TVI, 30 de agosto de 2003. O primeiro episódio de “Morangos com Açúcar” inaugurou o capítulo das séries juvenis faladas em português de Portugal (talvez “Riscos”, série da RTP estreada em 1997, tenha servido de prólogo). Do Brasil, já chegava, com o devido delay, o êxito “Malhação”, de 1995. Mas Portugal só acordou para o formato mais tarde. A narrativa vinha com a assinatura da Casa da Criação, um coletivo de ficcionistas que juntava Ricardo Leitão, Patrícia Müller, Sandra Santos, João Matos e Elisabete Moreira, vários deles já habitués nos créditos de outras telenovelas da estação.
O elenco transbordava sangue novo. Não que faltassem nomes já consolidados, como Dalila Carmo, Helena Isabel, Luís Esparteiro e Rita Salema, mas os protagonistas eram um bando de ilustres desconhecidos para o grande público, dirigidos pelos realizadores Atílio Riccó e Carlos Neves. O genérico, interpretado por Berg, era trauteado ao virar de cada esquina, as roupas das personagens ditavam a roupa que levávamos para a escola no dia seguinte. A série durou nove anos, terminando em setembro de 2012 e marcando o imaginário de uma geração, a geração Morangos. Foram nove os pares românticos que prenderam crianças e adolescentes à televisão, mas tudo começou em 2003 com Pipo e Joana, há precisamente 15 anos.
Quem eram os protagonistas da primeira temporada?
João Catarré (Pipo), Benedita Pereira (Joana), Diogo Amaral (Ricardo) e Filomena Cautela (Carla) foram os protagonistas da primeira temporada de “Morangos com Açúcar”. Quando a série estreou, as atrizes tinham ambas 18 anos, Diogo 21 e João 23. Todos eles já tinham participado em telenovelas. João Catarré tinha começado em 1999, em “Todo o Tempo do Mundo”, na TVI. Não tinha nenhum papel, era simplesmente o rapaz que aparecia no genérico (e ainda sem barba). Depois disso e antes da estreia da série juvenil, a 30 de agosto de 2003, passou ainda pelos elencos de “Nunca Digas Adeus”, “Anjo Selvagem”, “Amanhecer” e “Ana e os 7” e pelo filme O Fascínio.
Já o seu par romântico, não chegou a tanto. Em 1999, entrou na telenovela “A Lenda da Garça”, da RTP, e ainda passou pela SIC, em 2001, na série “O Bairro da Fonte”. Antes de chegar aos “Morangos com Açúcar”, Diogo Amaral ficou-se por “Sonhos Traídos”, uma telenovela da TVI, de 2002, onde desempenhou o papel de Martim. Filomena Cautela também só tinha uma entrada no currículo. Foi em “Ana e os 7”, no papel de Sandra, que a atriz se estreou em televisão. Hoje, tem 33 anos e foi a que mais diversificou a carreira. Nos anos que se seguiram a “Morangos com Açúcar”, participou sobretudo em séries de televisão, mas também em alguns filmes. Em 2005, tornou-se uma das caras da MTV Portugal e, quatro anos depois, começou a apresentar o 5 Para a Meia-Noite. Em maio deste ano, brilhou como co-apresentadora da Eurovisão.
Os restantes três protagonistas fizeram carreira na representação, sobretudo em telenovelas e séries televisivas. Catarré mantém-se fiel à ficção da TVI. Benedita surpreendeu, este ano, ao aparecer em dois episódios da terceira temporada de “Versailles”, uma produção internacional, já depois de ter aparecido na série “The Blacklist”, em 2017. Diogo Amaral tem saltitado entre as estações de Queluz e de Carnaxide.
Mas a primeira temporada de “Morangos com Açúcar” impulsionou a carreira de muitos outros atores, hoje caras bem conhecidas do público. Aconteceu com Joana Solnado, que apenas tinha participado na novela “O Último Beijo”, em 2002, e no filme Confissões de Adolescente, do ano em que estreou a série. A atriz, neta de Raul Solnado, tinha então 19 anos. Teresa Tavares, Mónica, foi outra revelação, apesar de já ter participado em “Jardins Proibidos” e em “Anjo Selvagem, na TVI, e na série “A Minha Família é uma Animação”, na SIC. Tinha 20 anos quando a série começou. Depois de pequenas aparições, Rodas (de Rodolfo Damião) foi o primeiro papel a sério de Tiago Aldeia, na altura com 17 anos.
A história
Se bem se lembra, a história era um enredo clássico de liceu. Joana e Ricardo eram namorados, mas na festa em que celebrava os seus 18 anos, ela apanhou-o aos beijos com outra rapariga no jardim. O flagrante teve direito a um banho de mangueira, uma das primeiras cenas icónicas da série. Joana tenta afogar as mágoas na praia e acaba por ser resgatada do mar por Pipo, dando início ao romance que atravessou toda a temporada. É de relembrar que Pipo era o mais velho de quatro irmãos, que ficaram órfãos depois dos pais terem morrido num acidente de carro. Na série, vivem ao cuidado da tia.
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E Carla? A personagem de Filomena Cautela era, no mínimo, especial. Melhor amiga de Joana, percebe-se rapidamente que esconde um segredo: tinha um caso com Daniel, o pai da amiga, de quem acaba por engravidar. A primeira personagem grávida da série não fica por aí. Mais tarde, envolve-se com Ricardo. Mas Ricardo e Pipo também chegam a ser amigos. Para sustentar os irmãos e fugir ao controlo da tia interesseira, este acaba por investir o dinheiro do seguro de vida dos pais num pequeno bar na Praia dos Rebeldes.
O ponto de encontro de todas as personagens era o Colégio da Barra, em Cascais (só na quinta e sexta temporadas, o cenário viria a ser uma escola pública, trocada por uma escola de artes a partir da sétima). Lembra-se do professor Sapinho? Ensinava inglês. Rafa, personagem de Rodrigo Saraiva, era o aluno baldas, o animador da rádio do colégio e o fundador do SACO (Serviço de Apoio à Cabula Organizada). E é a parte daqui que o diagrama amoroso começa a ficar complexo. Rafa apaixona-se pela melhor amiga, Catarina (personagem de Joana Solnado), irmã de Pipo, que por sua vez começa por gostar também de Rui, papel desempenhado pelo ator Manuel Moreira. Catarina decide-se pelo segundo e para lhe fazer ciúmes, Rafa começa a namorar com Marina, papel de Sylvie Dias.
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Confuso? Há mais. Tiago, irmão de Pipo, de 14 anos, gosta de Lara, a personagem de Sofia Arruda. Ela não lhe é indiferente, mas começa a namorar com Rodas, outra das personagens que marcaram a primeira temporada de “Morangos com Açúcar”. Pedro e Mónica são outro casal sensação. Ele começa por fingir um namoro com Joana, ela é apaixonada (de forma um tanto ou quanto doentia) por um dos professores, mas acabam juntos.
Enquanto isso, os dois protagonistas chegaram ao fim da primeira série sem um final feliz. Estiveram para casar mais do que uma vez, mas as tentativas de Ricardo, ex-namorado de Joana, e a relação de Pipo com Matilde, prima de Joana e professora no colégio.
O sucesso dentro e fora de Portugal
Durante anos, “Morangos com Açúcar” foi a série do final da tarde, tendo mais tarde ocupado tempo de antena também no horário nobre. Na primeira temporada, a série começou logo a quebrar recordes. O episódio de dia 8 de fevereiro de 2004 atingiu uma audiência média de 17,9%, cerca de 1.700.000 espectadores, e um share médio de 45,6%. Em média, a primeira série teve um share diário de 30,8%. Terminou no dia 6 de julho de 2004 para dar lugar à primeira série de verão, que subiu o ponteiro das audiências para 32,5%.
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Foi no primeiro verão da série que as estrelas internacionais começaram a entrar em cena. As britânicas Sugababes, de passagem pela primeira edição do Rock in Rio Lisboa, interpretaram o tema “Too Lost in You”, parte da banda sonora de “Morangos com Açúcar”. A proeza viria a repetir-se com nomes como Orishas e Melanie C, das Spice Girls.
A série chegou a outros países. No Brasil, país de onde chegou a inspiração para “Morangos com Açúcar”, foi transmitida pela Rede Bandeirantes. Chegou ainda a televisões de Angola, da Síria, da Roménia e de Espanha.
Geração Morangos: os escândalos e as tragédias
Em maio de 2006, no final da terceira temporada, um vírus de laboratório alastrou-se pelos alunos e professores do Colégio da Barra. Fora da televisão, ficou conhecido como “Vírus Morangos com Açúcar”, quando dezenas de crianças, em todo o país, começaram a replicar na escola os sintomas vistos na série. “Poderá ser uma atitude mimética. Esses programas de televisão são modelos comportamentais”, explicou na altura Maria José Magalhães, professora da Faculdade de Psicologia e Ciências da Educação do Porto, citada pelo jornal Público. Vários alunos chegaram mesmo a dar entrada em hospitais das regiões Norte e de Lisboa.
Durante os nove anos que esteve no ar, a série ficou ainda marcada por duas mortes trágicas. Francisco Adam perdeu a vida em abril de 2006 num acidente de automóvel. O ator de 22 anos, Dino em “Morangos com Açúcar”, tinha saído de uma discoteca em Coruche. A autopsia confirmou depois as suspeitas de consumo de álcool e cocaína. Em 2011, Angélico Vieira, membro do grupo D’ZRT e parte do elenco da segunda e terceira temporadas da série, morreu também num acidente de carro. Tinha 28 anos, e o excesso de velocidade foi apontado como causa do despiste.
As temporadas seguintes
“Morangos com Açúcar” teve nove temporadas, 18 se contarmos com as séries de verão. Terminou em 2012 e, nove anos depois, foram muitos os nomes que introduziu no panorama da representação nacional, a começar pela segunda série. Cláudia Vieira e Rita Pereira foram as protagonistas da segunda série, juntamente com Pedro Teixeira. Ana Guiomar e Diogo Valsassina, Marta e Tojó, também entraram para o elenco em 2004, bem como Dânia Neto e Mariana Pacheco. Um ano depois, chegava uma nova leva de atores, entre eles alguns para ficar. Aconteceu com Joana Duarte, Luís Lourenço (juntos, formavam o terceiro par romântico de “Morangos com Açúcar”), Mariana Monteiro, Jessica Athayde, Marta Faial, Francisco Côrte-Real, Sara Prata, Oceana Basílio e Diana Chaves.
Sara Salgado, Isaac Alfaiate, Joana de Verona, Vitória Guerra, Sisley Dias, Sara Barradas, Rui Porto Nunes, Vanessa Martins, Tiago Barroso, Sara Matos, Lourenço Ortigão (protagonistas da sétima temporada), David Carreira (sim, foi o protagonista da oitava temporada) e Filipa Areosa.