Os líderes da União Europeia chegaram a acordo esta sexta-feira para começar a debater politicamente o formato do futuro sistema europeu de garantia de depósitos, uma das peças chave da União Bancária e que tem encontrado grande resistência entre os países mais conservadores, e sobre a transformação do Mecanismo Europeu de Estabilidade, incluindo o mandato para que sirva como financiador complementar do Mecanismo Único de Resolução na resolução de bancos.

Depois de anos de resistência dos países do centro da Europa, em especial da Alemanha e dos seus aliados no Eurogrupo, os líderes da União Europeia chegaram a acordo para avançar com a última perna da União Bancária, a criação de um sistema europeu de garantia de depósitos.

De acordo com o comunicado do Conselho Europeu, há acordo para a adoção da reforma do sistema bancário proposta pela Comissão Europeia, que inclui medidas como a mudança nos requisitos de capital dos bancos, mas também, e mais importante do ponto de vista político, para que o debate político sobre a criação de um sistema europeu de garantia de depósitos avance no contexto da União Bancária.

Apesar de este mandato do Conselho Europeu ser apenas para a discussão da forma, é o primeiro grande passo para finalizar o que falta concluir da União Bancária. Este sistema seria complementar ao Fundo de Garantia de Depósitos que já existe em cada um dos países e que cobre, de acordo com as regras europeias, os depósitos até 100 mil euros, mas serviria numa primeira fase como recurso para pagar os depósitos devido à luz da lei em caso de um grande choque, para o qual o sistema nacional não tivesse capacidade de resposta.

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Quando o sistema estiver finalizado, a proteção dos depositantes ficará completamente a cargo deste novo sistema, em vez de ficar dependente dos fundos de garantia de depósitos nacionais.

A medida é vista como fundamental para completar a União Bancária e aumentar a confiança dos depositantes no sistema bancário europeu, mas para já apenas há luz verde para começar a negociar. Os ministros das Finanças terão agora de negociar qual a forma de funcionamento do sistema, quanto cada membro terá de pagar e em quanto tempo para finalizar o sistema, e também que salvaguardas existirão para que o sistema europeu não beneficie comportamentos menos responsáveis em alguns países. Apesar de as reformas do sistema bancário e as outras pernas da União Bancária já terem este objetivo, os países mais conservadores como a Alemanha querem garantias de que não estarão a financiar outros países.

O Conselho Europeu conseguiu também chegar a acordo sobre a transformação do Mecanismo Europeu de Estabilidade. O MEE, que foi criado para tornar permanente o fundo de resgate do euro criado para responder à crise das dívidas soberanas depois do primeiro resgate da Grécia — ainda com recurso a empréstimos bilaterais –, terá, antes de mais, de servir de financiador de recurso do Mecanismo Único de Resolução.

O Mecanismo Único de Resolução, financiado com as contribuições dos fundos de resolução nacionais, tem como missão financiar as resoluções de bancos, mas a sua capacidade financeira está limitada a cerca de 60 mil milhões de euros (quando estiver completo, algo que ainda não aconteceu). O MEE irá ter a capacidade legal de ajudar a financiar resoluções e crises no sistema bancário com um montante de igual valor, recorrendo a empréstimos no mercado, como tem vindo a fazer para os resgates aos países do euro.

Além de servir como backstop ao Mecanismo Único de Resolução, gerido pelo Banco Central Europeu, o Mecanismo Europeu de Estabilidade irá também passar a ter uma missão mais alargada no apoio financeiro aos países que pedirem ajuda, no seu controlo, na monitorização, com a criação de regras muito semelhantes às do Fundo Monetário Internacional. O papel de maior destaque do MEE irá valer-lhe também a consagração nos tratados europeus, deixando de ser uma instituição criada por um acordo intergovernamental, o que lhe irá valer uma fiscalização mais apertada dos organismos europeus – entre eles o Parlamento Europeu e o Tribunal de Contas Europeu.

Conselho Europeu. Quem (ainda) quer mudar o euro?

O Conselho Europeu mandatou ainda o Eurogrupo para debater os restantes temas que estão na carta endereçada por Mário Centeno, enquanto líder do grupo informal de ministros das Finanças do euro, ao Conselho. Entre estes temas está a criação de um orçamento para a zona euro com uma função de estabilização para os países que sejam afetados por recessões graves.

Este instrumento, na visão do eixo franco-alenão, da Comissão Europeia e dos líderes das Finanças da zona euro, deve garantir que as economias não são demasiado afetadas pela necessidade dos países de cortar despesas em tempo de crise, apostando assim no investimento produtivo, a primeira alínea de despesa a ser cortada em tempos de crise.

Outro dos temas que está presente na carta de Mário Centeno, e no acordo franco-alemão, é o da criação de um seguro europeu de desemprego, para apoiar políticas de emprego e o pagamento das prestações necessárias em tempo de crise severa nos Estados-membros.

O Eurogrupo terá agora de trabalhar a parte técnica para que os líderes voltem a debater os temas na cimeira de dezembro deste ano.

O acordo na íntegra:

Em consonância com a Agenda dos Dirigentes e com o resultado da Cimeira do Euro de dezembro de 2017, e saudando as contribuições nacionais, inclusive a que foi apresentada pela França e pela Alemanha, a Cimeira do Euro acordou hoje no seguinte:

  1. O acordo no Conselho sobre o pacote bancário deverá permitir aos colegisladores adotá-lo antes do final do ano, preservando simultaneamente o equilíbrio geral. Respeitando todos os elementos do roteiro de 2016 na sequência adequada, deverá dar-se início aos trabalhos sobre um roteiro para iniciar as negociações políticas sobre o Sistema Europeu de Seguro de Depósitos.
  2. O MEE proporcionará o mecanismo de apoio comum ao Fundo Único de Resolução (FUR) e será reforçado trabalhando com base em todos os elementos da reforma do MEE indicados na carta do presidente do Eurogrupo. O Eurogrupo elaborará os termos de referência do mecanismo de apoio comum e aprovará uma ficha descritiva para o desenvolvimento futuro do MEE, até dezembro de 2018.
  3. O Eurogrupo prosseguirá o debate sobre todos os pontos referidos na carta do presidente do Eurogrupo.
  4. A Cimeira do Euro voltará a debruçar-se sobre estas questões em dezembro de 2018.

A Cimeira do Euro saúda a declaração do Eurogrupo de 21 de junho de 2018 sobre o desembolso final do financiamento do MEE à Grécia e sobre as medidas de alívio da dívida a médio prazo, que concluem com êxito a assistência financeira à Grécia.