O DJ e produtor musical sueco Avicii morreu esta sexta-feira aos 28 anos. A causa da morte não foi divulgada. “É com profundo pesar que anunciamos a perda de Tim Berling, também conhecido como Avicii”, disse a assessora do DJ, Diana Baron, em comunicado à imprensa dos EUA. “Ele foi encontrado morto em Muscat, capital de Oman, sultanato no Médio Oriente, na tarde desta sexta-feira. A família está devastada e pedimos a todos para respeitar, por favor, a necessidade de privacidade deles nesta ocasião difícil. Não vai ser prestada mais nenhuma declaração”, concluiu Diana Baron.

Avicii retirou-se das digressões no verão de 2016, alegando motivos de saúde. A última atuação foi no clube Ushuaia, em Ibiza, Espanha, onde fora DJ residente (embora nem sempre presente, dadas as intensas digressões mundiais) durante cinco anos. Era público que há alguns anos que Avicii sofria de problemas de saúde, em especial pancreatite aguda (inflamação aguda do pâncreas), motivada em parte pelo abuso de álcool. Em 2014, foi obrigado a uma cirurgia de remoção do apêndice e da vesícula biliar.

Making history! Avicii has taken the stage for his last final gig! Ushuaïa Ibiza Beach Hotel (Official) #Avicii

Posted by Ushuaïa Ibiza Beach Hotel on Sunday, August 28, 2016

Já depois da retirada dos palcos, Avicii publicou um texto por si assinado na sua página oficial na internet. Aí, o músico dizia o seguinte:

Todos nós chegamos a um ponto das nossas vidas e carreiras em que percebemos que o que é que tem mais importância para nós. Para mim é criar música. É para isso que eu vivo, é isso que eu sinto que nasci para fazer. No ano passado deixei de atuar ao vivo e muitos de vocês acharam que eu tinha acabado [de fazer música]. Mas o fim das atuações nunca significou o fim do Avicii ou da minha música. Em vez disso, voltei a ir para o sítio onde tudo fez sempre sentido o estúdio.”

A próxima etapa da minha vida será toda ela dedicada ao meu amor por fazer música para vocês. Isto é apenas o começo de algo novo. Espero que se divirtam tanto quanto eu com isso“, escrevia ainda o DJ.

Créditos: Rich Polk/Getty Images

À empresa de media Billboard, em 2016, Avicii descrevia assim a sua vida: “Tem sido uma viagem absolutamente louca. Comecei a fazer música quando tinha 16 anos. Comecei a andar em digressão quando tinha 18. Daí para a frente, entrei nesse universo e passei a dedicar-me a ele a 100%. Quando olho para atrás, para a minha vida, penso: wow, eu fiz mesmo aquilo? Foi o melhor tempo da minha vida, de certa forma. Veio com um preço — trouxe-me muito stress e muita ansiedade mas foi o melhor período da minha vida.”

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[Eis o ‘trailer’ do documentário ‘Avicii: True Stories‘:]

Numa entrevista que deu há menos de um ano à revista Rolling Stone, o diagnóstico dos seus últimos anos era menos luminoso. A entrevista foi uma das últimas que Avicii deu e aconteceu na sequência da estreia do documentário Avicii: True Stories, que revelava imagens do músico a sofrer com dores do pâncreas e a discutir com promotores que queriam que continuasse a atuar ao vivo.

Tudo isto [nessa altura] tratava-se já de ter sucesso só pelo prazer de ter sucesso. Já não estava a tirar nenhuma felicidade disto. Foi duro ver aqueles momentos. Olhei para mim e pensei: Porra, devias ter-te levantado e sido mais firme nessa altura. Vá lá, Tim! Porque é que eu não parei este navio antes?”

A música eletrónica e uma canção especial: “Wake Me Up”

Nascido em Estocolmo, na Suécia, Avicii começou a fazer música a meio da primeira década do século XXI, entre 2005 e 2006. O seu nome de batismo era Tim Bergling (ou Tim Berg) mas acabou por escolher Avicii como nome artístico. O significado do nome? Na religião budista, é mais ou menos equivalente ao purgatório cristão, o sítio em que se encontram os mortos que cometeram grandes pecados e que buscam a salvação (no caso, o renascimento).

À época, a inspiração de Avicii já era a música eletrónica mais hedonista, dançável e comercial, que então começava a ser tocada nas discotecas de todo o mundo através, por exemplo, do produtor musical holandês Tiësto, uma das primeiras celebridades deste género musical, que em 2004 abrira a cerimónia dos Jogos Olímpicos de Atenas.

Avicii. As cinco músicas que estiveram mais bem classificadas no top da Billboard

Um dos grandes percursores e celebridades do estilo musical — a par do já referido Tiësto, do francês David Guetta, dos também suecos Swedish House Mafia, do canadiano deadmau5, do americano Skrillex –, Avicii começou a atingir uma grande dimensão internacional em 2011, quando lançou o single “Levels”, que incluía um sample de uma canção clássica de gospel de Etta James, “Something’s Got a Hold on Me”, de 1962. Áustria, Bélgica, Bósnia, Croácia, Dinamarca, Finlândia, Alemanha, Grécia, Irlanda, Itália, Holanda, Eslovénia e Reino Unido foram alguns dos países em que “Levels” chegou ao top de dez mais ouvidas do momento.

https://www.youtube.com/watch?v=fEqCGe5kdQs

Nunca conquistou um prémio Grammy, nem obteve reconhecimento de grande parte dos críticos musicais — dentro do panorama da música eletrónica. A popularidade de Avicii que tinha era inversamente proporcional à consideração que lhe destinavam alguns meios de referência, como a Resident Advisor, mais dedicada à música de dança alternativa (ao contrário da DJ Mag, que o celebrava) –, o produtor foi nomeado por duas vezes para os mais importantes prémios da indústria musical norte-americana, ambas na categoria de Melhor Gravação de Música de Dança: em 2013 com o já referido single “Levels” e no ano anterior com “Sunshine”, que gravou com David Guetta.

Esses (2012 e 2013) foram os anos mais auspiciosos da carreira de Avicii. O último marcou aliás a edição do primeiro álbum do DJ e produtor musical sueco, True, que teve um sucesso estrondoso, em parte devido ao êxito enorme do single “Wake Me Up” (que só no Youtube soma mais de mil milhões de visualizações). Avicii viria a perseguir esse sucesso inicial mas o impacto do seu trabalho posterior, apesar de enorme, não voltou a ser o mesmo. Numa das suas últimas entrevistas, confrontado com o facto de estar na altura a tentar fazer “o melhor álbum da carreira” — não o chegou a editar –, diria o seguinte:

O álbum [que não chegou a ser editado] está a ficar com um aspeto interessante. Quero trazer de volta canções de estilo mais antigo para os meus fãs mais devotos mas também fazer coisas novas que soem frescas. O Stories [o seu segundo álbum, editado em 2015] correu bem, mas não tão bem quanto o True. Portanto, estou um bocadinho nervoso”.

As polémicas

Uma das polémicas em que Avicii esteve envolvido aconteceu em 2013, quando a revista GQ publicou um extenso perfil do músico. O DJ e produtor musical sueco queixou-se da “pouca verdade” e dos “erros de citação” que dizia existirem. Entre as suas principais queixas, refere a revista The Atlantic, estão a forma como os seus fãs são retratados na peça (como “uma bando de viciados e drogados”, refere a The Atlantic) e citações em que Tim Berling sugeria que o seu trabalho “não é assim tão difícil” e que os seus fãs seriam “um grupo de idiotas”.

A relação entre os média e os grandes fenómenos de EDM — electronic dance music, que em português significa música de dança eletrónica, que tem um público alvo relativamente jovem e que namora as fórmulas mais convencionais da música pop, acrescentando intensidade e ritmo dançante — nunca foi especialmente próxima. O surgimento deste género musical na Europa fez aliás com que a música de dança mais inspirada no house e techno alternativos norte-americanos (menos pop e nascidos da herança da música ouvida em Chicago e Detroit) fosse por vezes chamada IDM, ou inteligent dance music. Em português, significa “música de dança inteligente”.

Esta foi a última atuação de Avicii em Portugal (pouco antes de se retirar dos palcos)

A atuação destes DJ’s ao vivo, por exemplo, era amada por milhões mas estava longe de ser imune de críticas. A performance menos técnica de várias figuras deste género musical — de David Guetta a Steve Aoki e Avicii –, face a outros DJs, e o pouco trabalho na mesa de mistura (que lhes permitia juntarem-se ao público enquanto a música tocava) motivava críticas e humor nas redes sociais.

No perfil polémico da GQ, o próprio Avicii desvalorizava a dificuldade das atuações: “Acho que lá no fundo sei que é… um tipo de performance diferente. Não é como se estivesse a atuar da mesma maneira que um guitarrista o faz, tocando ou que uma cantora o faz, cantando. Percebes? Portanto, é estranho estar no mesmo registo dessas pessoas porque eu não estou na verdade a fazer grande coisa, sabes? Porque tecnicamente não é assim tão difícil”.

Outra das polémicas em que Avicii esteve envolvido foi uma guerra de palavras com o também muito famoso DJ e produtor deadmau5. Nas redes sociais, Avicii publicou uma imagem em que perguntava: “Se o deadmau5 não passasse todo o seu tempo a odiar, será que eu lhe podia ensinar a tocar piano?”. O ataque foi na verdade um contra-ataque: antes, já deadmau5 havia criticado o sueco.

Na entrevista que deu em 2017 à Rolling Stone, Avicii admitia a “saturação” que se vivia no género musical que praticava, que apesar de ainda ser popular já viveu tempos mais áureos (a revista musical online Pitchfork publicou, aliás, uma longa peça cujo título apontava para o fim de uma “bolha” que já “rebentara”).

“A EDM começou a ficar saturada há quatro, cinco, seis anos, quando o dinheiro começou a tornar-se tudo o que interessava. Desse ponto de vista, comecei a não me querer associar mentalmente à EDM. Agora que tenho mais tempo no estúdio”, dizia Avicii, menos de um ano antes de morrer. “Quero aprender tanto quanto puder sobre outros géneros musicais. É isso que eu mais adoro — ter uma sessão com o Nile Rodgers [da banda Chic], por exemplo, e ganhar um conhecimento e uma perceção musical que não tem preço”.

Retirar-me foi algo que tive de fazer para benefício da minha saúde. A cena [da música eletrónica] não era para mim. Não por causa dos concertos ou da música, mas pelas outras coisas que a rodeiam que nunca me foram muito naturais. Tudo o resto a que ser um artista obriga. Em geral sou uma pessoa mais introvertida, foi sempre muito difícil para mim. Acho que carreguei comigo demasiada energia negativa”, dizia, já depois de se retirar.

“Sinto-me feliz, sinto-me livre neste momento. Como se eu tivesse recuperado a minha vida privada e pudesse focar-me em mim pela primeira vez em muito tempo. Isto [retirar-se] foi obviamente a decisão mais difícil da minha vida até agora. Mas até agora tem sido extremamente recompensador no que toca ao meu bem estar. Há muito, muito tempo que não estava tão feliz e tão livre do stress. Não posso dizer que nunca mais vou voltar a atuar mas acho que não vou voltar à vida das digressões”, dizia Avicii, em abril de 2016.

Como sempre nestas ocasiões, o mundo da música já se pronunciou sobre a morte do DJ, principalmente através do Twitter. A cantora Madonna, com o DJ e produtor colaborou, já reagiu à morte dizendo adeus a Tim.

Também os DJ’s Calvin Harris, Hardwell e David Guetta reagiram à morte de Avicii. Calvin Harris diz que está “devastado”; Hardwell afirmou que “não acredita” e David Guetta diz que não acredita e que vai sentir saudades do sueco.