água. “É hoje claro que todas aquelas pessoas que compraram produtos do BES, do GES, do Rio Forte e foram enganadas, os lesados do BES, são culpa do Banco de Portugal, que já sabia há um ano da situação e permitiu que tal acontecesse; é claro também que a resolução do BES foi feita tarde demais e, portanto, com mais custos para o país e que o Banco de Portugal já sabia há mais de um ano que aqueles banqueiros não podiam estar à frente do banco, já lhes devia ter retirado a idoneidade; e é também claro que, face a uma comissão parlamentar de inquérito que ouviu o Banco de Portugal, o governador do Banco de Portugal não deu aos deputados, como era sua obrigação, a informação que tinha sobre aquele processo”, explica.
É por isso que para o Bloco de Esquerda só há uma saída possível: o governo deve iniciar um “processo de substituição” com base em falha grave. “De quantas falhas graves é que precisamos mais para iniciar um processo que nos parece essencial para proteger o país?”, questiona.
A relação entre Carlos Costa e o atual Governo, nomeadamente o Ministério das Finanças, nunca foi a melhor, mas a tensão tem crescido nos últimos dias com António Costa a recusar nomes propostos pelo governador para a administração do Banco de Portugal. Além de que, na sequência de uma reportagem da SIC sobre o caso BES, vários têm sido os agentes políticos, nomeadamente do PS, que têm colocado cada vez mais pressão sobre a atuação do Banco de Portugal no processo. A reportagem em causa dá conta, por exemplo, de documentos que Carlos Costa nunca chegou a levar ao Parlamento quando foi inquirido sobre o caso.
Na mesma entrevista, Catarina Martins mostrou-se bastante crítica do “pequeno milagre” do défice, conseguido pelo atual Governo, que não só conseguiu que pela primeira vez o défice ficasse abaixo da meta dos 3%, como ficasse bastante mais abaixo, nos 2,1. A líder bloquista sublinha que, ao contrário do que se diz, “o Bloco de Esquerda preocupa-se com o défice”, mas “há uma diferença entre 3% de défice, que já serviria para Portugal sair do Procedimento por Défice Excessivo, e 2,1%”, que são 1600 milhões de euros, que poderiam servir para outros investimentos, diz.
“A diferença entre 3% de défice, que já serviria para Portugal sair do Procedimento por Défice Excessivo, e 2,1% são 1600 milhões de euros, que poderiam servir, por exemplo, para regressar aos anteriores escalões de IRS, que são tão importantes para recuperar rendimento das famílias. Ou seriam, por exemplo, os 800 milhões de euros que precisamos no Serviço Nacional de Saúde para substituir equipamento obsoleto, e pararmos de pagar aos privados o que devíamos estar a fazer no SNS. Ou para recuperar as escolas que estão fora do plano de recuperação do Governo onde há crianças e jovens a estudar e que precisam de ser recuperadas”, explica.