O IGCP emitiu nesta quarta-feira dívida pública a 10 anos com a taxa absoluta mais baixa de sempre: menos de 2%, fruto do anúncio de mais compras de dívida por parte do BCE e da subida do rating pela agência S&P (e a expectativa de que outras agências possam fazer o mesmo).
Foram emitidos 1,25 mil milhões de euros em títulos com vencimento em 2027, com uma rendibilidade implícita calculada em 1,94%. No último leilão com este prazo, o custo foi de 2,33%.
A taxa absoluta foi a mais baixa de sempre numa emissão com este prazo. As taxas de juro chegaram a aproximar-se de 1,5% no início de 2015, mas essa era a cotação no mercado — a emissão efetiva com a taxa mais baixa nessa altura custou 2,04% (fevereiro de 2015).
“Foi um resultado fenomenal para o nosso nível de risco e para a alavancagem da nossa economia. Portugal ser capaz de endividar-se a 10 anos a uma taxa de 1,9 por cento era algo que não imaginávamos ver. Representa uma excelente poupança em juros para o país, que assim baixa o custo médio da sua dívida. É que não é só o juro ser baixo, trata-se de dívida longa”, afirma Filipe Silva, diretor de gestão de ativos do Banco Carregosa, em nota de reação enviada às redações.
As razões para esta descida são conhecidas: a melhoria no rating da S&P, a eventual melhoria da notação dada pelas outras agências, as boas notícias da economia portuguesa mas, acima de tudo isto um fator mais importante: as taxas das dívidas soberanas europeias tem estado a corrigir e nós aproveitamos esse contexto. Não é só um efeito em Portugal.
Contudo, expurgando o efeito das taxas de juro gerais na zona euro, esta não foi a emissão em que a perceção de risco foi mais favorável. Isto porque Portugal está a financiar-se a 2% numa altura em que a Alemanha — referência “sem risco” na zona euro — paga 0,3% para se financiar a 10 anos. No início de 2015, altura em que o BCE anunciou o programa de estímulos, a Alemanha pagava 0,5% pela dívida a 10 anos.
Eis como evoluiu, nos últimos anos, a perceção de risco em torno da dívida portuguesa, avaliada pela diferença entre os juros de Portugal e as taxas da Alemanha.
Em comparação com aquilo que os investidores pedem para negociar dívida portuguesa, as obrigações a 10 anos em Espanha estão com uma taxa de 1,45% e os juros de Itália no mesmo prazo estão a cair há dez sessões consecutivas para 1,75%. A comparação entre os juros de Portugal e a taxa de juro da Alemanha mostra como o efeito da subida do rating da S&P, em meados de setembro, foi decisivo.
A subida de rating pela S&P foi uma das melhores notícias para Portugal nos últimos meses, não só pelo efeito direto que tem mas porque cria a expectativa de que outras grandes agências — a Moody’s e a Fitch — possam dar um passo no mesmo sentido, recomendando o investimento na dívida nacional mesmo aos investidores mais conservadores.
Os ratings são decisivos para que mais investidores queiram e possam comprar dívida portuguesa. E isto acontece por dois efeitos: por um lado, há muitos fundos que estão proibidos de comprar dívida que tenha uma notação de “alto risco” — falamos de fundos de pensões e seguradoras, por exemplo, que têm bolsos fundos mas limitações ou mesmo proibições quando se fala em investir em ativos com notação menos favorável.
Por outro lado, o facto de Portugal ascender a “grau de investimento” coloca o país em vários índices importantes de obrigações. Muitos investidores investem não em emitentes específicos mas em índices (da mesma forma que se compram ações de um país, ou, sobretudo, deste ou daquele setor de atividade). Os títulos são comprados seguindo a ponderação de um índice e, portanto, se a dívida portuguesa volta a constar desses índices isso leva a que vários investidores tenham obrigatoriamente de comprar os títulos, pela simples razão de terem de acompanhar o índice.
Ainda assim, neste ponto, há que referir que cada índice tem a sua metodologia: para alguns bastará haver um rating de qualidade para estar no índice (desde que seja de uma destas três principais agências) mas para outros, por exemplo, pode ser necessário duas agências, pelo menos, com rating positivo. Outras, por exemplo, podem fazer uma média ou considerar apenas o melhor ou o pior rating disponível.
Isto significa que ainda poderá ser importante que haja mais agências a subir o rating de Portugal para que este efeito positivo se faça sentir de forma mais notória. Alguns investidores mais especulativos já estão a “posicionar-se” para esse movimento.
Por outro lado, o BCE anunciou no final de outubro que iria prolongar o programa de compra de dívida pelo menos até setembro de 2018, o que indica que as compras vão continuar mesmo que a um ritmo mais baixo. Para Portugal, isso significa que o BCE irá comprar nos próximos meses mais 12 mil milhões de euros em dívida pública portuguesa, pelo menos.
BCE vai comprar mais de 12 mil milhões de dívida portuguesa nos próximos anos