Marcelo Rebelo de Sousa desautorizou declarações atribuídas à Presidência da República que mostravam indignação perante a posição defendida pelo Banco Central Europeu (BCE), no sentido aplicar medidas mais duras a países que estão a falhar a correção dos desequilíbrios macroeconómicos, como Portugal. Depois de o Expresso ter noticiado que Belém considerava “inacreditável e inaceitável” que o vice-presidente do BCE, Vítor Constâncio, estivesse de acordo com esta posição do BCE, o próprio Marcelo Rebelo de Sousa esclarece, também no Expresso, que é o único porta voz da Presidência. O Presidente desvaloriza ainda a análise do banco central, como sendo um “relatório técnico”.
A reação que foi desautorizada foi avançada por uma fonte da Casa Civil do Presidente, acrescenta entretanto o Expresso que na primeira notícia não citava fontes, nem referia o nome de Marcelo Rebelo de Sousa. Essa reação surgiu na sequência de uma notícia, avançada ontem pelo Jornal de Negócios, que cita uma análise do BCE com data de 20 de março, para concluir que o banco central quer que a Comissão Europeia tenha uma mão mais pesada para países como Portugal.
Na avaliação à análise da Comissão Europeia sobre os desequilíbrios macroeconómicos excessivos, o BCE defende que Bruxelas deve exigir a adoção de medidas de política ambiciosas, com a qual Portugal se terá aliás comprometido, ou então aplicar as multas previstas nos tratados europeus que podem chegar a 0,1% do Produto Interno Bruto (PIB), cerca de 190 milhões de euros.
A avaliação negativa da Comissão Europeia à insuficiente correção por parte de Portugal dos tais desequilíbrios macroeconómicos e o regresso do fantasma das sanções, já tinham sido noticiados pelo Observador.
Segundo a primeira notícia do Expresso, a avaliação agora conhecida do BCE caiu como “uma bomba” na Presidência da República, levando Belém a questionar o papel de Vítor Constâncio na defesa da posição de Portugal. Esta notícia antecede a deslocação de Marcelo Rebelo de Sousa a Bruxelas, na próxima quarta-feira, onde terá encontros ao mais alto nível com as instituições europeias. Segundo o site da Presidência, estão previstas audiências com os presidentes do Conselho Europeu, Donald Tusk, e do Parlamento, Antonio Tanjani, e um jantar com o colégio de comissários europeus, oferecido por Jean-Claude Juncker.
No relatório, o BCE nota que apesar de a Comissão ainda não ter ativado o braço corretivo dos desequilíbrios macroeconómicos, já revelou que três países apresentam desequilíbrios excessivos — Portugal, Itália e Chipre — a quem foi pedida a adoção de medidas de política “particularmente ambiciosas” no Programa Nacional de Reformas, a apresentar em abril. Se estes programa não refletirem as medidas exigidas, o procedimento por desequilíbrios excessivos pode ser aberto em maio, diz o documento do banco central.
O BCE mostra-se especialmente surpreendido com o comportamento de Portugal (e da Croácia), países que se comprometeram a cumprir uma agenda ambiciosa de reformas em 2016, o que levou a Comissão a não aplicar as sanções financeiras previstas. Isto apesar de Portugal ter conseguido ficar abaixo da meta do défice em 2016, números do Governo apontam para 2,1% do PIB, e alimentar a expetativa de sair do Procedimento de Défices Excessivos este ano.
Esta avaliação de Bruxelas é feita no quadro do Procedimentos Relativos a Desequilíbrios Macroeconómicos que examina a saúde económica e financeira dos países com base num conjunto de indicadores. Segundo refere o BCE, Portugal está no grupo de três países, em companhia com a Itália e o Chipre, que deveria avançar com medidas de política mais ambiciosas.
Quando a Comissão Europeia divulgou os resultados da análise aos países da zona euro com desequilíbrios macroeconómicos, Bruxelas disse que havia seis países com desequilíbrios macroeconómicos excessivos, mas entre esses seis havia três países que tinham desequilíbrios persistentes. Este grupo é onde está Portugal, juntamente com Chipre e Itália.
Estes três países foram instados pela Comissão Europeia a apresentar Planos Nacionais de Reforma ambiciosos como forma de evitar caírem na vertente corretiva deste mecanismo, que, em última análise poderia levar a sanções que chegariam aos 0,1% do PIB, ou 190 milhões de euros no caso de Portugal.
Este é cenário mais negativo previsto, mas em Bruxelas não há grande apetite por repetir a novela do ano passado e os resultados do défice deste ano, apesar de não estarem relacionados, podem garantir ao Governo alguma boa vontade junto das instituições europeias.
Ao contrário do Procedimento por Défices Excessivos, este procedimento dá à Comissão Europeia mais poder para determinar o caminho do país, já que a análise é mais qualitativa que no caso dos défices excessivos. A hipótese de Portugal ser alvo de um procedimento deste género no ano passado chegou a ser equacionada como forma de pressão ao país por parte da Europa, mas nunca chegou a avançar pelo avançar do ano e pela contestação de que poderia vir a ser alvo pela sua subjetividade. Ainda assim, nem tudo é subjetivo. Os desequilíbrios são medidos com recurso a um quadro de objetivos numéricos para vários indicadores, como o crescimento económico, por exemplo.