Os alunos que chumbem com notas saídas de conselhos de turma a funcionar com serviços mínimos poderão impugnar essas avaliações. Este é o entendimento do advogado Garcia Pereira, especialista em direito laboral, que considera que no acórdão que decretou serviços mínimos à greve dos professores às avaliações de final de ano há três ilegalidades. E isso basta para que os alunos que se sintam prejudicados possam impugnar as decisões dos professores.

O advogado deixa um outro alerta: “A atos e ordens ilegais não é devida obediência.” Ou seja, Garcia Pereira defende que os professores não têm de cumprir os serviços mínimos.

“Um aluno que tenha reprovado com uma nota atribuída pela aplicação dos mecanismos da decisão do colégio arbitral tem toda a legitimidade para impugnar essa nota negativa ou essa sua reprovação, exatamente com fundamento na ilegalidade do procedimento administrativo que deu como resultado a sua avaliação”, explicou Garcia Pereira, citado pela agência Lusa.

O advogado participou na noite de quarta-feira numa conferência organizada pelo mais recente sindicato de professores, o STOP, onde se pretendia debater a decisão do colégio arbitral que considerou haver lugar a serviços mínimos na greve que decorre até 13 de julho. Esta decisão afeta apenas os conselhos de turma do 9.º, 11.º e 12.º ano e a partir de julho. Durante o mês de junho não há lugar a serviços mínimos.

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As três ilegalidades

Das três ilegalidades apontadas por Garcia Pereira, duas estão ligadas às regras de funcionamento dos conselhos de turma e à atribuição de notas. O terceiro prende-se com o facto de o colégio arbitral ter juntado no mesmo processo e na mesma decisão duas convocatórias diferentes de greve. Um dos pré-avisos é convocado pela Fenprof, FNE e mais 8 estruturas sindicais — e vai de 18 de junho a 13 de julho — e o outro pelo STOP, com um pré-aviso mais alargado no tempo — de 11 de junho a 31 de julho.

A lei vigente determina que um conselho de turma para atribuição das notas de final de ano só possa ser realizado na presença de todos os professores da turma em causa. Há critérios definidos na legislação para que ele se possa realizar sem a totalidade dos docentes, em casos de ausência prolongada, como baixas por doença.

O que o colégio arbitral decidiu é que estas reuniões poderão acontecer se estiver presente uma maioria qualificada dos docentes, ou seja, metade mais um. “Ao fixar um quórum que é distinto daquele que está legalmente fixado, a deliberação do colégio arbitral comete uma ilegalidade”, explicou Garcia Pereira.

Por outro lado, o colégio arbitral alterou também o regime legal de atribuição de notas. Passa a ser possível, durante o período em que são requisitados serviços mínimos, que o diretor de turma possa recolher, antes dos conselhos de turma, as notas dos professores que não vão estar presentes, em gozo do direito à greve. Esta é a segunda ilegalidade, na perspetiva de Garcia Pereira.

“Esta é uma situação que está legalmente prevista, mas apenas para casos excecionais e por vontade do docente”, argumentou o advogado. E lembrou que os professores chegam às reuniões de avaliação com propostas de notas, que podem ser alteradas no decurso do encontro, algo que considera acontecer com frequência. “Sem o professor da disciplina presente, tal deixa de ser possível”, sublinhou.

A terceira ilegalidade, diz Garcia Pereira, é terem sido analisados em conjunto dois processos grevistas com dois pré-avisos de greve distintos. Para que isso fosse possível, explica, era necessário haver um despacho do membro do Governo responsável pela área da administração pública em causa. Mas esse despacho nunca foi publicado e, apesar disso, o colégio arbitral juntou-os.

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Professores não têm de obedecer aos serviços mínimos

Somadas as três ilegalidades, Garcia Pereira não tem dúvidas de que a decisão do colégio arbitral não está de acordo com a lei. E isso traduz-se num outro pormenor: os professores não são obrigados a respeitar os serviços mínimos. “A atos e ordens ilegais não é devida obediência”, logo, “os docentes podem simplesmente não cumprir com estes serviços mínimos porque são ilegais”, sublinha Garcia Pereira.

Por tudo isto, o especialista em direito laboral defende que “os professores devem persistir no direito à greve, porque estão cheios de razão” e acredita que este é um processo que se vai resolver “no campo político e sindical”.

Na quarta-feira de manhã, Fenprof, FNE e mais 8 estruturas sindicais anunciaram que vão impugnar a decisão do colégio arbitral, avançando com um recurso para o Tribunal Central Administrativo. Ainda esta quinta-feira, irão anunciar novas formas de luta, na sequência da resposta que receberam do colégio arbitral  ao pedido de aclaração feito sobre o acórdão que dá luz verde aos serviços mínimos, pedidos pelo governo.

O juiz presidente respondeu aos professores que a decisão está “fundamentada na lei” e que “não compete” ao colégio arbitral “responder às questões postas pelas entidades sindicais”.

Embora não seja a única reivindicação dos professores, a recuperação do tempo em que as carreiras dos docentes estiveram congeladas já se tornou a principal bandeira da luta dos docentes. Os professores pretendem recuperar a totalidade dos 9 anos, 4 meses e 2 dias do congelamento, e a proposta do Ministério da Educação é de 2 anos, 9 meses e 18 dias. O impasse instalou-se e a negociação não voltou a avançar.

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