Ao fim de cinco meses como líder do PSD, Rui Rio deu a primeira entrevista a uma televisão, a TVI. Durante 25 minutos, Rio aproveitou para mandar recados para dentro e fora do partido. Sobre Europeias, garantiu que, seja qual for o resultado das eleições para o Parlamento Europeu, não se vai demitir. Quanto ao Orçamento, não revelou o sentido de voto, mas disse estar convicto de que a “geringonça” vai aprovar o documento. No entanto, caso não isso aconteça, defendeu que Costa deve viabilizar um Governo PSD/CDS.

Rio apareceu sorridente no ecrã, não fugiu a nenhum tema, mas também não deu muitas novidades. Para dentro do partido (os críticos), enviou recados. Para fora do partido (os eleitores) tentou passar a imagem de credibilidade. E, para isso, não teve problema de dizer que ainda queria ir além de Centeno: mais rigor nas contas públicas e um défice (ainda) mais baixo.

Daqui não saio, daqui ninguém me tira (até às legislativas)

[Maus resultados nas Europeias] não comprometem a permanência porque estava o partido desgraçado. As Europeias vão ser em maio [risos]. Não sei se era em agosto que queriam trocar de líder de partido, por isso, isso não está minimamente em causa. Agora naturalmente, se o PSD tiver um resultado mais fraco, é mau. Se não subir, é mau. Se ganhar, aí é que é bom.

Rio não dispensou enviar um recado para dentro do partido: os seus opositores escusam de andar em conspirações internas e a tentar estratégias para o afastar após as Europeias, porque isso não vai acontecer. Não pelo próprio pé. Seja qual for o resultado, Rio disse com-as-letra-todas que não se demite. Nem que seja o mais desastroso dos resultados. Até porque a demissão dele seria a “desgraça” do partido, que ficaria sem líder em maio com eleições quatro/cinco meses depois. Por isso, garante, isso não está “minimamente em causa”.

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Sobre as expectativas que tem para essas eleições, Rio disse que “o que é fundamental nas Europeias, em primeiro lugar, é o PSD subir e, depois preferencialmente ganhar”. Rio afirmou que nas últimas eleições para o Parlamento Europeu, o PSD “ficou a uma distância muito grande. Sete. Portanto, seis [do PSD] mais um [do CDS]. Só tem seis deputados.” Aqui, não se percebe se Rio está apenas a baixar a fasquia para cantar vitória se subir ou se está a criticar os anteriores resultados (numa lista liderada por Paulo Rangel, seu potencial challenger no futuro).

Na altura, em 2014, a generalidade dos comentadores consideraram a diferença curta, tendo em conta que havia um grande desgaste no Governo PSD/CDS e a coligação ficou a menos de 4 pontos percentuais do PS (31,46%-27,21%). Até o histórico fundador Mário Soares chamou na altura ao resultado do PS uma “vitória de Pirro”, numa crítica que abriu caminho para o fim da liderança de António José Seguro. Mas Rio acha que foi mau. E definiu claramente a meta: subir.

Sem Orçamento, Costa teria de viabilizar governo PSD-CDS

Aliás, deixe-me dizer-lhe. Se o Orçamento chumbasse, em bom rigor, o dr. António Costa teria de viabilizar um Governo do PSD com o CDS. Ele não disse em 2015, que só chumbou o Governo de Passos Coelho porque conseguia uma maioria à esquerda? Se agora não conseguisse, em coerência devia dizer: pronto, peço desculpa, apoio um Governo do PSD e do CDS, que verdadeiramente foi quem ganhou as eleições em 2015, foi quem foi mais votado.”

Foi uma declaração à Passos Coelho. Nem os mais acérrimos passistas se lembrariam de fazer uma sugestão destas neste momento, mas Rio não hesitou fazê-la. Quanto à aprovação do Orçamento, Rio defendeu que, caso o documento não passasse no Parlamento com os votos da esquerda, António Costa, para ser coerente, teria de viabilizar um Governo PSD/CDS até ao fim da legislatura, já que, sem maioria, a força mais votada é a que deve governar.

Rio disse várias coisas que agradariam aos passistas, incluindo que foi Passos Coelho quem “verdadeiramente ganhou as eleições em 2015.” Mas — mesmo nesse hipotético cenário — o próprio dificilmente aceitaria governar um ano (ou menos do que isso) até ao fim da legislatura. Ainda por cima com Assunção Cristas, com mantém uma relação fria. O mais certo nessa circunstância seria — e Rio não exclui essa disponibilidade quando fala com os seus mais próximos — o Presidente da República marcar eleições antecipadas.

Rio não diz como vai votar no Orçamento. Mas acredita que PS não precisa do PSD

Há muita gente no meu partido e não só que diz: ‘Diz lá que votas contra’. Mas como é que eu posso dizer se voto contra um documento que não existe? (…) O que é lógico é que eles [geringonça] consigam um Orçamento e que o consigam aprovar. Se fosse o contrário, era mau para eles todos. Não é uma questão de interesse nacional, é uma questão de salvarem a pele. E, portanto, vão-se todos entender.”

Rui Rio começou por esclarecer que não vai dizer já que vota contra o Orçamento só porque este é elaborado por um governo PS. É algo que tem defendido como um ponto de honra. Se não há documento, não vai ser contra por defeito ou por princípio. Isto é um sinal para dentro do PSD, para os seus críticos internos. Muitos têm criticado o líder por não assumir que vai votar contra o Orçamento, mas Rio mantém-se imune a pressões. E não cede naquilo que define como “forma diferente de fazer política”.

Por outro lado, tenta tornar o apoio do PSD numa “não-questão”. Isto porque acredita que não há três sem quatro — se PS, PCP, PEV e Bloco se entenderam para os três primeiros orçamentos — e que certamente o farão também no Orçamento para 2019. Isto porque, seria pior para todos os parceiros de geringonça que não o fizessem.

O governo da cigarra devia ser mais austero

Se fosse primeiro-ministro teria sido muito mais comedido naquilo que seria a política orçamental. O que este Governo faz é, tem uma folgazinha qualquer e destrói automaticamente. O que significa: se amanhã houver uma recessão, Portugal não está tão bem preparado como deveria estar. O primeiro-ministro disse que não é a carochinha. E eu acho que ele tem razão. O PS é muito mais a cigarra, que na história da cigarra e da formiga, como sabe, a formiga durante o verão trabalha, no inverno tem o alimento produto do seu trabalho, e a cigarra não trabalha. E depois quando chega…”

Rui Rio não tem problemas, mesmo que seja impopular, em dizer que teria feito uma reposição de rendimentos de “forma mais cadenciada” e que “teria aproveitado o crescimento” para baixar ainda mais o défice. O líder do PSD é adepto de “superávites” nas contas públicas e quis denunciar o facto de, num tempo de crescimento, em vez de poupar as reservas para tempos de tempestade, o PS estar a gastar tudo ao sabor do vento (as exigências de PCP e BE).

O presidente do PSD usa mesmo a fábula de La Fontaine, da “Cigarra e da Formiga”, para sugerir que o PS é a cigarra, que não se preocupa com o futuro. Mesmo com todas as críticas (incluindo do interior do próprio PS) ao lado mais austero de Mário Centeno, Rio gostaria de ir ainda mais além no rigor das contas públicas: “O défice tem de ser mais controlado”. Rio quis dizer, assim, que o PSD sob a sua liderança é, por oposição, a formiga.

Concorda com a reposição do tempo de serviço dos professores?

Em primeiro lugar deixe-me dizer-lhe uma coisa. Se eu se fosse o primeiro-ministro, quando for, nunca porei em causa o equilíbrio orçamental e farei tudo para que a dívida orçamental se reduza.”

O primeiro argumento de Rui Rio sobre a reposição do tempo de serviço dos professores foi orçamental e podia ter sido tirado a papel químico das últimas declarações de Mário Centeno sobre o assunto, em entrevista ao Público. Um dia antes, o ministro das Finanças tinha dito que “não é possível pôr em causa a sustentabilidade de algo que afeta todos, só por causa de um assunto específico.”

Depois desta ressalva, que não é de somenos, Rio destacou que os professores são “importantíssimos” para o país e que a profissão tem sido “proletarizada”. Se fosse possível, defendeu Rio, seria mais que justo que os professores vissem o seu trabalho reconhecido, até porque “ganham mal” e não têm, por exemplo, “subsídios de deslocação” como os magistrados do Ministério Público.

Os professores merecem ganhar melhor mas, afinal, o que defende Rio neste caso? O mesmo que Costa. “Não pondo em causa o Orçamento do Estado, tem de se pegar numa posição intermédia. Não os nove anos que defendem os sindicatos (…) mas sim fazer um mix de solução”. Ora, foi mais ou menos isto que Costa defendeu num debate quinzenal quando foi cercado pelos parceiros de “geringonça”.

Desvalorizar as sondagens

Isso das sondagens… Agora saiu uma sondagem que dá o PS a subir uns pozinhos e o PSD descer uns pozinhos. Sou capaz de lhe dizer assim: eu não estava à espera de outra coisa. Com a greve dos professores, com o problema de Tancos, com a geringonça a partir, com tudo isto. O PS só podia subir nas sondagens. Isto para as eleições é mau, mas para as sondagens até era bom de certeza. Quando vi o resultado, só podia ser este”.

Ironia, ironia, ironia. Rui Rio, que desceu nas últimas sondagens, não perdeu a oportunidade para fazer uso da ironia para desvalorizar os resultados dos estudos de opinião. O que o líder do PSD queria dizer é muito simples: só pode ser brincadeira o PSD descer e o PS subir quando o Governo socialista enfrentou tantos problemas (Tancos, fissuras na “geringonça” ou a greve dos professores).

Farpa a Santana e piscar de olho ao centro

Eu não fico muito admirado, porque na própria campanha interna referi isso. O Pedro Santana Lopes tem esse fascínio de um dia criar um partido à direita do PSD. Não é coisa que me admire muito muito muito. Ele é património do partido, faz parte da história do partido e quando assim é, sair, é uma perda para o partido. Agora, em termos eleitorais, eu não acho. Se sair, belisca um bocadinho do PSD, belisca um bocadinho o CDS, mas a margem de crescimento que eu estou à procura, não é à direita. A margem de crescimento é ao centro, naqueles votantes do PS que não se reveem à esquerda e na abstenção, daqueles que não votam porque não vêem credibilidade.”

Rui Rio aproveitou o facto de lhe perguntarem sobre um eventual novo partido de Santana Lopes para reduzir essa ideia a um desejo antigo do antigo primeiro-ministro. “Pedro Santana Lopes tem esse fascínio, não é coisa que me admire”, atirou, lembrando que já na campanha das diretas evidenciou essa apetência do adversário. Porém, à boleia, disse que não tem medo desse novo partido. E que um novo partido até pode tirar um pouco de eleitorado ao PSD (e ao CDS), mas será apenas um “beliscão”. O que Rio quer, verdadeiramente, é conquistar eleitorado ao centro, entre os descontentes e as pessoas que habitualmente não votam, fazendo uso da sua “credibilidade”. Como quem diz: um novo partido de Santana não entra no campeonato que Rio está a disputar.