O Parlamento Europeu fez as contas à proposta de orçamento que a Comissão apresentou para o próximo quadro plurianual, entre 2021 e 2017, e não gostou do que viu: em comparação com o atual quadro financeiro, o corte no fundo de coesão europeu (uma parcela significativa do bolo da política de coesão) pode chegar aos 45%. No caso de Portugal, somando todos os cortes na política de coesão, o impacto poderá ser superior a 2,5 mil milhões de euros, cerca de 10% das verbas que o país vai receber até 2027.

Até ao final do mês, o Parlamento Europeu vai aprovar uma resolução “muito crítica” da proposta apresentada pela Comissão Europeia. Ao Observador, o eurodeputado José Manuel Fernandes (PSD), uma referência na negociação dos dossiers financeiros em Bruxelas, diz que a resolução está a ser consensualizada “entre todos os grupos políticos” e que o documento apontará uma linha central:

É inaceitável que haja um corte no fundo que mais contribui para a solidariedade, para a coesão territorial e para a redução das disparidades” entre os países da União.

A comissão de Orçamento do Parlamento Europeu diz, num documento que saiu da reunião de coordenadores de 16 de maio, que foram detetados “resultados que contradizem as declarações públicas da Comissão Europeia”. E concretiza: apesar do aumento das contribuições para o programa Erasmus (mais 77%) e para Investigação (mais 13%) — rubricas que, mesmo assim, ficam abaixo do anunciado –, há um corte de mais de 15% nos apoios à agricultura e um corte de 10% na coesão, incluindo uma redução de 45% nas contribuições para o Fundo de Coesão europeu.

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Em jeito de comparação, na proposta que foi apresentada para o quadro 2014-2020, o corte previsto para o Fundo de Coesão ficava pelos 17% — sensivelmente um terço da redução que a Comissão Europeia agora colocou em cima da mesa. Esta parcela é particularmente relevante para Portugal pelo peso preponderante nas verbas transferidas de Bruxelas para Lisboa.

O que é que tudo isto poderia significar para as contas nacionais, a ser aprovada a proposta inicial? No caso do Fundo de Coesão, seriam entregues menos 1500 milhões de euros durante o próximo quadro financeiro plurianal (metade da verba atual) e menos mil milhões no apoio ao desenvolvimento rural (no âmbito do Fundo Europeu Agrícola de Desenvolvimento Rural — FEADER).

Tudo somado, a atual proposta traduz-se num corte de 2,5 mil milhões de euros para Portugal, que vai receber entre 2014 e 2020, no programa Portugal 2020, cerca de 22 mil milhões de euros. “É uma machadada na solidariedade”, diz José Manuel Fernandes, que considera que “um corte desta natureza vai contra a política de coesão” da União Europeia.

Quando a proposta foi conhecida, o Governo português deixou de imediato um sinal de que o desenho orçamental apresentado pela Comissão Juncker não representava boas notícias. “Seja qual for a situação — e há quem tenha suspeitas de que os cortes relativamente a Portugal seriam superiores à média –, consideramos esta proposta de Bruxelas um mau ponto de partida que não poderemos aceitar”, disse António Costa no Parlamento, há pouco mais de uma semana. “Partimos com uma posição construtiva, mas dizemos não aos cortes na política de coesão e não aos cortes na política agrícola, sobretudo no segundo pilar da Política Agrícola Comum”, acrescentou o primeiro-ministro.

Ainda assim, este não é um ponto de chegada. José Manuel Fernandes fala num “longo caminho pela frente” e passa a pressão para o Conselho Europeu — onde a posição final sobre o quadro plurianual tem de ser decidida por uninamidade entre chefes de Estado e de Governo; no Parlamento Europeu, o quadro financeiro precisa apenas de uma maioria dos votos dos eurodeputados. A negociação entre os dois grupos está na sua fase inicial.

“Os Estados-membros concordam com um corte de 10% na coesão? E concordam com um corte de 45% no Fundo de Coesão?”, questiona-se o eurodeputado. Provavelmente, não. Do lado do Parlamento Europeu, as contas são simples: “Se o Conselho chegar a acordo para manter a Política Agrícola Comum e a coesão [nos termos em que ela existe atualmente, fechamos rapidamente negócio com o Conselho”, admite o social-democrata.